segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Equador e Bolívia: ressurge o golpismo latino-americano


#Traduzido e publicado em português do Brasil

As elites fracassaram, econômica e sanitariamente. A oposição ligada a Evo Morales e Rafael Correa lidera as pesquisas. Sem votos, a direita tenta inviabilizar a mudança – e recorre, outra vez, ao Judiciário

Cecilia Gonzalez | Outras Palavras | Tradução: Antonio Martins

Se os opositores podem ganhar as eleições, melhor evitar que se candidatem. Esta parece ser a fórmula mágica e misteriosa que percorre a América Latina, agora em particular no Equador e Bolívia, países em que os governos estão fazendo todos os esforços necessários para impedir postulações – inclusive promovento a proscrição de partidos rivais.

A meta é clara e tem nomes e sobrenomes: evitar, como for possível, a volta ao poder dos partidos dos ex-presidentes Rafael Correa e Evo Morales.

O fato de que suas forças políticas tenham altas intenções e que inclusive liderem as pesquisas significa que grande parte das populaçẽos as apoia. Ou seja, o mínimo que se espera é que se respeite o direito destes cidadãos a escolher livrementre quem querem como governantes. Mas não parece haver nenhuma intenção de honrar uma premissa básica da democracia.

Estas estratégias antidemocráticas são promovidas sob o grito de “Defendamos da democracia!”. E o que deveria ser um escândalo internacional é abafado graças à cumplicidade das mídias tradicionais da região que, em grande aliança, ditam as coberturas eleitorais a partir de um duplo padrão: condenando os governos progressistas e avalizando os conservadores, ocultando suas crises internas. A divisão entre “bons” e “maus” já é grotesca.

A Venezuela, sabe-se, é o cavalo de batalha. Nicolás Maduro é o demônio latino-americano. Por isso, “vamos nos converter numa Venezuela” tornou-se a insultante advertência dos candidatos de direita. Lançam-na em tom tenebroso, para assutar e suscitar medos. Ser Venezuela. Que horror! Ainda que o verdadeiramente horroroso seja a permanente estigmatização das e dos venezuelanos, e o uso e abuso político de uma tragédia humanitária.

Às mídias que se autoproclamam falsamente como independentes, soma-se a ajuda da Organização dos Estados Americanos (OEA), que não condena, investiga ou questiona o que ocorre no Equador e na Bolívia. Bem, se a OEA apoiou o golpe de Estado contra Evo, não é possível esperar muito mais.


Democracias em risco

Não se deve esquecer o Poder Judiciário, que atua de maneira seletiva e que, estranhamente, acelera processos judiciais contra líderes políticos populares em período eleitoral. É o que já aconteceu com Lula no Brasil.

É o que está ocorrendo agora no Equador. As eloeições presidenciais ocorrerão em 7 de fevereiro do próximo ano, mas a presssão judicial contra Correa já coneseguiu que fosse condenado a oito anos de prisão pelo delito de co-autoria, no marco do processo conhecido como “caso sobornos”, que investiga apoios ilegais ao movimento correísta Aliança País. A condenação ainda não é certa. Se for ratificada, o ex-presidente, refugiado na Bélgica, não pderá voltar ao país nem, é claro, postular nenhum cargo. Além disso, o Conselho Nacional Eleitoral do Equador negou o registro a quatro partidos, entre eles a Força Compromisso Social, com o qual Correa aspira concorrer à vice-presidência.

O pretexto legal é que o partido de Correa não reuniu 1,5% das assinaturas de eleitores que o regime eleitoral exige, para obter registro. O que chama atenção é o rancor contra a principal força opositora ao governo de Lenin Moreno. Ela é, de acordo com as pesquisas, um dos partidos com maior intenção de voto, mesmo sem ter definido seu candidato a presidente. O cheiro de ataque à democracia é evidente.

Adiamento boliviano

Na Bolívia, o panorama não parece melhor. A ultradireitista presidente “de fato”, Janine Áñez e seus aliados conseguiram adiar de novo as eleições, que estavam previstas para 6 de setembro. Agora, supõe-se que ocorrerão em 18 de outubro, mas a verdade é que desde o ano passado nada pode dar-se por segurno nesse país.

Para começar, Áñez autoproclamou-se como presidente em 12 de novembro e assegurou que só ocuparia o cargo por algumas semanas. Também jurou que não postularia a presidência nas eleições em que a Bolívia tentará recuperar seus sistema democrático.

Se for confirmado o adiamento das eleições, a melhor amiga de Jair Bolsonaro permanecerá mais de de um ano no posto para o qual não receberu um único voto – salvo, claro, o da OEA e os de alguns cúmplices mais. Mas não os dos bolivianos.

Aliás, parece que criou apego ao poder, porque não cumpriu a promessa e terminou postulando-se candidata. No entanto, como as pesquisas a situam num distantíssimo terceiro lugar, dado o desastre do manejo da pendemia, agora faz esforços denodados para impedir o registro de Luís Arce, o candidato presidencial do Movimento Ao Socialismo que lidera as intençẽos de voto.

Se o Tribunal Supremo eleitoral ceder às pressões e encontrar um artifício para impedir o registro do MAS, será impossível vislumbrar o regresso da democracia. Por incrível que pareça, os adversários da Arce querem puni-lo com a cassacção de seu registro, por… ter difiundido um pesquisa eleitoral. Chega a este nível a campanha de ódio, que recebe pouca visibilidade e condenações.

As agressões e perseguições aos militantes do MAS ampliam-se. A violência política e as violações dos direitos humanos tornaram-se norma na Bolívia , sem que isso alarme muito a “comunidade internacional”, este ente que às vezes parece mais um clube de amigos.

*Cecília Gonzalez é jornaiista mexicana vivendo na Argentina

Imagem: Luís Arce (à esquerda), o ministro que liderou as transformações econômicas na Bolívia, lidera as pesquisas de eleição de voto, com mais de 40% do apoio. Direita tenta o tapetão

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