Domingos De Andrade
| Jornal de Notícias | opinião
"Então morrem 18 pessoas e
ninguém é responsável?" A pergunta de Adrian Istratuc, pai de três filhos
órfãos de mãe, filhos de Ludmila, funcionária há oito anos do lar de Reguengos
de Monsaraz que morreu lentamente tratada a ben-u-ron até ser tardiamente internada,
que morreu lentamente aconselhada pela Linha de Saúde 24 a tomar o remédio comum, a
pergunta de Adrian sem resposta, insistimos, devia cobrir-nos, a nós, filhos,
netos, sobrinhos de todos os velhos despejados em lares, de uma vergonha sem
fim.
Regressar a Reguengos dois meses
depois da tragédia que vitimou 18 pessoas com covid-19, como o fazemos na
edição deste domingo da "Notícias Magazine", é expor o abandono e
desprezo a que votamos as gerações que empecilham a dinâmica social, ou o chamado
progresso. Mas é sobretudo perceber que não aprendemos nada, com a cadência
quase diária de novos casos de infeção em dezenas de lares.
Os dramas atuais expostos pela
pandemia diluem-se na responsabilidade coletiva passada do Estado e na outra
pergunta sem resposta: como permitimos que isto fosse acontecendo? Mas a
irresponsabilidade do presente cabe-nos exclusivamente, que não nos indignamos,
a começar pelo Governo, a quem não basta apresentar uma e outra vez um programa
carregado de milhões a serem despejados sem estratégia.
Os lares, dezenas deles, são hoje
depósitos de velhos doentes, muitos insuportáveis para se viver até à eventual
visita condescendente e apressada de um familiar, sem cuidados de saúde
adequados, sem mais do que a longa espera pela morte.
Num momento em que se discute na
praça pública a arquitetura da aprovação do próximo Orçamento no já desgastado
braço de ferro com o Bloco de Esquerda, a aparente apatia do PCP ou as
preocupações legítimas do presidente da República perante as ameaças de uma
crise política, os partidos têm a obrigação de se debruçarem sobre o essencial.
E o essencial é perceber que os alicerces de um Estado de direito, hoje tão
ameaçado pelos extremismos, assentam, e muito, nos princípios de Estado social
e não assistencialista. Muitos poderiam começar por ir ler o que significam
ambos.
*Diretor
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