quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Portugal | Talvez fosse melhor zerar o Novo Banco


Francisco Louçã | Expresso | opinião*

Agora, no mais fresco destes escândalos, descobre-se que a Comissão Europeia obrigou a venda de um dos ativos do banco, uma companhia seguradora, que o candidato escolhido foi um fundo gerido por um fulano acusado de crimes nos Estados Unidos, que afinal não foi o comprador, pois apareceu outro pelas artes da magia financeira, e no fim das contas quem paga o prejuízo é o contribuinte, são mais uns generosos milhões.

A explicação é tão embrulhada como sempre, os guionistas destas fábulas não carecem de imaginação, mas o que verificamos é o mesmo padrão de outras operações anteriores desta gigantesca lavandaria: como está assegurado que, qualquer que seja a dimensão do prejuízo, o dinheiro público vai tapar o buraco (fingindo-se que serão os outros bancos a pagar, apesar de nem tidos nem achados nesta tramoia), a pressa e a conveniência do negócio estão acima de qualquer consideração de eficiência ou rentabilidade. O que eram prédios valiosos e empresas prestáveis passa a ser classificado como sucata e é vendido ao deus dará, polvilhando o mundo financeiro de carinhosas vendas, algumas das quais nem esperam pela missa do sétimo dia para se espanejarem na praça pública, orelha e rabo para o matador.

Ao público que vai acompanhando a novela, isto cheira a esturro. São vezes de mais, dinheiro de mais, descaramento de mais. Este parece mesmo ser o caso em que o criminoso volta sempre ao local do crime e se sente protegido para o fazer, visto que as desculpas dos administradores, reguladores e outras autoridades sempre que se revela uma ponta do véu são demasiado parecidas, demasiado atabalhoadas, demasiado impossíveis.

Ora, como a corrida se está a acelerar, ainda falta a venda de mais de mil milhões em imobiliário e o prazo é só mais um ano para o Novo Banco esgotar a verba prometida no contrato e preparar a sua venda, conviria não perder mais tempo em encontrar uma solução. Como é evidente, a Deloitte, ao protelar a entrega da auditoria desde março, dá uma resposta a esta questão, que é ajudar a administração do banco a continuar a sua feira de garagem.

Não vejo outra escolha que não seja zerar este processo. Ou seja, parar todas as operações suspeitas, fazer a auditoria necessária sem depender do mercado interessado no seu resultado, antes promovendo o controlo das contas e estudando assim se há base jurídica para romper o contrato com a Lone Star, verificar a idoneidade e substituir os administradores que conduziram este descalabro, mandatar uma nova direção para o Fundo de Resolução e reforçá-lo com competências técnicas adequadas.

O outro caminho é deixar os mesmos a fazer o mesmo até ao fim do prazo. Suponho que quem lê estas linhas não terá a menor dúvida sobre qual o resultado alcançado se a estratégia de fechar os olhos e dançar a música da Lone Star continuar a conduzir a ação dos reguladores e ministros.

*Extraído de Estátua de Sal

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