Portugal
Aumento exponencial de casos em outubro não poupou idosos. Houve 3,5 vezes mais casos acima dos 70 anos do que em setembro e, só na última semana, mais de 3 mil idosos infetados. Ontem foi batido um novo máximo de óbitos num dia. Mortalidade poderá duplicar nas próximas duas semanas, admite investigador, que alerta que a incidência de casos acima dos 80 anos já é muito superior à da primeira vaga.
“Os nossos comportamentos são a grande barreira entre nós e o vírus”. O apelo foi feito ontem pela diretora-geral da Saúde, no dia em que passaram oito meses desde a confirmação dos primeiros casos de covid-19 no país e diante de um mês que se afigura como particularmente difícil no país, de novo em estado de emergência e a ter conter e responder a uma onda de infeções sem precedentes. Uma “maratona sem fim” e que poderá vir a ter vários picos ao longo dos próximos meses, disse Graça Freitas, vincando a necessidade de achatar a curva. Com as infeções ainda a multiplicarem-se, o balanço do mês de outubro, em que se bateram recordes de casos diários e de doentes internados nos hospitais, mostra a dimensão do agravamento da situação no país e faz prever um aumento ainda acentuado das vítimas mortais da pandemia nas próximas semanas, antevendo-se que o mês de novembro possa superar o máximo de mortes registado em abril.
Os dados divulgados pela DGS, que o i analisou, confirmam já um aumento significativo da mortalidade no último mês. A covid-19 foi associada a 567 mortes no mês de outubro, quando em setembro se tinham registado 153 mortes, já o dobro do mês anterior. Só na última semana morreram 228 pessoas no país com covid-19, mais do que em todo o mês de setembro. O peso da mortalidade por covid-19 no total de mortes ocorridas no país também tem estado a aumentar, uma análise que é possível fazer com base nos óbitos declarados diariamente no país e reportados ao sistema nacional de vigilância de mortalidade (EVM). Em setembro, as 153 mortes por covid-19 representaram 1,7% dos 9012 óbitos que ocorreram no país. Em outubro, o peso da covid-19 subiu para 5,7%, tendo sido reportado um total de 9798 mortes no país.
Idosos não escaparamAnalisando os dados da DGS, constata-se que o aumento exponencial de casos verificou-se em todos os grupos etários, com as infeções a baterem recordes em todas as idades no mês de outubro. Se os mais jovens registam a maioria dos novos casos, e isso não se alterou em outubro – 59,5% as infeções diagnosticadas surgem abaixo dos 50 anos de idade – a percentagem de casos em idosos manteve-se também relativamente estável, o que significa que os casos em idosos foram aumentando tanto e até mais em algumas semanas do que nos grupos da população em idade ativa e com menos risco.
Ao todo, ao longo do mês de outubro, registaram-se 8530 casos em idosos com 70 anos ou mais, o que compara com 2424 casos no mês de setembro. São 3,5 vezes mais e ajudam a perceber o aumento da mortalidae que se tem estado a registar no país mas também o agravamento esperado nas próximas semanas. Destes mais de 8500 casos em idosos, mais de 6 mil foram reportados apenas nas últimas duas semanas. E se há duas semanas foi superado pela primeira vez o patamar dos 2 mil novos casos em idosos com 70 anos ou mais (o máximo de casos nesta faixa etária tinha sido de 1500 casos em abril), na última semana foram notificados à DGS 3455 casos nesta faixa etária, 13,4% dos novos casos reportados no país. Só acima dos 80 anos, o grupo etário onde a letalidade da doença ronda os 20%, foram reportados 1927 novos casos, quando na semana anterior tinham sido 1215.
Mortalidade pode duplicar nas próximas semanas
Óscar Felgueiras, matemático especialista em epidemiologia da Universidade do Porto, que faz a modelação da epidemia desde março, explica que, atendendo à evolução de casos nas últimas semanas, e ao aumento da incidência em idosos, a previsão é de um aumento da mortalidade nas próximas semana, uma vez que as medidas e mudanças de comportamentos não vão alterar infeções que já ocorreram.
E o facto de não haver sinais de uma travagem do aumento de casos em idosos nas últimas semanas, pelo contrário, é uma das preocupações. “O aumento da mortalidade é acima de tudo determinado pela incidência de casos nos idosos, principalmente naqueles a partir dos 80 anos. Nesta faixa etária ocorrem 67% dos óbitos. A incidência a 14 dias neste grupo está agora nos 465 casos por 100 mil habitantes, quando o máximo atingido em abril tinham sido os 278 casos por 100 mil habitantes. Pior do que a incidência estar elevada é o facto de ainda ter atualmente tendência de subida. Os óbitos acompanham a incidência com um atraso de quase duas semanas, ou seja, os óbitos que surgem são consequência daquilo que já aconteceu. Tendo isso em conta é neste momento expectável que a mortalidade duplique nas próximas duas semanas”, afirma. Ontem atingiu-se já o valor mais elevado de mortes em 24 horas desde o início da epidemia, com 46 óbitos em pessoas infetadas com covid-19 declarados no país este domingo. Trinta e sete tinham mais de oitenta anos, sete eram septuagenários e as duas outras vítimas mortais estavam na casa dos 50 e dos 60 anos.
Há duas semanas, ao SOL, Óscar
Felgueiras tinha alertado para uma sensação de aparente menor mortalidade nesta
nova fase da epidemia e que esta nova onda de infeções poderia ter maior
mortalidade do que a que assolou o país em março/abril. O agravamento das
últimas semanas aponta neste sentido e o investigador considera que neste
momento é quase garantido que este mês seja superado o total de mortes ocorrido
Marta F. Reis – jornal i
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