A Agência Portuguesa do Ambiente autorizou a transmissão de seis barragens da EDP para a Engie, permitindo à EDP fugir aos impostos associados ao que é de facto uma operação de venda. O negócio "tem de ser travado", diz Mariana Mortágua.
A EDP detém a concessão e a propriedade de seis barragens do Douro Internacional que estavam registadas em nome da EDP Produção que tinha já manifestado a intenção de vender essa concessão, bem como as barragens, a um consórcio liderado pela ENGIE.
A operação foi denunciada pelo Movimento Cultural das Terras de Miranda(link is external), que exigia contrapartidas da operação no valor de 100 milhões de euros para investimento na região.
O grupo parlamentar do Bloco de Esquerda, no seguimento das denúncias do movimento, requereu (link is external)em 2020 o envio dos contratos ao Parlamento, mas apenas o contrato de concessão original foi enviado.
Ora, este contrato “foi alterado para incluir esta operação”, explicou Mariana Mortágua esta manhã em conferência de imprensa.
Em vez de uma operação de venda montou-se o seguinte negócio: a EDP cindiria a operação daquelas barragens que transfere para uma “nova sociedade”, ou seja, uma empresa veículo a constituir no momento, cujas ações seriam por sua vez vendidas a uma empresa de nome Águas Profundas, ligada à ENGIE.
A fusão e incorporação da “Nova Sociedade” na “Águas Profundas SA”, determinaria assim a transmissão dos direitos da concessão das barragens assim como a sua propriedade.
“Esta descrição deste negócio foi incluída no contrato de concessão das barragens sob a forma de adenda”, detalha Mariana Mortágua. Ou seja, todo o negócio foi aprovado pela APA (comunicação de dia 13 de dezembro de 2020), e também pela Direção Geral de Energia e Geologia (DGEG), e no dia 14 dezembro, incluída no contrato de concessão já existente entre a APA, a REN, a EDP e a Águas Profundas.
O negócio realizou-se no dia 17
de dezembro mas, no dia
Para a deputada, “há vários problemas com este negócio”. Desde logo, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) “aceitou que fosse transmitida a concessão das barragens para uma empresa cujo nome nem sequer conhecia" e que "não passava de um veículo financeiro, uma ficção jurídica. Ainda hoje a concessão é detida por uma empresa com apenas um trabalhador", detalha.
Depois, a estrutura montada, sob a forma de cisão numa sociedade veículo e fusão numa outra sociedade associada à ENGIE, "visa dar a forma de reestruturação empresarial à venda pura e simples de uma concessão”.
Ou seja, em termos práticos “estaríamos perante um transmissão desse género se a EDP tivesse sido comprada pela Engie e os ativos tivessem passado para a Engie. Mas não foi isso que aconteceu”, explica.
O que aconteceu “foi a venda de uma empresa para outra”. Esta “ficção” tem duas consequências, diz Mariana Mortágua. Ao “mascarar a operação de fusão, a EDP pretendeu utilizar abusivamente um benefício fiscal que a liberta de pagar imposto de selo e nos leva a questionar mesmo sobre o pagamento de IRC sobre os lucros da operação de venda”. Ou seja, a EDP "fugiu ao imposto de selo e não pagou os 110 milhões que eram devidos".
Depois, ao tratar a venda “como se fosse uma mera transmissão da concessão e não como a venda que é, o Estado abdicou dos seus direito de rever as condições do contrato de concessão e de procurar um melhor comprador”.
Para Mariana Mortágua, é claro que o governo “poderia ter usado a pretendida renúncia da EDP à concessão para avaliar se os lucros obtidos com a concessão desde 2008 estavam em linha com o que então foi contratualizado, ou se, sendo maiores, a autorização à EDP dependeria de um ajustamento favorável ao Estado”.
O governo poderia ainda “ter evitado a venda direta à Engie levando a operação a leilão, à procura de um preço melhor, sendo a diferença receita pública”, explica.
Para a deputada não restam dúvidas. “O governo, através da APA, permitiu um esquema da EDP para fugir aos impostos, abdicou de exercer os seus poderes de forma a proteger o interesse público, e o ministro diz ao Parlamento que nem os contratos conhecia, apesar de ser sua obrigação acompanhar este processo”.
Com “intenção ou por incúria, o facto é que o governo desprotegeu o interesse público a favor da EDP”, diz. Por isso, o Bloco de Esquerda irá chamar o Ministro à Assembleia da República, bem como o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
“Os esclarecimentos sobre este negócio que está em curso não são suficientes. Não deixaremos que este seja mais um facto consumado em que uma grande empresa como a EDP leva a melhor sobre contribuintes e consumidores”, concluiu a deputada.
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