#Publicado em português do Brasil
Brasil de Bolsonaro vive tentativa de reafirmar golpe de 1964
É hora do STF se blindar contra o vírus negacionista e anticonstitucional. Só Lula pode ressuscitar o Estado. Para isso, é preciso derrotar o lawfare
Na Argentina, governada por Alberto Fernandez/Cristina Kirchner e a Frente de Todos, neste 24 de março, foi o 45o. ano das comemorações pela Memória, Justiça e Verdade sobre as 30 mil vítimas do maior genocídio na América Latina dos últimos tempos, produto do golpe cívico-militar.
Realizaram-se mobilizações restringidas pela pandemia, mas pontuais em todo o país, desde a Praça de Maio (com fotos dos desaparecidos, representações teatrais, algumas presenças das heroínas, mães e avós dos lenços brancos, dos familiares das vítimas, Sindicatos e Associações pelos direitos humanos); grupos de vizinhança aglutinados em jardins municipais e escolas, famílias nas varandas e nas calçadas, plantaram árvores, rendendo, desta forma, a homenagem de um povo que não perde memória, reafirma o “Nunca Mais” e exige o julgamento de todas as causas pendentes de lesa humanidade.
“Plantar Memória” foi o lema do
dia. Tudo num contexto político em que avança uma promissora Reforma
Judicial, e se desvenda um escandaloso esquema do “lawfare” onde juízes,
procuradores e jornalistas seletos visitavam, repetidamente, o ex-presidente Macri,
durante o seu governo, na residência oficial de Olivos, dias antes de que a
mídia hegemônica (Clarín/
Enquanto isso, no Brasil de Bolsonaro, antes do 31 de março, caem ministros de áreas estratégicas como Defesa, Relações Exteriores, Justiça, comandantes das três Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), numa tentativa de reafirmação dos objetivos reacionários do golpe de estado de 1964. Algo muito grave, da dimensão de um autogolpe de Estado, mas sem transparências, nem efeitos paupáveis para um povo sofredor que requer medidas concretas, vítimas de uma terrível crise sanitária com mais de 330 mil mortos pela pandemia.
Entre vais e vens de especulações da grande mídia alegando um suposto laço de Bolsonaro à centro-direita, contrastando com flamejantes manchetes críticas e negativas que tendem a descartá-lo e a levá-lo ao impeachment; surgem declarações de generais (de fora e de dentro do governo) insinuando amor à institucionalidade e à democracia, contrapondo-se ao capitão-chefe. Se agrega aos fatos, o fracasso de suspeitas de quarteladas e mobilizações da extrema-direita nazi-bolsonaristas.
Porém, ao mesmo tempo, não há
nenhuma indicação evidente de que os novos generais delineiem propósitos por
uma guinada rumo à democracia entendida como bem estar social, soberania
nacional, ou um plano sanitário e econômico de urgência frente à catástrofe da pandemia produzida
pelo governo genocida. Inútil falar em democracia, sem direitos à saúde, à
vida e à sobrevivência frente à hecatombe provocada pela política privatizante
e entreguista de Paulo Guedes, sem uma mudança de rota; sem um lockdown amplo
e prolongado, um auxílio emergencial mínimo de 600 reais aos desempregados e
despossuídos e vacinação anti-covid19
Tudo indica que Bolsonaro já não serve ao “partido militar-midiático-judicial” da Lava Jato que o colocou na presidência para assegurar os interesses das corporações financeiras. Sobretudo agora que Lula está em campo e Gilmar Mendes, Levandovsky junto a outros juízes decidiram apitar o jogo segundo a constituição e não às ordens de qualquer general candidato a substituto de Villas Boas.
Enquanto isso, por ocasião do dia da Memória, Verdade e Justiça na Argentina, a vice-presidenta Cristina Kirchner, no município Las Flores disse referindo-se aos golpistas da ditadura cívico-militar dos anos 76: “Eles precisavam do desaparecimento e da tortura para impor um modelo econômico.
Nada aconteceu com aqueles que nacionalizaram suas dívidas e apoiaram a ditadura. Eles ficaram mais ricos e nos deixaram esse presente. Entre eles, a família e o grupo econômico de quem já sabemos. Os otários se fizeram quando todos os argentinos tiveram que pagar suas dívidas”, disse em clara alusão ao ex-presidente Mauricio Macri e ao grupo econômico de sua família.
O lawfare é jurídico, midiático, mas é sobretudo econômico. E este componente é o das corporações financeiras e extraterritoriais, com mãos no Departamento de Estado dos EUA.
Há 45 anos na Argentina, e 57 anos no Brasil, esse poder se impôs através do Exército, através das armas, da repressão e da tortura física. Já vimos, porém, que nas últimas décadas a arquitetura do golpe de ocupação econômica neoliberal tomou outro formato: o do golpe suave, disfarçado no lawfare. A Lava Jato é a versão brasileira do lawfare. A ex-presidenta Dilma Rousseff foi vítima das duas formas de golpe.
E o lawfare que contou na Argentina com o chamado “Partido Judicial-Midiático”, no Brasil contou com um componente militar (Partido Militar-Judicial-Midiático) que de forma “branda” ocupou ostensivamente ministérios e instituições políticas chaves, via eleições fraudulentas do Bolsonaro e do Moro, o juiz suspeito, parcial e lesa-pátria.
Este último golpe do lawfare no Brasil do ponto de vista econômico vai mais longe que o de 1964, no desmonte do Estado: privatização da Petrobrás, ameaças à Eletrobrás, Banco do Brasil e Central, redução dos direitos previdenciários e trabalhistas, dos ministérios da Saúde e Educação, etc… Tudo isso, somado ao negacionismo da Pandemia são ou não são um genocídio produzido pelo golpe “suave” do lawfare?
O último surto político antes deste 31 de março, com mudanças de ministros e comandos das Forças Armadas, e os recentes abalos no STF a favor de Lula, indicam que o lawfare (Lava Jato) que se serviu e colocou Bolsonaro e Moro no governo perde estabilidade e tentará mudar de porta-voz, enquanto o campo não for ocupado por uma força política de esquerda que o desmonte completamente.
É hora do STF se blindar contra o vírus negacionista, evangélico e anticonstitucional. A política econômica neoliberal de Guedes, esse tanque de guerra que move a Lava Jato, desmontando o Estado, impondo PECs, cortes sanitários, privatizando e desempregando não só é incompatível com o ascenso da hecatombe da pandemia, mas é inadmissível. Continuar com isso, é um genocídio, pior que mil golpes militares do passado. O lawfare econômico, vacila entre impor-se na força – com militares apátridas e milicianos – forçando o negacionismo pandêmico, portanto, o genocídio, ou trocar de máscara. O Financial Times já está preferindo esta última opção.
Biden, o Mourão, e o centrão poderão ser a nova cara do lawfare das corporações tratando de descartar Bolsonaro e recompor-se para uma estratégia eleitoral. Já sabemos no que vai dar. Além disso, o país não poderá esperar o outubro de 2022.
Lula não só representa o único candidato eleitoral das forças progressistas, nacionalistas e populares para reverter o país; mas é quem tem a experiência, o programa de emergência e de reconstrução nacional para tirar o país do atoleiro; tem a autoridade política para dialogar com todas as forças políticas progressistas nacionais e internacionais, e essencialmente com o povo, mobilizá-lo para dar-lhe protagonismo e poder.
Nas entrevistas no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e na TV Bandeirantes ao jornalista Reinaldo Azevedo, Lula deixa claro que não se atém à agenda midiática das eleições de 2022 e insiste na urgência nacional de um plano de produção e vacinação massiva para por um freio à pandemia já. E atenção! Como alertado por Dilma Rousseff nas suas recentes entrevistas: “a intervenção estrangeira não resolverá o nosso problema.”
Os EUA, nem com Trump, nem com Biden, são um exemplo para ser um interventor de causas humanitárias e, menos ainda para preservar a soberania do Brasil, em terreno minado pelas milícias de Bolsonaro.
Não há como vencer a pandemia sem a união dos povos, governos populares e sem Estado
A retirada da Argentina do Grupo de Lima, alegando que as ações do mesmo não conduziam a nada e perseguiam o único objetivo de “isolar o governo da Venezuela e seus representantes”, foi um grande golpe aos promotores do império do lawfare, do novo Plano Condor, e um impulso para relançar a retomada dos BRICs, da Unasul e consolidar um Mercosul para reintegrar a América Latina nos moldes da Pátria Grande ensaiada com Hugo Chávez e os governos progressistas do decênio inicial do século. Essa onda anti-imperialista se reativa na região. Nem López Obrador do México, nem Luís Arce da Bolívia (que entrou no Grupo na presidência da golpista Jeanine Añez) assinam os acordos do Grupo de Lima.
Apesar das barreiras sanitárias ao Brasil frente aos riscos pandêmicos produzidos pelo abandono do país por Bolsonaro, cresce a Frente político-econômica de governos progressistas e movimentos sociais da América Latina. A China é o parceiro e fornecedor de insumos para as vacinas CoronaVac do Instituto Butantã. A Venezuela, sob riscos de contaminação própria, levou oxigênio ao povo de Manaus. A vacina soberana II que a pequena Cuba, campeã no envio de médicos pelo mundo afora, produzirá em 100 milhões ao seu país e aos irmãos da América Latina, deverá chegar em breve à Argentina na fila da Sputnik-V, da Sinopharm e da Astrazenica-Oxford. O papa argentino, Francisco, na sua mensagem pascoal reitera sua aproximação com o campo progressista mundial: “que os países acelerem a distribuição de vacinas contra a Covid-19, sobretudo aos pobres”, e criticou o “escândalo dos conflitos armados e os gastos militares durante a pandemia”.
Lula é um motor fundamental dessa Frente, oxigena o tecido solidário mundial, apela à coordenação urgente dos governos na guerra contra o vírus, conclama ao G20 e especificamente a Putin, presidente do país criador da vacina cientificamente mais reconhecida e disputada no mundo. Enfim, a guerra contra o vírus requer dois antídotos: a vacina e a política justa. Não há política justa sem Estado. No Brasil, só Lula pode ressuscitar o Estado. Para isso, é imprescindível derrotar o lawfare.
Helena Iono | Opera Mundi - Buenos Aires (Argentina)
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