sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

TRABALHO DOS JORNALISTAS AFRICANOS É CADA VEZ MAIS PERIGOSO

Em 2021, a liberdade de imprensa no continente africano recuou devido ao crescente autoritarismo e à insegurança, especialmente na África Oriental, a região mais hostil para jornalistas.

No seu balanço anual sobre os abusos contra jornalistas divulgado este mês, a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) alerta para o número crescente de comunicadores detidos em todo o mundo - e África não é exceção.

"Assistimos a um número crescente de jornalistas presos. Mais de uma centena destes foram detidos arbitrariamente ao longo do último ano na África subsaariana. Só na última semana, quando divulgamos o relatório, 26 jornalistas foram detidos. A maioria dos casos acontece na Eritréia, Camarões, Benim, Etiópia, Nigéria, Uganda e Sudão", refere Arnaud Froger, membro da referida organização.

A instabilidade política, tal como os golpes de Estado de 2021 no Sudão, Mali, Guiné e Chade, levou a uma repressão generalizada dos trabalhadores dos meios de comunicação social.

Os jornalistas estão também a ser alvo tanto de governos como de grupos armados que procuram controlar o fluxo de informação em regiões devastadas pela violência e pelo conflito, tais como os Camarões, o Sahel, o Congo, a Etiópia e a Somália.

O perigo de ser jornalista na África Oriental

Mas os três países africanos que mais detiveram jornalistas em 2021 foram nomeadamente Eritreia, Ruanda e Etiópia, todos na África Oriental.

A Eritreia chegou mesmo a bater a Coreia do Norte, ocupando este ano o último lugar no ranking mundial de liberdade de imprensa dos Repórteres sem Fronteiras.

O Presidente eritreu, Isaias Afwerki, proibiu todos os meios de comunicação independentes em 2001.

Retrocessos na Etiópia

A Etiópia, particularmente, tem sido criticada por organizações de direitos humanos e pela ONU por causa da repressão à imprensa na guerra em curso entre as forças federais e os combatentes de Tigray e Oromo.

Segundo Arnaud Froger, "a única coisa que os jornalistas podem relatar são os números e narrativas oficiais das autoridades".

Na semana passada, três jornalistas foram acusados de "promover o terrorismo" após entrevistar membros do Exército de Libertação de Oromo, designado grupo terrorista pelo Governo do primeiro-ministro Abiy Ahmed.

Um decreto introduzido em novembro pelo Governo etíope proíbe o uso plataformas mediáticas para apoiar os considerados terroristas. Proíbe também a distribuição de informações sobre movimentos militares, a menos que sejam publicadas pelo Governo.

"Se fores ao outro lado do campo de batalha, como jornalista estrangeiro, pode ser preso ou deportado. O jornalismo independente não é permitido. Por causa da guerra civil, a situação piorou muito ao longo do último ano na Etiópia", destaca o especialista.

Impunidade na Somália

Dois jornalistas foram mortos este ano na Somália, elevando para mais de 50 o número de repórteres mortos no país desde 2010.

A Somália também é o pior país do mundo para resclarecer assassinatos de jornalistas, de acordo com o Comité para a Protecção dos Jornalistas do Índice Global de Impunidade 2021.

Os profissionais também enfrentam muita violência de grupos extremistas como o Al-Shabab.

Gana em queda

Já o Gana desceu o Índice de Liberdade de Imprensa da posição 22º, em 2015, para 30º este ano, com relatos crescentes de tortura e abuso de jornalistas nas mãos de agências de segurança.

Para o jornalista investigativo ganense Manasseh Azure, o ambiente no seu país se tornou mais "opressivo" desde que o Presidente Nana Akufo-Addo foi eleito em 2016.

Um exemplo é o caso do repórter de investigação Ahmed Suale, que foi morto a tiro em 2019, em plena luz do dia, na capital, Acra, poucos meses depois de um membro do Parlamento ter apelado aos seus apoiantes que atacassem jornalista.

Mas a situação não impede que alguns continuem a investigar a corrupção e a lutar pela justiça no continente africano. Azure, por exemplo, já teve de deixar o Gana duas vezes nos últimos anos devido a ameaças de morte contra ele. Mesmo assim, não desiste do seu trabalho.

Kate Hairsine | Deutsche Welle

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