Ao ser subjugado aos interesses de qualquer hierarca com muito dinheiro e pouca moral, o jornalismo deixou de ser útil à democracia e tornou-se seu maior obstáculo
# Publicado em português do Brasil
Antonio Maestre | Carta Maior
Os jornalistas tendemos a nos ter
em alta estima. Quando alguém nos ataca saímos em pelotão corporativo
proclamando que “sem jornalismo não há democracia”, acreditando que somos os
guardiões da luta contra o totalitarismo. Mas não é verdade, se um retrato
falado do jornalismo deve ser desenhado, estamos mais perto de ser o maior
perigo para as democracias liberais do que seus protetores.
O ataque ao congresso norte-americano só foi possível pelas mentiras de um
presidente que um ecossistema midiático favoreceu, promoveu e criou. A opinião
pública foi completamente intoxicada por uma maioria da mídia a favor do poder
e que, na maioria dos casos, não hesitou em manipular e espalhar boatos. Em
muitos outros, mostrou uma postura de tibieza e covardia diante do que
significaria enfrentar um presidente sem escrúpulos no exercício despótico de
seu poder.
O resultado dessa distribuição midiática é que 68% dos republicanos acreditam
que as eleições de Donald Trump foram roubadas, e isso não se consegue alcançar
com uma conta do Twitter escrita em letras maiúsculas. É preciso haver uma FOX
e um ecossistema de mídia cujo poder ideológico prevalece sobre a verdade, o
rigor e a honestidade.
A mentira tem potencial de arma de guerra em tempos de paz, um mecanismo de destruição em massa que serve para exonerar criminosos ou negligentes de responsabilidades, por isso é possível que haja mais pessoas que acreditem que Pablo Iglesias [ex-vicepresidente do governo e ex-dirigente do Podemos] foi o responsável pelas residências de idosos [e consequentemente por mais de 30 mil mortes] no pior da pandemia em vez de Isabel Díaz Ayuso.
Ao ser subjugado aos interesses de qualquer hierarca com muito dinheiro e pouca moral, o jornalismo deixou de ser útil à democracia e tornou-se seu maior obstáculo.
O jornalismo nada mais é do que uma potência mais completamente intoxicada pelas dinâmicas que emanam do capital, haverá meios de comunicação mais decentes e jornalistas em quem se confia, mas não se enganem, se os jornalistas estivessem representados num hsemicírculo com 350 lugares, mais de 300 estariam ocupados pela direita e pela extrema direita.
Esse é o ambiente midiático em que nos movemos e até quebrarmos o tabu e assumirmos que é preciso enfrentar uma reforma jurídica que equilibre o equilíbrio midiático, a mentira da reação valerá muito mais na política do que todas as boas medidas, certezas, verdades e o rigor científico de qualquer proposta deste governo ou de qualquer outra que eles acreditem pertencer a ele.
A verdade não importa quando não há quem a diga para que alguém a possa escutar. Se a democracia morrer no século XXI, aquele que lhe dará o golpe de misericórdia será um jornalista.
Imagem: Nesta foto, de 6 de
janeiro de 2021, apoiadores do presidente dos Estados Unidos, Donald J. Trump,
aparecem durante o ataque ao Capitólio em Washington. (EFE/EPA/Michael
Reynolds/FILE)
*Publicado originalmente em El
Diário | Tradução por César Locatelli
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