Artur Queiroz*, Luanda
Cada refugiado que morre no mar Mediterrâneo é um crime de guerra que deve ser imputado ao alto comando da NATO e aos governos dos EUA e da União Europeia. É altura de repudiar a propaganda, as mentiras, as mistificações, a suprema hipocrisia que assaltou o mundo mediático, sobretudo quando uma repórter fotografou uma criança de borco, que deu à costa a uma praia da costa da Turquia.
Milhões de seres humanos estão a viver os horrores da guerra e as acções particularmente destruidoras do Banditismo Político Violento que se instalou ao nível do poder nos países ocidentais. Desde o Magrebe ao Afeganistão, os países da NATO lançaram um rasto de morte e destruição que vitimou milhões de seres humanos. Ninguém sabe quando os algozes se saciam com o sangue das suas vítimas.
Tudo começou com a Primeira Guerra do Golfo, em 1990/1991 com a famigerada “Tempestade no Deserto”. O Iraque, um país próspero e o mais progressista da região, foi simplesmente destruído. Eu vi bombardear Bagdade. Sofri os efeitos dos rebentamentos dos mísseis “Cruzeiro” e dos bombardeamentos aéreos contínuos, todas as horas de intermináveis dias.
Oficialmente morreram 25 mil soldados iraquianos e 248 da “coligação internacional”. Os feridos foram mais: 75.000 iraquianos e 776 da coligação. Mas ninguém fala dos mortos e feridos civis. Porque Washington e Londres venderam a balela de que os bombardeamentos eram “cirúrgicos” e só causavam baixas militares. Mas eu vi os corpos destroçados de mulheres e crianças nos bairros populosos da periferia de Bagdade, em Ramadi ou em Rutbah, já perto da fronteira com a Jordânia.
E vi milhares e milhares de refugiados. O Iraque era o país de destino de emigrantes dos países do Médio Oriente e sobretudo do Paquistão. Centenas de milhares trabalhavam naquele país. Quando começaram a rebentar os mísseis “Cruzeiro”, mais de um milhão de pessoas fugiu para a Turquia, mas sobretudo para a Síria e a Jordânia. Números oficiais da ONU: mais de dois milhões de refugiados da guerra do Iraque (iraquianos ou não) estão ainda hoje, em condições desumanas, na Síria e na Jordânia.
A segunda Guerra do Golfo, em 2003, desencadeada pelos EUA depois da Cimeira das Lajes, com George W. Bush (Washington), Tony Blair (Londres), Aznar (Madrid) e Durão Barroso (Lisboa), transformou os campos de refugiados da Síria e da Jordânia em colmeias humanas permanentes, sem as mínimas condições de vida. Eu vi aquela tragédia.
Com o início da guerra da Síria, desencadeada por Washington, Paris, Londres e Berlim mais milhões de pessoas viram as suas vidas ameaçadas e tiveram que fugir. Mesmo aquelas que há mais de 20 anos vegetavam nos campos de refugiados que nasceram com as guerras do Iraque.
A “rota da energia” está a ser devastada pela guerra da NATO. A Primavera Árabe foi o truque usado para destabilizar e derrubar regimes sólidos e estáveis na Tunísia e no Egipto. Na Líbia, as potências da NATO decidiram desencadear mais uma guerra que culminou com o assassinato do Presidente Kadhafi. Destruíram um país próspero e que vivia décadas de paz e estabilidade. Hoje a Líbia não existe. Dezenas de milícias, armadas, municiadas e financiadas pelos países da NATO, da União Europeia e dos EUA, disputam o poder de armas na mão. O petróleo líbio é roubado pelos países que lançaram a guerra.
No Afeganistão a ocupação estrangeira acabou. A NATO fingia que saía mas não saía, as potências ocidentais retiravam mas não retiravam. Até que saíram mesmo, à força. Mais milhares de vítimas civis e milhões de refugiados. Cada um que morre na fuga é um crime de guerra. Os criminosos são os Governos dos países da União Europeia, dos EUA e o alto comando do bloco militar que está a semear a guerra, a destruição e a morte em todos os países da “rota da energia” entre o Magrebe e o Oriente, mas também na África Ocidental e Oriental. Basta olhar para a Nigéria, o primeiro produtor de petróleo do continente. E para Moçambique.
Portugal está presente na guerra do petróleo como membro da NATO e da União Europeia. Todos os países do bloco militar têm o dever de acolher os refugiados. Todos, sem excepção. São eles os senhores da guerra, é a eles que compete acolher as vítimas do Banditismo Político Violento (não gosto da palavra terrorismo). São eles que têm de levar a paz e a estabilidade aos países onde estão a fazer a guerra. São eles que têm de reparar os danos causados pelas suas agressões armadas.
Acima de tudo, são os países da NATO e da União Europeia que têm de desarmar a sua criação mas tenebrosa: o Estado Islâmico. Essa organização é filha da NATO e das políticas das grandes potências ocidentais. Acabem com ela.
Por fim, não aceito o argumento
idiota de que os países da NATO e da União Europeia fizeram bem
É preciso dizer um rotundo não aos criminosos de guerra que afogam civis inocentes nas águas do Mediterrâneo. E essas vítimas são refugiados, não são migrantes. O Direito Internacional dá-lhes especial protecção. É bom que ninguém ignore essa realidade. E sobretudo, é bom que todos tenham presente que os nazis da Ucrânia são os únicos responsáveis pelos milhões de refugiados ucranianos. Dar-lhes dinheiro e armas, sim, é um crime contra a Humanidade.
*Jornalista
Sem comentários:
Enviar um comentário