domingo, 3 de julho de 2022

Angola | Piratas Atacam Noticiários à Vista Desarmada – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A Luna Queiroz está ao meu lado. Faz desenhos estendida no chão e com uma mão amparando a cabeça. Dispara perguntas de minuto a minuto. É uma assanhada do Catambor. Filha do Eurico, neta do repórter Artur e bisneta do poeta Geraldo Bessa Victor. A avó paterna é a pintora Helena Justino, que mostrou as suas primeiras telas no Salão de Arte Moderna de Luanda, nos anos 60. Foi discípula do mestre Cruzeiro Seixas. Estava eu burilando um parágrafo e ela disparou: Sabias que vou votar no MPLA? Olhei para aquela amostra de gente com seis anos e pedi-lhe para não votar. Porque os sicários da UNITA aproveitam a oportunidade para provar que afinal houve mesmo fraude eleitoral. Levei com mais 50 perguntas em cima.

Hoje é a sério. O noticiário das 13 horas da TPA foi abaixo. O som totalmente dessincronizado da imagem. Entrada cinco minutos depois da hora. Corte alguns minutos depois. Pedido de desculpas pela interrupção devido a problemas técnicos. Uma desgraça. Fui saber o que está a acontecer. E o resultado da minha reportagem não é bom. Pelo contrário, é preocupantemente mau. Tomem nota. Um grupo de piratas informáticos, recrutado em Lisboa, está a atacar a TPA. O próximo alvo vai ser a paginação electrónica do Jornal de Angola e a sua edição on-line.

Até agora não consegui reconfirmar (só tenho a confirmação e isso não chega) quem em Angola está implicado nos ataques. Nem isso interessa aos jornalistas, já que se trata de um caso de polícia. E muito sério. Tem que ser levado a sério. A Comissão Nacional Eleitoral dispõe dos mais avançados sistemas do mundo. Mas é vulnerável à pirataria informática. Todo o cuidado é pouco. Que não se repitam os ataques à TPA. Não se esqueçam que Abel Chivukuvuku tem um curso superior de terrorismo e na direcção da UNITA há muitos peritos em agitação e guerrilha urbana.

Em 1992, Savimbi decidiu ocupar militarmente quase todo o país para depois fazer um ultimato ao governo legítimo: Ou se rendem ou morrem! Nas eleições de 24 de Agosto vai ser muito diferente. O recrutamento de Chivukuvuku pela direcção da UNITA dá sinais inquietantes. A próxima derrota do Galo Negro, desta vez, pode ser seguida de acções armadas nas principais cidades. Não necessitam de tanta tropa nem tantas armas como em 1992. Abram os olhos. Jikulumessu!

(Nesta parte a Luna mostrou-me o desenho de um cão deitado ao lado de um barbudo que sou eu enquanto velha árvore carcomida)

Por falar das eleições de 1992, permito-me recordar que nessa altura, os cientistas políticos e quem dirigia a campanha eleitoral do MPLA, defendiam abertamente que o partido tinha a imagem estragada e, por isso, o melhor era fazer uma campanha autónoma para o Presidente José Eduardo dos Santos. Timidamente expliquei que o MPLA em Angola é uma marca imbatível, desde os anos 50. E dificilmente deixa de ser, nos próximos 50 anos. Muito por culpa da Oposição. Contados os votos, foi fácil concluir que o MPLA valia mais do que o seu líder. 

Nas eleições seguintes, o demérito da Oposição foi de tal forma notório que dificultou a avaliação do valor do MPLA e do seu líder. Mas dos 81 por cento de votos averbados, seguramente que o partido valeu mais do que metade.

Nas eleições de 2012 aconteceu a inversão. Ficou claro que o líder já valia mais do que o MPLA. E a diferença era significativa. Houve claramente uma perda de valor ao nível da direcção do partido. 

Em 2017, voltou a colocar-se o problema. Qual era a marca mais valiosa, o MPLA ou o seu cabeça de lista? A resposta não foi difícil de estruturar. Porque José Eduardo dos Santos ainda era o líder do MPLA. João Lourenço não entrava nesta avaliação porque a sua posição no topo da lista foi caucionada pela direcção partidária e pelo líder.

Agora sim, é preciso avaliar correctamente qual é a marca maias valiosa nas eleições de 24 de Agosto. Não posso ir muito além da minha avaliação das circunstâncias. É público e notório que o marketing político decidiu subalternizar o MPLA e valorizar o líder. Para fazerem manobras tão arriscada é porque têm estudos que a suportam. 

Não sou brasileiro perito na matéria. Não sou romancista russo nem estúpido. Sou apenas o avô da Luna Queiroz, a assanhada que agora dorme a sono solto, mesmo aqui ao meu lado. Mas posso dizer, sem receio de ser desmentido, que subalternizar o MPLA é um erro. Só não sei de que tamanho. Mas errado, é!

*Jornalista

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