quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Angola | FRALDAS E BABETES NA PGR – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A reforma por velhice em Angola é aos 60 anos. O senhor Procurador-Geral da República tem a bonita idade de 66 anos (uma capicua, como ele…) mas quando foi registado, já andava de bicicleta e piscava o olho às miúdas. A lei da vida costuma ser inexorável mas há excepções. Hélder Pitas Grós, em vez de ir para casa por ter atingido o limite de idade, vai ser reconduzido para um novo mandato de cinco anos. Um fenómeno que passo a explicar.

O plenário do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público propôs ao Presidente da República João Lourenço a recondução no cargo de Hélder Pita Grós. O mesmo Pita Grós preside ao conselho. É o dono do bocado. Manda e comanda, não fosse sua excelência general. Por estas e por outras, Tribunais de alguns países (Suíça, Espanha e Portugal) consideram que a Procuradoria-Geral da República em Angola não tem autonomia. Logo, não há Justiça, como diria o condecorado Rafael Marques. Eu não sou tão radical. Há alguma autonomia mas o senhor Procurador-Geral é pouco autónomo.

Inesperadamente, o plenário do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público também propôs que Hélder Pitta Grós cumpra mais um mandato como presidente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público. Fica tudo em casa.

Na reunião foram propostos para a eleição ao cargo de Vice-Procurador-Geral da República e 1.ºvice-presidente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público os nomes de Inocência Maria Gonçalo Pinto (foi a mais votada) seguida de Pedro Mendes de Carvalho (quatro votos), Gilberto Mizalaque Balanga Vunge (três votos). Está feita a pandilha. O chefe fica com o Ministério Público no bolso e ai dos marimbondos e seus derivados! Todos presos, Tudo confiscado. Volta, Mobutu, estás perdoado!

Este é o melhor dos mundos para o derradeiro mandato do Presidente João Lourenço. Mas é péssimo para a Justiça Angolana. Porque sua excelência o Procurador-Geral da República não tem autonomia. Foi ele que acusou o Miala naquele processo que acabou bem para o acusado. Mas o seu regresso ao poder (todo o poder!) pela mão do líder do MPLA e Presidente das República deixou Hélder Pita Grós em maus lençóis. 

O acusado e condenado de ontem é hoje o presidente de facto. E só perdoou ao acusador no seu processo em Tribunal Militar, porque ele aceitou ficar sob as suas ordens. Chantagem e extorsão, como tanto gosta o chefão de Kinkuzu. Coitado do Hélder Pita Grós. Se não aceitasse ficar sob a patorra do Miala, era logo catalogado de marimbondo. Ficava sem nada e até arriscava a prisão. Lembrou-se dos Tuneza e preferiu ser o General Foge a Tempo. No caso, general que se entrega todo o tempo.

Esta perda de autonomia tem uma faceta bem mais grave. O orçamento para a Procuradoria-Geral da República tem de ser reforçado porque, a partir de agora, é preciso contratar uma equipa técnica para lhe mude as fraldas devido à incontinência urinária e já não segurar as fezes. Também precisa de quem lhe dê a papinha na boca e lhe limpe a baba. Tudo despesas. Mas a causa é boa. Hélder Pita Grós não vai dar descanso aos marimbondos em nome do Miala. Quem não alinhar nestas iniquidades é saneado. Esperem para ver quem sai da PGR.

A senhora ministra da Educação, Luísa Grilo, deu uma entrevista à TPA na qual foi mais clara e contundente do que os líderes sindicais que não têm acesso àquela porcaria e ainda bem. Luísa Grilo justificou com abundantes pormenores, a justeza das greves dos professores. A honestidade é muito bonita.

Nas fileiras do MPLA aprendi que as lutas dos trabalhadores são sempre para apoiar e que todas as greves são justas. Na luta de classes, estou sempre ao lado dos explorados. Os arautos do poder puseram a circular que os partidos da Oposição estão por trás das greves dos professores. Só oposicionistas totalmente incompetentes não se aproveitam dos conflitos sociais.  Cabe a quem está no governo não dar esses pretextos.

A senhora ministra Luísa Grilo disse na TPA que sim, é verdade, os professores são pagos como administrativos e não como técnicos do Ministério da Educação. Reconheceu que sim, até hoje não existe um levantamento dos professores que trabalham na periferia e nas regiões mais longínquas e isoladas. Professores colocados na escola da Vila Clotilde, Rua José Anchieta, em Luanda, são tratados como professores que dão aulas nas escolas de Lumbala Nguimbo, Muié, Curoca, Camucuio ou Xamavera.

A sinceridade da senhora ministra Luísa Grilo foi ao ponto de reconhecer que até hoje o seu ministério não sabe das necessidades de professores nas periferias e regiões mais longínquas. Mas garantiu que está a trabalhar nisso. Já não é mau.

As novas escolas a construir vão ter obrigatoriamente casas para os professores. A escola primária número 78, no Negage, construída há 80 anos, já tinha, geminada, a moradia da senhora professora. E nesse tempo existia o Clube Desportivo com um grande salão de festas onde era exibido um filme por semana e havia bailes nas datas festivas. Só não tínhamos um centro de saúde. Muita criança morria com doenças facilmente curáveis. Atenção! Era tudo só para brancos…

O senhor Esteves vendia quinino e sulfamidas. A casa Gaspar & Fernandes vendia sapatos e roupinha. A vida, senhora ministra, não é só casa e comida. As professoras e professores, quando são colocados em áreas recônditas, precisam de assistência médica para eles e seus filhos., Precisam de equipamentos sociais e oferta cultural. Precisam de transportes públicos. Precisam de espaços comerciais. Precisam de viver. Já agora, se forem minimamente respeitados e considerados, eles agradecem.

Na luta de classes é assim: Pouco dinheirito pouco trabalhito. Respeitem os professores. Paguem-lhes salários dignos. Garantam aos professores condições de vida aceitáveis. E não me venham dizer que muitos mal sabem ler e escrever. Numa sala de aulas, basta a presença de alunos e professores para todos aprenderem. Falarem uns com os outros é meio caminho andado para abrir as portas à sabedoria. Deixem-se de elitismos idiotas. O professor da minha vida foi o Velho Tuma e não sabia ler nem escrever. Mas foi ele que me ensinou a cantar o Homem e as suas armas. Que somos uma dignidade infinita. Únicos e irrepetíveis.

*Jornalista

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