O incêndio que deflagrou na Mouraria, em Lisboa, provocando dois mortos e 14 feridos entre os 20 habitantes que viviam amontoados num pequeno T0, motivou "um intenso debate sobre a lei da imigração e quem aceitamos ou não aceitamos em Portugal."
Daniel Oliveira | TSF | opinião
No seu espaço habitual de comentário na antena da TSF, Daniel Oliveira nota que enquanto as famílias de classe média foram expulsas de Lisboa e Porto devido à escalada incessante dos preços das casas, no centro das cidades ficam apenas ou "os mais ricos" ou "os trabalhadores imigrantes desqualificados que se sujeitam a viver amontoados a 150 euros por cabeça, sem privacidade, direito ao descanso e direito à dignidade humana que merecem".
"A transformação do imobiliário no mercado financeiro está a construir um enorme condomínio de nómadas digitais e estrangeiros abastados, que é interrompido por miseráveis que fazemos por ignorar."
Questionado sobre o caso, o presidente do PSD, Luís Montenegro, disse que Portugal tem de escolher que tipo de imigrantes quer para serem "os colaboradores do nosso desenvolvimento".
"Terão morrido aqueles imigrantes, porque não eram os imigrantes, certos?", questiona Daniel Oliveira.
Luís Montenegro reformulou o argumento no dia seguinte: Devemos "procurar pelo mundo as comunidades que possam interagir melhor connosco, que se possam integrar melhor na nossa cultura, na nossa identidade."
"Terão morrido aqueles indianos porque não interagiam bem connosco? Terá um nepalês de Olhão sido espancado por não se ter integrado na nossa cultura? E o que é que é estar integrado na nossa identidade? É serem brancos, cristãos e falantes de português?"
O comentador lembra que Portugal deve muito aos emigrantes que trabalham no país: pagam mais 1200 milhões de euros à segurança social do que recebem, contribuindo para atenuar os efeitos do envelhecimento demográfico, e sem eles setores como o turismo, a restauração e a construção civil "colapsariam".
Para Daniel Oliveira, o PSD encontrou "a melhor forma de matar a conversa de um eventual entendimento com o Chega: passar a dizer as mesmas coisas que o Chega."
O Presidente da Câmara, Carlos Moedas, também comentou o caso, "não para falar das vistorias às habitações, que são competência sua", mas também para criticar a lei de imigração. "Já é um clássico", ironiza Daniel Oliveira, "sempre que alguma coisa acontece na cidade, Moedas tenta arranjar um tema que nada tenha a ver com as suas funções".
O autarca propõe que só possa vir para Portugal quem tenha contrato de trabalho assinado antes de chegar. No entanto, apoia publicamente empresas conhecidas por exploração laboral, condena Daniel Oliveira.
Recentemente, conta, ofereceu um edifício camarário para à Globo, uma plataforma eletrónica de distribuição da restauração, para que ali instalasse a sua sede. "Quem julga ele que trabalha nestas distribuidoras? Portugueses? Se sabe que são imigrantes, saberá que não tem contrato? E que posição tem o seu partido sobre gerência de relações contratuais entre as plataformas e aqueles a quem chamam parceiros?"
Empresas como estas podem ser "úteis e cómodas para quem as usa", mas os cidadãos do Nepal, da Índia ou do Bangladesh que habitualmente trabalham na entrega de refeições sem contrato de trabalho, são pagos por casa serviço, a baixo custo, e "assumem todos os custos e riscos da entrega - se adoecerem ou tiverem um acidente, ficam sem receber", lembra Daniel Oliveira. "São o arquétipo do "colaborador", na terminologia encontrada para tirar deveres ao patrão."
Moedas e Montenegro podem defender que os imigrantes precisem de contrato de trabalho para viver em Portugal, mas também defendem "um modelo das plataformas que só funciona com milhares de supostos parceiros sem contrato", incentivado "um limbo onde a exploração e a proliferação de máfias da imigração se dão tão bem".
"Para a imigração, exigem as velhas relações laborais que desprezam e, assim, pedindo a quadratura do círculo, lá vão culpando as vítimas da exploração que defendem", condena.
Texto: Carolina Rico
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