terça-feira, 25 de abril de 2023

Portugal | Milhares desfilam na Avenida da Liberdade para celebrar o 25 de Abril

Manifestantes pedem "trabalho, igualdade, ambiente, escola pública" e o "aumento real dos salários" nos cartazes no desfile até ao Rossio. PS e BE apontam o dedo ao Chega, enquanto a Associação 25 Abril critica os "saudosistas da ditadura".

Na Avenida da Liberdade, em Lisboa, milhares de pessoas participam na tarde desta terça-feira no tradicional desfile popular do 25 de Abril.

Cerca de uma hora antes do início do desfile, marcado para as 15:00, a zona do Marquês de Pombal já estava ocupada por cidadãos, identificados com partidos políticos e anónimos, com cravos vermelhos, apitos, megafones, tambores e faixas com palavras de ordem.

Ao longo do percurso havia já também largas dezenas de populares, aproveitando a sombra, e a aguardar também a passagem do cortejo para entrar no desfile.

Pede-se "trabalho, igualdade, ambiente, escola pública" e o "aumento real dos salários" no muitos cartazes empunhados por pessoas que se vão movimentando ao logo da avenida, antes mesmo do início oficial do desfile.

Cidadãos anónimos, cravo ao peito ou nas mãos, também traziam apitos e cartazes, onde se lia "Liberdade de expressão",

"A liberdade conquista-se todos os dias", "Orgulhosamente livre", "Há alturas em que e preciso desobedecer", referem outras mensagens.

Entre os manifestantes, a pouco mais de meia hora para do início do desfile era já bem audível o som do protesto de algumas centenas de professores a ocupar a lateral do Marquês, na rua Braamcamp, atrás de uma faixa do Sindicato de Todos os Profissionais de Educação (STOP), onde se pode ler "Só não há dinheiro para quem trabalha".


PS critica quem quer "normalizar os descendentes dos fascistas"

O socialista Porfírio Silva criticou quem quer "normalizar os descendentes dos fascistas", confundindo a "extrema-direita antidemocrática com a esquerda parlamentar", e defendeu a necessidade de "lutar contra os inimigos da democracia".

"Quem confunde a extrema-direita antidemocrática com a esquerda parlamentar e quer normalizar os descendentes dos fascistas está muito enganado acerca do que é preciso fazer hoje", afirmou o diretor do gabinete de estudos e secretário nacional do PS durante o desfile do 25 de Abril, na Avenida da Liberdade.

O membro da Comissão Permanente do PS afirmou que a mudança que se iniciou a 25 de Abril de 1974 é "para continuar", e que é "preciso que os mais novos venham a essa transformação".

"Pensávamos que a democratização estava garantida, mas hoje sabemos que para conseguir continuar o desenvolvimento, temos que voltar a lutar pela democracia, temos que voltar a lutar contra os inimigos da democracia, contra aqueles que não respeitam as regras de convivência", defendeu.

Questionado se estava a referir-se ao Chega, Porfírio disse estar a "falar de todos aqueles que não respeitam as regras da convivência democrática" e também "daqueles que confundem tudo", nomeadamente "quem confunde a extrema-direita, que tem saudades do fascismo e que se pudesse faria uma nova ditadura", com a "esquerda parlamentar".

O deputado do PS afirmou que os socialistas têm "diferenças programáticas, propostas diferentes, mas a esquerda parlamentar faz parte da democracia, é uma contribuinte líquida para a pluralidade, para o pluralismo democrático".

Porfírio Silva defendeu também que "a saúde democracia nunca está garantida contra aqueles que fazem tudo" para a destruir e apontou que "o primeiro momento para destruir a democracia é substituir a argumentação, as razões, o contraditório democrático pela violência verbal, e a violência verbal normalmente é o primeiro ponto para a violência física".

E apelou ao "respeito pela diferença" e pelas "regras democráticas".

"Nós precisamos disso para que o país se continue a focar no combate pelas condições de vida das pessoas, porque há muita coisa para melhorar, nós temos consciência disso, há muita coisa ainda para fazer", defendeu.

Questionado sobre o ano de governação socialista com maioria absoluta e as polémicas em que esteve envolvido o Governo, o deputado do PS disse que "há erros, há coisas que, em termos comportamentais, era melhor que fossem de outra maneira".

"Mas estamos convictos de que, no essencial, naquilo que diz respeito a combater a crise inflacionista e combater as consequências de uma guerra na Europa e continuar a lutar pelas condições de vida dos portugueses, estamos conscientes de que, nesse aspeto fundamental, vamos conseguir chegar lá e vamos conseguir dar uma oportunidade àqueles que na sociedade têm menos oportunidades", salientou.

Líder comunista diz que é preciso "caminhar muito para cumprir Abril"

O secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, alertou que ainda é preciso "caminhar muito para cumprir Abril", considerando que um governo com maioria absoluta podia fazer "muito mais".

"Eu acho que a prova que estamos a ver aqui, nesta avenida, e um pouco por todo o país, demonstra que o 25 de Abril está vivo, tem muita força, e tem milhares para o defender", afirmou, em declarações aos jornalistas durante o desfile do 25 de Abril.

O líder comunista alertou, no entanto, que "é preciso ainda caminhar muito para cumprir Abril".

"O que nós entendemos é que podia-se fazer muito mais do que aquilo que é feito, em particular num Governo com maioria absoluta", defendeu, apontando que o Executivo "tinha todos os instrumentos para responder aos problemas das pessoas".

Paulo Raimundo apontou que falta cumprir Abril "num conjunto muito largo de situações da vida" como "salários, pensões, na qualidade de vida, no aumento das condições de vida, nas questões da saúde, na habitação".

"Tudo questões às quais é necessário dar resposta, que Abril abriu esse caminho e que é preciso concretizar, e é isso que as pessoas estão aqui a fazer, afirmar Abril, a Revolução, e afirmar a necessidade de cumprir Abril, que é coisa que estamos ainda um pouco longe de fazer", defendeu.

Questionado sobre os protestos desta manhã dentro e fora da Assembleia da República, Raimundo afirmou que "são aspetos muito pontuais, muito isolados, que não têm a expressão que procuram ter".

"Há pessoas que lidam mal com a democracia e com a liberdade, [mas] só são possíveis porque nós conquistámos a liberdade, senão não era possível", assinalou.

O secretário-geral do PCP alertou que "a democracia é sempre uma questão que é preciso preservar, todos os dias trabalhar para a construir e para a melhorar, isso é uma evidência".

"A democracia é preciso sempre preservá-la e uma das questões fundamentais da democracia é garantir a justiça social e a resposta aos problemas das pessoas", defendeu.

Sobre estarem presentes várias gerações de pessoas no tradicional desfile na Avenida da Liberdade, o comunista considerou que "quer dizer que Abril é presente e é futuro".

"Não é só a dimensão, o número de pessoas que aí estão, é a forma como cada um de nós está nisto, determinados, convictos que é por Abril que temos que ir", salientou.

Na comitiva comunista, liderada por Paulo Raimundo, estava também o ex-secretário-geral do PCP Jerónimo de Sousa, que foi aplaudido quando chegou.

Questionado sobre este ser o seu primeiro 25 de Abril enquanto líder do PCP, Paulo Raimundo recordou que no ano passado também marcou presença, mas tinha "outras responsabilidades".

"Este ano ainda está com mais força do que estava no ano passado, é muito positivo, fico contente com isso naturalmente", disse.

BE diz que perante "cenas patéticas" na AR o importante é força popular

A coordenadora do BE defendeu que "cenas patéticas no parlamento" como o protesto do Chega "são absolutamente subalternizadas" pela "força gigantesca popular" de quem comemora a democracia no tradicional desfile do 25 de Abril da Avenida da Liberdade.

Catarina Martins falou aos jornalistas durante a descida da Avenida da Liberdade, em Lisboa, considerando que é nestes momentos que "se encontra a força da democracia".

"E a força popular está aqui, está na celebração da democracia, que é uma celebração cheia porque vemos como vem tanta gente à avenida e tanta gente pelo país se junta nas mais diversas celebrações do 25 de Abril e traz consigo as reivindicações concretas de que é feito o 25 de Abril: a paz, o pão, a habitação, a saúde, a educação. É aqui que está a força popular, ninguém tenha dúvidas sobre isso", disse.

A líder do BE foi questionada sobre o protesto do Chega durante a intervenção no parlamento do Presidente brasileiro, Lula da Silva.

"As cenas patéticas a que podemos assistir são absolutamente subalternizadas face à força gigantesca popular de quem comemora a democracia, aqui na Avenida da Liberdade e um pouco por todo o país, porque quem sai pelas causas concretas, isso é que conta. É aqui que está a força popular, é aqui que conta a democracia", enalteceu.

Para Catarina Martins, este desfile "faz sempre sentido", mas "é verdade que numa altura em que o Governo parece desculpar-se com as crises para não responder ao país", é fundamental "que o povo saia à rua a falar do que importa".

"Assistimos a cenas patéticas no parlamento. Devo dizer que o importante é esta força popular, as pessoas que saem à rua saem à rua pelo que conta", reiterou, perante a insistência dos jornalistas.

Alertando que "a democracia ou responde pelos anseios populares ou fica em crise", na opinião da líder do BE "quando as pessoas saem à rua para reivindicar esse futuro melhor, a democracia está a fortalecer-se e é isso que é fundamental neste momento".

"Venho a todos os desfiles da mesma forma e continuarei a vir seguramente. Celebrar o 25 de Abril pela avenida não tem a ver com cargos institucionais nem partidários, tem a ver com esta festa da democracia", respondeu quando questionada sobre se este desfile era especial tendo em conta que será o último como líder do BE.

Atrás de Catarina Martins estava precisamente a deputada Mariana Mortágua, que será candidata à liderança do BE na convenção do final de maio.

IL diz que regresso ao desfile é "luta pela liberdade" e à génese do partido

O presidente da IL afirmou que o regresso ao tradicional desfile do 25 de Abril significa que o partido não desistiu de "lutar pela liberdade", o que faz parte da "génese e presença cívica e política" dos liberais.

Ao contrário dos últimos dois anos, em que o partido liderado agora por Rui Rocha promoveu um desfile próprio neste dia após uma polémica com a comissão organizadora, desta vez a IL decidiu regressar às comemorações populares do 25 de Abril, tal como tinha feito nos dois primeiros anos da sua história.

"A Iniciativa Liberal tem estado sempre na Avenida da Liberdade, desta vez integramos a marcha e isso significa que não desistimos de lutar pela liberdade, mesmo quando nos tentam impedir como no passado, em algum momento, aconteceu", defendeu Rui Rocha em declarações à Lusa.

O líder dos liberais avisou "que não vale a pena tentar condicionar a presença da Iniciativa Liberal" porque "o espaço da liberdade é de todos".

"A IL tem uma presença de luta pela liberdade em Portugal, em todos os países do mundo onde ela, infelizmente, não está presente. Portanto, faz parte da nossa génese e da nossa presença cívica e política lutar pela liberdade", frisou.

Além "dos condicionamentos próprios da situação pandémica", segundo Rui Rocha, o partido sofreu "alguma resistência, em alguns momentos, à descida integral da avenida".

Rui Rocha mostrou-se satisfeito pela "grande adesão" dos simpatizantes e membros da IL e também pela representação de várias comunidades de outros países.

"Temos, também, a representação de várias comunidades. A comunidade ucraniana, da comunidade cubana, da comunidade iraniana, afegã, moldava. Também uma reunião de muitas comunidades e de muitas vontades pela liberdade em todo o mundo", concluiu.

A IL voltou hoje a integrar o tradicional desfile comemorativo do 25 de Abril na Avenida da Liberdade, em Lisboa, depois de dois anos seguidos em que promoveu uma iniciativa própria.

Em 2021, após uma semana de polémica com a comissão promotora do desfile comemorativo do 25 de Abril e depois de uma recusa inicial de poder integrar este momento, a IL promoveu o seu próprio desfile para comemorar a Revolução dos Cravos, um formato que repetiu no ano seguinte.

Desde a sua fundação, a IL participou nestas comemorações populares em 2018 e em 2019, um desfile que não se realizou em 2020 devido à pandemia. Nos dois anos seguintes, os liberais tiveram um desfile próprio após a polémica com a comissão promotora do desfile comemorativo do 25 de Abril.

Associação 25 Abril pede preservação da Democracia contra os "saudosistas da ditadura"

O capitão de Abril, Rodrigo Sousa e Castro, desafiou os participantes no desfile comemorativo da Revolução a exigir a preservação da democracia, numa altura em que "saudosistas da ditadura" minam as instituições e promovem o ódio.

"Numa altura em que os saudosistas da ditadura, da guerra e do colonialismo, aproveitando os mecanismos democráticos, minam insidiosamente as instituições, manipulando as legítimas aspirações populares, voltam a trazer para a sociedade portuguesa o discurso do ódio e da xenofobia e praticam o desrespeito pelas mais elementares regras democráticas, temos que exigir aos órgãos de soberania que cumpram os seus deveres, particularmente aos Tribunais, que apliquem as leis que preservam a Democracia", disse o agora coronel, em nome da Associação 25 de Abril.

O antigo capitão considerou ainda que a participação no desfile "é a prova da tolerância que deve informar a prática democrática, a prova de que a diversidade e a inclusão, o civismo e o humanismo são os valores de Abril proclamados pela Revolução".

Salientou que a revolução criou "condições para que novos países se tornassem independentes" e se afirmassem internacionalmente, "instituições democráticas, liberdades políticas e um país seguro e pacífico".

No entanto, "onde estão as medidas para combater as desigualdades e garantir equidade e justiça social? E até onde desistimos da regulação da economia de modo a não privilegiar apenas interesses meramente privados em vez de a colocar prioritariamente ao serviço da comunidade? Até onde falhámos ao permitir a continuação de velhos corporativismos e a emergência de novos? E de grupos de pressão que reduzem a democracia, abafam a criatividade e desprezam o mérito?", questionou.

Sousa e Castro evocou ainda os três militares de Abril Otelo Saraiva de Carvalho, Melo Antunes e Salgueiro Maia, "pela sua ação e pelas excecionais qualidades demonstradas antes, durante e após a ação militar libertadora".

"Otelo pela sua pertinácia e eficácia organizativas", Melo Antunes, "o cidadão militar", que com a sua "inteligência, cultura e visão lúcida" deu ao Movimento dos Capitães "um programa político essencial, que abriu caminho à democratização inspiradora da Nova República", e Salgueiro Maia, "aquele que, de entre nós, melhor representou e desempenhou a ação libertadora no terreno do confronto com as forças que apoiavam a ditadura".

De Otelo, Sousa e Castro afirmou que foi "vilipendiado em vida e desprezado na morte pelos poderes instituídos, que a sua ação revolucionária deu à nascença" e de Salgueiro Maia destacou que foi "incompreensivelmente maltratado pela própria instituição militar, menosprezado por alguns detentores do poder político", mas fica na memória "como um valente e no coração do povo como sua pertença".

Diário de Notícias | Lusa | Imagem: Gerardo Santos / Global Imagens

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