Lagarde não apenas veio, durante a sua visita, insultar o povo português, como veio anunciar novos aumentos das taxas de juro para Julho, castigando os mesmos de sempre por problemas que em nada contribuíram para criar. Mas teve da parte de várias forças e entidades políticas (que vão do BE ao PR) curiosas reacções: uns acham que está bem, mas tem que ser melhor comunicado. Outros atiraram-se a ela, desresponsabilizando assim os seus vassalos nacionais.
No mesmo dia em que os trabalhadores portugueses respondiam à chamada da CGTP-IN para a realização de um dia nacional de luta “Aumentar salários | Garantir direitos | Contra o aumento do custo e vida – Pelo direito à saúde e à habitação”, Lagarde anuncia que as taxas de juro do BCE vão continuar a subir, sendo a próxima subida já em Julho.
Terminou aliás nesse dia, 28 de junho, o encontro Fórum BCE, que se realizou em Portugal, supostamente para determinar as grandes causas da inflação e as respostas adequadas, juntando governadores dos bancos centrais (que é como quem diz, funcionários administrativos do BCE), decisores políticos (que é como quem diz governantes eleitos pelos povos mas ao serviço dos grandes grupos económicos) e “especialistas” no assunto.
Lagarde, não apenas veio, durante a sua visita, insultar o povo português, como veio anunciar novos aumentos das taxas de juro para Julho, castigando os mesmos de sempre por problemas que em nada contribuíram para criar. Lagarde aproveitou para dizer que a culpa da inflação é dos trabalhadores, que pretendem salários a crescer acima da produtividade e remeteu para o nível de aconselhamento às empresas o controlo sobre as margens de lucro, como se não existissem formas de combater a especulação, o monopolismo e a apropriação de lucros acima da capacidade que a economia tem de os suportar. No que toca aos salários, a UE e os sucessivos governos em Portugal não hesitam em tomar todas as medidas para a sua desvalorização; mas quando se fala dos lucros dos grupos económicos, UE e governos limitam-se a apelar à contenção.
Apelo esse que não será certamente mais do que uma operação de comunicação, para não ferir as susceptibilidades daqueles que já não têm salário para assegurar os mínimos de existência, apesar de continuarem a trabalhar e de trabalharem cada vez mais. Aliás, o Presidente da República veio dizer precisamente isso: que o BCE e os governadores devem ter cuidado com a forma como comunicam os aumentos das taxas de juro para não gerar insatisfação. Do alto da sua habitual cagança, o professor comentador presidente, vem fingir-se preocupado com o assunto, mas nem assim disfarça o conteúdo do que diz, que pode no essencial ser assim traduzido: “aumentem as taxas de juro à vontade mas vejam lá como o comunicam às pessoas”, um apelo a uma espécie de vaselina comunicacional.
O BE também veio aproveitar para meter a colher e surfar a onda do dia. Não interessa que isso desculpabilize o governo PS, bem como os restantes partidos que aqui alinham pela mesma bitola (PSD, IL, Ch) e que isso coloque a responsabilidade política numa instituição à porta da qual os portugueses jamais conseguirão fazer uma manifestação (o BCE tem sede em Frankfurt), não interessa que isso até pudesse ser utilizado pelo governo, PSD, Ch e IL, para ensaiar divergências e para criar um tipo de “esprit de corps” que a todos os culpados nacionais aproveitaria.
Há responsáveis pela atual agressão aos trabalhadores e pela “austeridade-pela-inflação” mas Lagarde é só o rosto gélido dessa agressão. Aqui, bem mais perto do que pensamos e bem mais perto do que nos dizem, estão os responsáveis que devem responder ao povo português.
Bem pode António Costa encenar uma discordância com Lagarde, vir dizer que os culpados pela inflação são as grandes empresas e os seus “lucros extraordinários” enquanto manifesta apoio às medidas da União Europeia e do BCE no que toca ao aumento das taxas de juro que recaem sobre os trabalhadores e suas famílias e que ameaçam a vida e o dia-a-dia de milhões, enquanto subscreve e participa no processo longínquo de submissão e destruição da soberania económica, financeira e monetária do país.
Essa encenação de Costa não visa confrontar Lagarde porque em momento algum Costa se disponibilizou para conter esses lucros extraordinários de que agora fala. Aliás, tivessem os salários subido na mesma medida que os lucros de muitas empresas (nas que nem podemos incluir o crescimento de 75% dos lucros da banca em 2022), atingindo crescimentos de mais de 9% nas margens de lucro, então também os trabalhadores teriam condições para fazer frente à inflação galopante e duradoura.
Mas o Costa que nos disse que a inflação era passageira, e que por isso não se deviam subir salários, é o mesmo que agora nos atira areia para os olhos, num “agarrem-me senão vou-me a eles” contra o BCE. Fá-lo porque sabe que essa é uma forma de nos atrasar a irmo-nos a ele.
Esta arquitetura da União Europeia mostra bem que o governo da colónia faz parte do império.
A inflação, entretanto, imune aos encontros dos especialistas e do BCE, imune aos debates fingidos nos parlamentos e nas tvs, prossegue e o BCE assegura que reflete sobre os trabalhadores os seus custos. Depois de, durante a pandemia terem sido emitidos mais euros e dólares do que em qualquer outro período histórico com a mesma duração, depois de esses milhares de milhões de euros e dólares se terem concentrado nas mãos de um punhado de grandes grupos económicos e bilionários, eis que os custos dessa concentração de riqueza têm de ser pagos e eis que o BCE, a UE e o governo PS de maioria absoluta asseguram que quem os paga, adivinha, és outra vez tu.
Fonte: https://manifesto74.pt/o-governo-da-colonia-faz-parte-do-imperio/#more-8661
Publicado em O Diário.info
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