Hoje inicia-se na Assembleia da República a discussão na generalidade da proposta de Orçamento do Estado para 2024.
Paula Santos* | Diário de Notícias | opinião
A apresentação do Orçamento do Estado para 2024 foi acompanhada por uma enorme operação de propaganda, que procura iludir as pessoas com o que a proposta não é, para esconder o que verdadeiramente é. Pretendem esconder que é um orçamento que não trará melhores condições de vida aos trabalhadores e aos reformados, mas introduz novas benesses, que se somam às já existentes, para os grupos económicos e as multinacionais. Tal como pretendem esconder que é um orçamento que agrava as desigualdades e as injustiças.
Não há uma efetiva valorização do poder de compra dos trabalhadores e dos reformados. A atualização salarial prevista num valor médio de 3% para os trabalhadores da Administração Pública não permite recuperar o poder de compra perdido durante mais de uma década de salários congelados. E quanto às pensões, a atualização prevista fica aquém do que é necessário. Aumento dos salários em 15%, no mínimo de 150 euros, do salário mínimo nacional em 910 euros no início do ano, com a perspetiva de alcançar 1000 euros durante o ano de 2024 e aumento das pensões em 7,5% no mínimo de 70 euros, é o que se impõe.
O Governo fala em mais rendimentos (e não em mais salários) por via da redução do IRS, quando quase metade dos trabalhadores estão isentos de IRS. Estes trabalhadores que não pagam IRS, mas pagam, por exemplo IVA, o que teria impacto seria a redução do IVA da eletricidade e do gás para 6% e das telecomunicações para 13%, mas sobre isto nada consta no Orçamento
Na apresentação de cada orçamento é feita referência ao reforço do investimento público. Este ano não foi exceção, tendo sido afirmado que seria um orçamento que promove o investimento. Mas aquilo que se tem constatado é que, para além do investimento público ser insuficiente e de diversos projetos transitarem ano após ano, o que foi previsto nem sequer é concretizado. Em 2022 ficaram por executar 1400 milhões de euros e em 2023 estão por executar 1200 milhões de euros. Não basta dizer que se vai fazer, é mesmo preciso concretizar os investimentos na área da Saúde, da Educação, da Habitação, dos Transportes, das infraestruturas, entre outros.
O desinvestimento, a fusão e concentração de serviços e encerramento de outros, a par da falta de trabalhadores, que continuará a não ser ultrapassada em 2024 (a variação das verbas das despesas com pessoal em 6,2%, se tivermos em conta o que o Governo prevê de atualizações salariais e progressões, significa que não haverá reforço do número de trabalhadores na Administração pública), levou à fragilização e à perda de capacidade da Administração Pública. Deste modo não haverá reforço dos serviços públicos. É bem revelador das opções do Governo, que perante a falta de profissionais de Saúde e de professores, por exemplo, não conste uma única medida no orçamento para travar este problema, designadamente de valorização de carreiras, de remunerações e de garantia de condições de trabalho.
Contrariamente ao que é afirmado, este é um orçamento que compromete o futuro. Ao não resolver os problemas agora, só contribui para o seu agravamento no presente e no futuro. Há recursos que podem e devem ser canalizados para a valorização dos salários e das pensões, para o SNS, a escola pública, para garantir o direito à habitação, mas o Governo opta por mobilizá-los para a acelerada redução do défice e da dívida, para o excedente orçamental e para mais benefícios fiscais e privilégios para o capital, o patronato, os especuladores, contribuindo para a acumulação dos seus lucros, enquanto os trabalhadores, os reformados e os jovens passam cada vez mais dificuldades.
Na verdade, o Governo quer esconder que é um orçamento que limita salários e pensões, que não promove o investimento e prossegue a degradação dos serviços públicos, que não garante o direito à habitação e, sobretudo, quer esconder que é um orçamento que favorece os interesses dos grupos económicos, aqueles que têm ganho milhões à custa dos trabalhadores e dos reformados. Quer fazer que faz, para esconder que é um orçamento que não resolve os problemas prementes que afetam o povo e o país, como os agrava.
No debate de hoje e de amanhã, daremos combate a estas opções e no âmbito da discussão que prossegue não deixaremos de intervir com soluções concretas, demonstrando que é possível e necessário um caminho alternativo, em defesa dos interesses do povo e do país.
* Presidente da bancada parlamentar do PCP
Cartoon: Ricardo Trindade
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