Artur Queiroz*, Luanda
Os oráculos dizem que futebol é o desporto das multidões. Um exagero que só mesmo os fanáticos de 11 contra 11 atrás de uma bola perdoam. O Desportivo do Negage era o maior clube do mundo e tinha um time que mandava ventarolas. O Santiago, nosso guarda-redes, defendia só com uma manápula para desmoralizar os adversários. Quando envelheceu foi substituído pelo Lindinho, que voava de um ao outro poste da baliza. Parecia um pombo verde em voo rasante por cima da massambala. O Barros fazia cinema dentro do campo. Uma finta e o adversário de joelhos. O Faria marcava golos de costas, de lado, de olhos fechados. Tratava a boa por tu. Pelos Manos Rocha ninguém passava. Muralhas intransponíveis.
O futebol tem uma teoria abundantemente comprovada. O resultado de um jogo é sempre imprevisível. Só no fim do jogo se sabe se há vitória, empate ou derrota. Excepto nos jogos do Recreativo do Uíge porque o Ferreira Lima e o Miguel de Almeida eram os patrões dos árbitros. No Negage também abrimos uma excepção. Os jogos contra o recreativo do Songo acabavam sempre em vitória do Desportivo e nunca por menos de dez a zero.
Um dia o senhor árbitro que veio do Uíge sentiu-se mal e saiu do campo. Já ganhávamos por três a zero. Foi substituído pelo grande Gorila, mecânico afamado. Ele sabia pouco de futebol mas imitava com a boca o apito dos árbitros. Saltou para o campo e aconteceu impossível. O Rocha recebeu a bola no peito, a meio campo. O Gorila apitou. Pegou na bola e correu para a marca de penalti. Gatuno! Gatuno! Gatuno! Os do Songo falharam a grande penalidade. O Barros fintou dez adversários, o guarda-redes e marcou. O Gorila anulou o golo por fora de jogo. O Gorila marcou 18 penaltis contra o Negage mas os do Songo só conseguiram converter quatro. O Desportivo marcou mais 15 golos mas foram todos anulados. E pela primeira vez na História da Humanidade o Songo ganhou ao Negage. Resultado final: 4-3.
O árbitro foi tão xingado, tão abandalhado que durante uma semana não abriu a oficina, ali no cruzamento da picada para o Dambi e o Bungo. Seus merdas! Arranjem um mecânico para reparar as carrinhas! Mas ele era único. Em frente havia outra oficina mas era de ferreiro. Uma comissão de forças vivas foi implorar ao Gorila que reabrisse a oficina. As carrinhas e camionetas eram velhas e estavam sempre a avariar.
Um dia perguntei ao Gorila por que razão pôs o Songo a ganhar-nos. E ele foi directo ao assunto: Um homem que não se põe ao lado dos mais fracos é abaixo de mabeco faminto e tinhoso!
O médico proibiu-me de ver jogos de futebol durante uma semana. A emoção é muito grande. Perguntei-lhe se podia assistir hoje ao Angola-Nigéria. Depois só volto a ver futebol, no próximo Mundial. Nem pensar. Emoções fortes fazem mal às artérias coronárias. Daqui a nada começa o grande jogo e eu vou ler.
O Jornalismo Angolano está derrotado. Ando há anos avisando que os crimes por abuso de liberdade de imprensa são em primeiro lugar crimes contra os jornalistas e o Jornalismo. Ninguém quer ouvir-me. Agora estão aos gritos porque a Lei de Segurança Interna é especialmente dura para com os criminosos que actuam nos Media e particularmente nas redes sociais, com a mais preocupante das impunidades. Pensavam que a repetição permanente tornava esses crimes inócuos. Rotundo engano.
A Lei até permite às autoridades cortarem a Internet aos criminosos. Aos que fazem da difamação, da mentira, da manipulação e da desinformação um modo de vida. O controlo dos Media, a censura, a manipulação, a mentira são armas ao serviço do estado terrorista mais perigoso do mundo e seus sócios, sobretudo os da União Europeia. Esse festim tem que acabar. Em Angola, vai acabar. Já não era sem tempo. O Chefe Miala encarta o estojo e vai para Kinkuzu procurar os corpos dos comandantes e políticos da FNLA assassinados. Depois abraça as ossadas e elas perdoam-lhe.
Um exemplo que até o presidente
do Sindicato dos Jornalistas percebe. O Club K publicou um texto onde se afirma
que a Lei da Segurança Interna restaura a pena de morte
Por razões óbvias, o ocidente alargado assenta a ordem jurídica no Direito Romano e no Direito Germânico. É com eles. Essa cultura é deles. O modelo é deles. Mas em África já existia Direito antes de nascerem os Estados europeus. Até antes do Feudalismo.
O Reino do Congo tinha normas que garantiam harmonia social, a paz e o bem estar colectivo. Existia o conceito de Justiça Social. Mas ninguém entre nós estuda essas normas. No século XVI chegaram as primeiras máquinas impressoras a África, pela mão dos missionários portugueses, que as instalaram nos seus colégios da Ordem dos Jesuítas, em Luanda e S. Salvador do Congo (Mbanza Kongo).
O crime de difamação (Luzembu) era reprimido no Reino do Congo. O difamador (Umbiki) era exposto ante a comunidade. O Direito à Inviolabilidade Pessoal já existia na ordem jurídica interna. O “manicongo” apostou tudo na Educação. Mas também na paz social. O lado messiânico do Nacionalismo Angolano, como arma de luta contra a ocupação estrangeira, nasceu nas escolas e templos do Reino do Congo. Sabemos pouco desta época. Conhecemos pouco desse passado grandioso. Mas um dia se saberá. Há sempre alguém que escava nas brumas, nos pântanos, sacode a poeira e mostra a História em todo o seu esplendor.
A Lei da Segurança Interna é a resposta esperada (até vem tarde…) aos abusos da liberdade de imprensa constantes. Às difamações através dos Media. Às mentiras que matam e até põem em causa a Soberania Nacional. A União Europeia censura os Media e os jornalistas da Federação Russa “por razões de segurança”. Prenderam Julien Assange há anos e continua preso sem direito a julgamento “por razões de segurança”. Aí está a resposta do Estado Angolano na Lei da Segurança Nacional, aprovada na Assembleia Nacional. Por agora na generalidade.
Se daqui a 90 minutos Angola tiver derrotado a Nigéria, vou ser mesmo muito indisciplinado e lubrificar as artérias coronárias com um tinto de baixa categoria porque o orçamento não dá para mais.
* Jornalista
Sem comentários:
Enviar um comentário