Artur Queiroz*, Luanda
O insigne escritor Eurico Tiago publicou um livro intitulado “Vigarices & Sacanices” dedicado ao senhor Mário Soares. A obra foi editada pela Centelha (Coimbra) e teve muito sucesso porque o autor ofereceu aos leitores um manual de instruções, muito útil para quem quiser enveredar pela carreira de vigarista.
Um dos vigaristas mais importantes, glorificado no livro, vendeu duas vezes a Torre Eiffel, de Paris. Primeiro a um milionário norte-americano instalado no Hotel George V, ali entre Opera e Palais Royal. A segunda venda foi a um sucateiro de Ville Juif, que ficou falido depois do negócio. Teve de se dedicar à droga e à prostituição para continuar a acreditar em Jeová.
Outros vigaristas de categoria
mundial e seus feitos constam nas páginas da obra. Entre eles, o Conde Saint
Germain, que transformava metal ordinário
O escritor Eurico Tiago vai fazer uma segunda edição da celebrada obra, revista e aumentada. Promete grande audiência o leilão electrónico para a venda de 39 hotéis das redes IU,IKA e BINA, pertencentes à AAA ACTIVOS LDA. O Executivo (Ministério das Finanças) chama a esta vigarice uma “privatização”.
Acontece que os hotéis são propriedade da empresa de Direito Angolano AAA ACTIVOS LDA. O Estado não é o dono das propriedades à venda em leilão electrónico. Por isso, não pode vender o que é propriedade privada. Se o fizer, a operação vai imediatamente para as páginas do livro “Vigarices & Sacanices, obra dedicada a Mário Soares, mas nesta edição a dedicatória abrange o Presidente João Manuel Gonçalves Lourenço, por tudo o que tem dado à causa das vigarices.
A vigarice deste “leilão electrónico” é mais ousada do que aquela do escroque que vendeu a Torre Eiffel duas vezes. Porque a AAA ACTIVOS LDA não fez parte de nenhum processo judicial. Logo, os bens não entram na lista da “recuperação de activos”.
A empresa nunca foi ouvida pelas autoridades e não pôde contradizer em nenhuma fase do processo judicial. A sentença não foi notificada e não é aplicável à AAA ACTIVOS LDA como parte terceira. Se a Dona Vera conseguir vender os hotéis no leilão electrónica, a sua façanha fica nos anais das Vigarices e Sacanices universais.
Um esclarecimento importante para os mentores do leilão electrónico de venda dos hotéis que têm dono e esse dono não é o Estado Angolano: O processo nº 827-21-B contra Carlos São Vicente é nulo, ilegal e inconstitucional, como consequência de inúmeras violações e abusos da Lei Angolana, da Constituição da República mas também do Direito internacional.
A Opinião 63-2023 do Grupo de Trabalho Sobre Detenções Arbitrárias, das Nações Unidas, tornada pública há poucos dias, deve ser respeitada. E executadas as suas recomendações.
Por muito que queiram fingir que nada existe, que está tudo bem e João Lourenço continua a ser o campeão da paz em África, sobretudo no Leste da República Democrática do Congo e no Sudão, a ONU foi muito clara. A prisão do empresário angolano Carlos São Vicente é arbitrária e o seu julgamento está repleto de ilegalidades. Quem se sente bem num país onde se prendem cidadãos arbitrariamente, também aceita que o Estado venda como seu aquilo que pertence a uma empresa privada.
Quem te avisa teu amigo é. O Executivo deve cancelar o anunciado leilão electrónico e devolver os hotéis à AAA ACTIVOS LDA como primeiro passo para cumprir as recomendações (a bem) do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Quem vende cabritos e cabras não tem, é ladrão ou vigarista. Quem vende propriedades que têm dono, no mínimo, tem um lugar garantido no livro “Vigarices & Sacanices”.
Aos que adoram enriquecer sem mexerem um dedo, sem derramarem uma gota de suor, deixo um aviso em forma de serviço público: O leilão electrónico para venda dos hotéis da empresa AAA ACTIVOS LDA não é válido nem legal. Depois não digam que não vos avisei.
*Jornalista
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