terça-feira, 5 de julho de 2011

PORTUGAL E A “NEUTRALIDADE” DOS DESTINOS DAS VISITAS OFICIAIS




PAULO GORJÃO* - i Online

Moçambique será o destino da primeira visita oficial do primeiro-ministro, mas é um erro desvalorizar a sua importância no contexto internacional

Há duas semanas referi neste espaço que "o novo governo português tem de marcar rapidamente a primeira cimeira bilateral regular entre Portugal e Moçambique, acordada em 2010, mas ainda sem data marcada devido à demissão de José Sócrates, em Fevereiro. José Sócrates e Luís Amado deram um novo impulso às relações bilaterais. Pedro Passos Coelho e Paulo Portas não podem desperdiçar a janela de oportunidade para consolidar mais ainda as relações bilaterais".

Ora a edição do "Expresso" desta semana refere que a primeira viagem oficial do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, muito provavelmente será a Moçambique. Como se depreende, caso se confirme, não poderia concordar mais com a escolha do chefe do novo executivo.

Isto dito, a fonte governamental não identificada citada pelo "Expresso" acaba por ser inoportuna quando refere que "é natural que o primeiro-ministro escolha um destino mais neutral" do que Angola. Enquadrar a visita desta forma não só retira peso à opção de Pedro Passos Coelho no sentido de privilegiar Moçambique, como também gera atrito sem qualquer necessidade na relação com Angola.

A escolha de Moçambique enquanto destino da primeira visita oficial de Pedro Passos Coelho vale por si em termos absolutos e não por ser supostamente "mais neutral" que outras eventuais opções diplomáticas. Nos últimos anos Portugal apostou de forma clara no aprofundamento das relações bilaterais com Moçambique e há motivos para depreender que nos próximos tempos a relação diplomática se tornará ainda mais forte.

Comparar Angola com Moçambique, nos termos em que foi feito pela fonte governamental citada pelo "Expresso", é um exercício sem sentido. A escolha de Pedro Passos Coelho, a confirmar-se a notícia, resulta em parte da sua vontade de privilegiar Moçambique, mas também das circunstâncias. Na realidade, tudo está mais ou menos preparado há meses para que o primeiro-ministro de Portugal visite Moçambique e nessa ocasião se institua a realização de cimeiras anuais.

Se as circunstâncias fossem outras, em vez de Moçambique a primeira visita oficial de Pedro Passos Coelho poderia muito bem ser a Angola. Aliás, a partir do momento em que Portugal institua a realização de cimeiras anuais com Moçambique, torna-se inevitável que o mesmo aconteça, assim que possível, em relação a Angola.

A relação de Portugal com Angola é demasiado importante para que fontes governamentais não identificadas cometam gaffes desta natureza.

P.S. Na semana passada, o presidente timorense, José Ramos-Horta, referiu que a compra de dívida portuguesa "é uma operação económica e financeira" do interesse de Timor-Leste.

Sem dúvida que estamos perante uma operação financeira do interesse de Díli, mas o seu alcance é também político, na medida em que reforça os laços de cumplicidade a nível bilateral. São decisões como esta que contrariam a tirania da distância a que aqui fiz referência em Março.

O governo português, por sua vez, tem de dar finalmente início à construção da embaixada de Portugal em Díli. O processo tem vindo a arrastar--se ao longo da última década, sendo já uma arma de arremesso utilizada por quem quer introduzir grãos na engrenagem das relações entre Portugal e Timor-Leste. Manter a actual indefinição não serve o interesse nacional.

*Director do Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança (IPRIS)

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