Foi um referendo que recebeu o apoio da comunidade internacional e do Sudão: a norte e a sul. O balanço é positivo: trata-se do primeiro grande fruto das negociações do Amplo Acordo de Paz do país, de 2005, que pôs fim a 21 anos de guerra. O escrutínio teve o apoio do presidente sudanês; recorde-se que Omar al-Bashir recebeu um mandado de captura do tribunal penal internacional, indiciado de crimes de guerra e contra a humanidade no Darfur.
Aly Verjee, conselheiro político do comité de observadores eleitorais da União Europeia, vê no apoio de al-Bashir uma expressão de boas-vindas inevitável à independência do sul do Sudão. Mas destaca: “Para 99% das pessoas, o referendo foi a expressão livre do que realmente queriam. Mas o SPLM, o partido do sul do Sudão, decidiu que 100% dos eleitores deviam participar, o que levou as autoridades a obrigar as pessoas a votar. Isso não muda o resultado, mas forçar o voto é um sinal negativo. É uma pena.”
Verjee falou ainda das semelhanças entre o referendo sudanês e o de Timor Leste, em 1999. Ambos determinaram se o povo queria fazer parte de um país maior. O conselheiro político diz que nos dois casos ambas as eleições foram um sucesso, com apoio internacional, e o voto não pôs fim ao processo. Para Verjee, os resultados foram muito significativos, mas 10 anos depois ainda há muitos desafios para os timorenses e acredita ainda que no Sul do Sudão a situação vai ser semelhante.
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Apesar da população ter expetativas muito altas, é preciso tempo para resolver vários problemas, como a delineação de fronteiras, a partilha de água e petróleo, o regresso de refugiados, a corrupção, a moeda, os conflitos tribais e, naturalmente, o Darfur – onde cerca de metade do território é inacessível à ONU.
Douglas Johnson trabalhou para o governo sudanês como investigador ao abrigo do Acordo de Paz do Sudão. Para ele tornou-se evidente que o partido no poder NCP e o SPLM têm visões diferentes sobre o país – nunca chegaram a acordo sobre um Sudão unido. Johnson diz que “Os problemas gerados pela fronteira, pelo petróleo e especialmente por Abyei fizeram o SPLM perceber que era melhor apoiar a independência do sul do que trabalhar com o NCP.”
Douglas Johnson lembra que a crise no vizinho Egito é diferente da Sudanesa: “Os egípcios sentiram que já não tinham nada a perder, por isso saíram à rua. Além disso, a lealdade dos serviços de segurança foi quebrada na Tunísia e no Egito.” Para o investigador ainda não se viu em Cartum uma população que sinta que não tem nada a perder nem sabe qual é o estado dos órgãos de segurança sudaneses.”
O Sudão enfrenta uma década difícil, mas se não houver regresso à guerra, a população pode viver melhor. De acordo com os especialistas, apesar de o norte do Sudão ser para sempre o seu vizinho mais importante, o sul deve aproveitar o que tem de bom: a língua árabe, a agricultura e, principalmente, a esperança.
Autor: Débora Miranda - Revisão: Nádia Issufo/Marta Barroso
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