Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
A RTP chamou-lhe "Reencontro" entre portugueses e angolanos. Lá estiveram, entre outros, Abraão Gourgel, Miguel Relvas, Albina Assis ou Zeinal Bava.
Foi, ao contrário do que disse Fátima Campos Ferreira (que tinha como convidado o ministro que a tutela e na assistência o presidente da RTP), não um encontro de portugueses e angolanos mas, antes, um encontro entre os donos dos dois países.
70% dos angolanos deveriam estar nessa altura à procura de comida nos caixotes do lixo do hotel Sana em Luanda. Mas o frete foi feito e, se calhar, ainda um dia destes a jornalista vai receber uma comenda do governo de Lisboa ou do MPLA, eventualmente dos dois.
Segundo escreve Mayra Prata Fernandes, no Sapo Notícias Angola, Fátima Campos Ferreira indagou os seus convidados sem reservas. Devo ter visto outro programa. Exceptuando uma ou outra questão mais jornalística, a RTP nada mais fez (incluindo as imagens que ia passando) do que uma acção de propaganda ao regime.
Quanto à questão da corrupção, a única questão válida embora colocada a medo, o ministro de economia de Angola, Abraão Gourgel, calou a jornalista da RTP ao lembrar-lhe que essa situação não é exclusiva de Angola.
Quanto ao resto, tudo como esperado. Digamos que, seguindo este exemplo da RTP, se a TPA fosse a Portugal fazer uma reportagem sobre o parque automóvel, apresentaria certamente imagens de uma concentração de Ferraris. Ou, se fosse abordar o parque habitacional, apresentaria imagens da casa de Duarte Lima no Algarve.
Por falta de tempo, o programa da RTP nada disse sobre o facto de 68% dos angolanos serem afectados pela pobreza, de a taxa de mortalidade infantil ser a terceira mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças.
Ou ainda sobre o facto de: Apenas 38% da população tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico;
- Apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade;
- 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos;
- A taxa de analfabetos é bastante elevada, especialmente entre as mulheres, uma situação é agravada pelo grande número de crianças e jovens que todos os anos ficam fora do sistema de ensino;
- 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos;
- A dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos;
- 80% do Produto Interno Bruto angolano é produzido por estrangeiros; que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população; que 70% das exportações angolanas de petróleo tem origem na sua colónia de Cabinda;
- O acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.
- O presidente do país, José Eduardo dos Santos, está há 32 anos no poder sem nunca ter sido eleito.
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: E ENTÃO QUANDO É QUE CHEGA A MINHA VEZ?
Sem comentários:
Enviar um comentário