Manuel António Pina – Jornal de Notícias, opinião
Parece que o Ministério Público abriu, após queixa de um "grupo de cidadãos", um inquérito às declarações de Otelo, que, em entrevista à Lusa, terá dito: "Para mim, a manifestação dos militares deve ser, ultrapassados os limites, fazer uma operação militar e derrubar o Governo".
Não disse contudo que os "limites" tenham sido ultrapassados neste momento mas, sim, em 1974: "Esse limite foi ultrapassado em 1974 e culminou com a "Revolução dos Cravos".
Otelo é, como se sabe, um criminoso. Cometeu um imperdoável crime na madrugada de 25 de Abril de 1974, que hoje seria punido com 5 a 15 anos de prisão. O MP não abriu, porém, qualquer inquérito. Talvez, que sei eu?, porque não tenha sabido ou nenhum "grupo de cidadãos", dos muitos que não gostaram da coisa, se tenha queixado.
Agora, que os tempos vão de feição, já apareceu quem se queixasse. Tudo indica que dando as declarações de Otelo como "instigação pública a um crime", punida pelo artº 297º do Código Penal, se não pelo 326º. Estranho é que o MP, vinculado pelo seu Estatuto, "a critérios de legalidade e objectividade" e não de conveniência política, não tenha também aberto um inquérito às declarações de Belmiro de Azevedo segundo as quais "quando o povo tem fome, tem o direito de roubar", puníveis, com muito menos boa (ou má) vontade, pelo mesmo artº 297º e em que a acção penal não depende sequer de queixa. Mistérios públicos do Ministério Público...
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