segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Portugal: Comissão para Emprego Jovem vista como "propaganda pura e dura"




Carlos Santos Neves – RTP, com foto de Miguel A. Lopes, Lusa

“Propaganda pura e dura” é aquilo que a CGTP encontra na agenda atribuída pelo Governo de Pedro Passos Coelho à Comissão Interministerial de Criação de Emprego e Formação Jovem, a operar sob a tutela do ministro dos Assuntos Parlamentares. O secretário-geral da Intersindical, Arménio Carlos, saiu hoje de uma reunião com Miguel Relvas a acusar o Executivo de “tentar iludir a opinião pública” e a insistir que é preciso rasgar o último acordo de concertação social. A UGT, que subscreveu o pacto tripartido, concluiu que, embora positiva, a iniciativa destinada aos jovens “não resolve o problema”. Uma posição que encontrou eco entre o patronato.

Números recentes do Instituto Nacional de Estatística mostram que a taxa de desemprego entre os jovens dos 15 aos 24 anos ascendia, no final do ano passado, aos 35,4 por cento. O que correspondia a 156 mil jovens sem trabalho
Na última quarta-feira, o Governo anunciava a formação de uma Comissão Interministerial com o objetivo declarado de “apresentar medidas concretas para combater o desemprego jovem” – coordenada pelo ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, a estrutura inclui 12 secretários de Estado.

Miguel Relvas marcou para esta segunda-feira uma primeira auscultação aos parceiros sociais. À saída do encontro com o governante, o secretário-geral da CGTP arrasou a iniciativa do Executivo, avaliando-a como “uma manobra de propaganda pura e dura”. E lamentou que o Governo não tenha apresentado “nem uma medida concreta” para enfrentar a ausência de oportunidades de trabalho para os jovens.

“Aquilo que o senhor ministro está aqui a fazer é praticamente a procurar iludir a opinião pública para dar ideia de que está preocupado com o desemprego juvenil, quando na prática todas as políticas económicas que estão a ser seguidas não só não criam emprego como destroem emprego”, censurou Arménio Carlos.

Retomando os argumentos que levaram a Intersindical a marcar nova greve geral para 22 de março, o sucessor de Carvalho da Silva desafiou o Governo a deixar cair o acordo laboral assinado com os representantes dos patrões e a UGT: “Porque esse acordo é o tal que nega o crescimento, que destrói o emprego”.

“Três públicos-alvo”

Para a CGTP, a promoção do emprego entre os jovens passa por “alterar” as atuais “políticas económicas”, de forma a “promover o crescimento”. Mas também por “renegociar a dívida do ponto de vista dos juros, dos prazos e dos montantes e de prolongar o período de redução do défice, para que o Estado esteja em condições de promover investimento público para dinamizar a economia”.

Já a UGT admite que a Comissão agora criada “poderá atenuar fortemente o desemprego dos jovens, se for uma medida bem conduzida”. Todavia, concluiu João Proença após a reunião com Miguel Relvas, “não resolve o problema”.

O secretário-geral da UGT sugere que o Governo privilegie “três públicos-alvo”, a começar pelos “jovens com abandono escolar e sem escolaridade obrigatória, para os quais tem de haver medidas de dupla certificação”. Seguem-se “aqueles que não têm qualificação profissional mas têm escolaridade obrigatória”, para os quais a central sindical sugere “uma medida de qualificação profissional”, e os jovens que “ já têm habilitações”. Para estes, João Proença advogou uma aposta no “programa de estágios, orientado para promover a integração de quadros nas PME” e em “programas orientados para a reclassificação a nível universitário de licenciaturas com difícil empregabilidade”.

Ainda de acordo com o dirigente da UGT, o Governo estará a propor uma melhor distribuição de verbas comunitárias. Desde logo do Fundo Social Europeu, num montante de cerca de 1,6 milhões de euros.

Entre as estruturas do patronato, João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), falou também de “uma proposta positiva” que, no entanto, “por si só não cria emprego”.

“Da nossa parte há duas ou três áreas que nós vamos explorar com propostas. Uma é a articulação dos estágios com a posterior contratação nas empresas, é uma área onde nós vamos propor medidas. E uma segunda é na área do empreendedorismo, porque numa altura de crise como esta, em que a economia não cresce e o desemprego é grande, o empreendedorismo, a iniciativa, com o apoio de crédito da banca, eventualmente microcrédito, é uma das poucas áreas em relação às quais podemos criar emprego, em particular no setor dos serviços, que é um setor que não exige grandes investimentos, de uma maneira geral”, resumiu o responsável aos jornalistas.

“Bomba-relógio social”

Ouvido pela Antena 1, o especialista em políticas laborais António Dornelas considerou hoje que os elevados níveis de desemprego entre os jovens constituem “uma autêntica bomba-relógio social”.

“Não é imaginável que seja possível manter uma percentagem tão alta da população fora do mercado de trabalho, sem rendimentos e sem as formas de socialização que estão associadas ao emprego, sem profundíssimas consequências sociais”, advertiu o professor do ISCTE.

“As consequências são, em regra, de dois tipos: ou o protesto, ou então uma coisa que a meu ver ainda é pior do que o protesto, a que os sociólogos chamam anomia, isto é, comportamento de desconformidade com as normas sociais. A desesperança não leva sempre à revolta. Leva às vezes à recusa das regras que estruturam as nossas sociedades”, acrescentou.

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