Diário de Notícias, opinião
A suspensão da tolerância de ponto no Carnaval, decretada sexta-feira à noite pelo primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, não oferece muitas dúvidas. O momento e a forma como ela foi decretada, contudo, suscita muitas e justificadas interrogações.
Perante as medidas de austeridade que se sucedem, e que incluem o corte de quatro feriados (dois civis e dois religiosos) e o fim da benesse por assiduidade de mais três dias de férias, seria muito difícil justificar a manutenção de uma "folga" extra num dia que oficialmente não é de paragem. De todos os chamados direitos adquiridos que têm vindo a ser suprimidos, subsídios de Natal e de férias incluídos, a tradicional tolerância na Terça-feira Gorda é claramente a mais compreensível. Mesmo que este dia a mais de trabalho na função pública não tenha significado de maior para o País em termos de produtividade, não seria coerente face a tudo o resto a sua manutenção.
Ora, perante estas constatações, não se percebe porque demorou tanto o primeiro-ministro a oficializar algo que deveria ter feito parte da discussão desde o início. Mesmo não se tratando de um feriado oficial, poderia ter ficado claro logo, aquando do anúncio inicial das primeiras medidas de austeridade e depois na discussão em sede de Concertação, que esta era mais uma tradição a que crise que vivemos iria pôr fim.
Se o tivesse dito no devido tempo, quando começou a discutir-se a supressão de feriados e o corte nos "outros feriados" - um mês depois tomar posse -, Passos Coelho teria evitado muitas das críticas de que agora é alvo e diminuído a contestação que vai ouvir nas próximas semanas. Ao fazê-lo agora, a apenas duas semanas na data, legitima os protestos. E, pior, cria enormes dúvidas e confusão. Por um lado, muitas câmaras darão folga aos seus funcionários e outras não, criando desde logo diferenciação dentro da própria administração local e um fosso para a restante administração pública. Por outro, muitos serviços, como a saúde e a justiça, não marcaram nada para esse dia, e agora que se veem obrigados a abrir ficarão esvaziados.
O primeiro-ministro mostrou-se convicto da sua decisão, que acontece pela segunda vez no período democrático em Portugal. Fê-lo sabendo que a mesma medida, quando Cavaco pôs fim à tolerância no Carnaval no período recessivo de 93, valeu ao atual Presidente o fim do estado de graça e, diz-se, a queda do poder. Acertou na intenção, mas falhou no timing. No futebol, este tipo de situações costumam ser faltas graves e severamente punidas.
Mas que força tem a ONU?
São de vária ordem as consequências do veto da Rússia e da China à resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a Síria. Os militares do regime tê--lo-ão entendido como uma luz verde para continuarem com a carnificina; para a população que, diariamente, enfrenta a morte, é um sinal de abandono da comunidade internacional. Para esta é, como afirmaram vários diplomatas na ONU, uma "vergonha". A decisão de Moscovo e de Pequim tem como base razões geoestratégicas - há que lembrar, por exemplo, que a Rússia tem uma base militar naval na Síria - e até comerciais, nomeadamente no sector do armamento. Mas nenhuma razão pode justificar o abandono da defesa da vida humana, dos direitos humanos, de civis desarmados. A decisão de Pequim e de Moscovo não só paralisou o Conselho de Segurança, ela conseguiu passar a mensagem de que a ONU é irrelevante o que leva muitos a questionar-se sobre a validade da organização.
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