quarta-feira, 25 de julho de 2012

A AMPLA CIDADE



Rui Peralta

A cidade do gelo

Na Gronelândia antes da chegada dos missionários cristãos a pesca e a caça eram a base da sociedade. A colonização abriu as portas a um sistema económico alienígena e introduziu o assalariado. Quando em 1953 a Gronelândia foi convertida numa colonia dinamarquesa, a grande parte das exportações e da vida económica centraram-se na Dinamarca.

Em Novembro de 2008, 75,5% dos seus habitantes votaram num referendo pela via politica que abre o caminho á independência. Desde essa data o governo local assume o controlo das matérias-primas (ouro, diamantes, uranio, gás e petróleo) e o povo inuit busca formas de viabilidade económica e politica que permitam um desenvolvimento sustentável, inserido no espaço social europeu e actuante na economia global. Neste sentido o primeiro passo consiste na diversidade da economia (dominada pela industria pesqueira e pelas exportações para a Dinamarca). A exploração dos recursos minerais, a conservação do meio ambiente, o desenvolvimento da industria têxtil, o retomar do sector das peles (de extrema importância pela tradição da caça), criação de um sistema publico nacional de saúde (aproveitando a experiencia e as infraestruturas dinamarquesas) ampliação e adequação às realidades culturais e necessidades nacionais do sistema publico de educação, desenvolvimento do turismo, aumento das potencialidades exportadoras, uso do gelo e da água, são alguns dos eixos que ocupam a futura centralidade.

Neste cenário futuro os trabalhadores têm um papel fundamental na construção do novo estado. Foram eles que impulsionaram a possibilidade da independência e obrigaram á solução referendária, numa campanha dirigida pela Confederação Nacional de Sindicatos da Gronelândia (SIK) que mobilizou todos os trabalhadores da ilha. Desta forma o SIK conseguiu resolver um duplo problema: a independência do povo inuit e a defesa do meio ambiente, pois com a decisão referendária todos os projectos de sobre- exploração mineira ficaram suspensos até á constituição oficial do novo estado independente.

O SIK, conjuntamente com o Partido Progressista Inuit, os Comités de Libertação do Povo Inuit, o Partido Ecologista Esquerda Verde da Gronelândia e a Plataforma Gronelândia Independente formam a maioria do Gabinete de Transição que prepara o processo de independência. No âmbito sindical o SIK contou com a solidariedade activa dos sindicatos dinamarqueses, suecos e noruegueses, para além de outras organizações sindicais, forças de esquerda e partidos ecologistas da UE e da América Latina.

Ausência

No teu regaço dormia, como escombro, o meu cansaço. No teu ombro (divinal encosto), junto ao teu ouvido, o meu rosto sussurrava um gemido.

Palestina

A USAID está a construir estradas alternativas que se converterão na rede principal de transportes para os palestinianos. O primeiro-ministro Salam Fayyad apresentou as novas estradas, que iriam servir 80% da Cisjordânia, como parte do plano da Autoridade Palestiniana para estabelecer um estado palestiniano e promoveu-as como projectos de desenvolvimento da Palestina. Algumas vozes críticas, como Ingrid Jaradat Gassner, directora do Centro de Recursos para os Refugiados Palestinianos, em Belém, alertaram para o facto de o projecto criar a guetizaçäo dos Palestinianos da Cisjordânia, mas a Autoridade Palestiniana não lhes deu ouvidos e continuou a promover a obra.

O projecto das estradas constitui a ultima de uma série de iniciativas destinadas a desalojar os palestinianos do seu espaço geográfico e histórico, separando-os dos colonatos da Cisjordânia. As novas estradas, que a Autoridade Palestiniana tanto promove, não passam de uma forma segregada de transporte, ajustadas a um vasto projecto colonial de controlo absoluto das movimentações dos cidadãos palestinianos. As estradas passam nos pontos previamente definidos pela ocupação sionista e não por decisão palestiniano. É mais fácil a um Palestiniano de Ramallah visitar uma capital europeia do que ir a Hebron, a uns meros 50 km de distância, mas esse não é o objectivo da obra em curso.

Esta rede de estradas construídas pela USAID são um velho plano de George W. Bush, designado “Rota para a Paz no Próximo Oriente”. É uma rede de estradas alternativas, só para palestinianos (lembram-se do apartheid na África do Sul?), compostas por mais de 48 tuneis e 34 postos de controlo, para além de km de muros. Neste projecto está espelhado a visão dos USA sobre a Palestina: um território fragmentado, para o qual os USA generosamente contribuem para juntar os estilhaços. Israel e a sua segurança acima de tudo. E assim venderam a ideia de uma rede de estradas, “só para Palestinianos”, onde estes são controlados km sim km não pelas autoridades sionistas.

No fundo, a forma arrebatadora como o primeiro-ministro e a Autoridade Palestiniana, falam deste projecto e dos amigos norte-americanos e outros “amigos financiadores” transforma-os em meros sipaios das autoridades coloniais sionistas. A soberania palestiniana não pode ser limitada em nome da segurança das cidades israelitas. Fala-se como se não houvesse ocupação. Mas basta comparar as estradas israelitas, rectas, largas, com serviços aos automobilistas com as estradas alternativas do consórcio USAID / AP, estreitas, serpenteando através dos vales da Cisjordânia, junto às ladeiras das colinas, nada confortáveis para os automobilistas particulares e impraticáveis para o trafego comercial em veículos pesados, para além das interrupções constantes dos postos militares e das inúmeras autorizações de passagem.

Passam estes trajectos por locais históricos da resistência palestiniana, não para avivar a memória dos transeuntes, mas para a soterrar. Nem uma referência aos pontos por onde a estrada passa onde se desenrolaram levantamentos contra a ocupação ou revoltas contra o imperialismo britânico. Apenas a sinalização, o aviso de aproximação a postos de controlo e os cartazes da USAID anunciando: “Oferta do povo dos Estados Unidos da América”.

Ausência

De mim gostavas... Era assim que falavas.

Colômbia

Na Colômbia existem mais de 9 mil e 500 prisioneiros políticos e de guerra. Milhares de homens e mulheres aprisionados por pretenderem construir uma Colômbia de paz e justiça social. Representam cerca de 10% da população prisional. Invisibilizados pelo governo da oligarquia, que nega a sua existência e diz não existirem presos políticos na Colômbia.

O regime oligárquico colombiano caracteriza-se pela forma como utiliza a violência sistemática para manter os interesse oligárquicos vigentes e os estabelecimentos prisionais são uma das expressões da violência estatal. Representam um instrumento de repressão utilizado pela narco-oligarquia contra o povo trabalhador e contra todos aqueles que desejam uma Colômbia diferente. As superlotadas prisões colombianas são lugares monstruosos onde tentam anular e destruir o opositor político. Os serviços de saúde mínimos são negados, como forma de tortura, a incomunicabilidade é regra e a correspondência é revista e na maior parte dos casos não chega aos presos. Os livros são negados, assim como qualquer material que sirva para o prisioneiro escrever ou estudar. Em muitos casos aplica-se a tortura directa e a pressão sobre as famílias dos prisioneiros. Os presos políticos apesar das sevícias e de serem constantemente mudados de estabelecimento prisional criaram uma organização a que denominaram ´´Presos Políticos e de Guerra`` (PPG) para promover a organização dos prisioneiros políticos no interior das prisões e estabelecer pontos de contacto com o exterior dos estabelecimentos prisionais, para alem de assegurar uma rede de protecção aos familiares directos dos prisioneiros.

Contrasta enormemente a situação dos prisioneiros mal alimentados e sujeitos a um tratamento desumano nas celas do regime, com os prisioneiros do regime que estão nas mãos das Forças Armadas Revolucionarias da Colômbia – Exército Popular. Estes não são sujeitos a torturas nem a um tratamento desumano durante o tempo que estão aprisionados. As FARC-EP sempre deram mostras suficientes e inequívocas do tratamento humano dado aos prisioneiros de guerra. É uma forma de expressar a sua vontade de paz, tal como as sucessivas libertações unilaterais de prisioneiros, encetadas pelas FARC-EP. Nos últimos anos foram libertados congressistas, conselheiros, políticos, deputados, governadores, ex-senadores, militares e polícias. Em Abril de 1998, durante o governo de Samper, as FARC-EP libertaram unilateralmente 70 militares e durante as conversações de Caguan, foram entregues ao governo de Andrés Pastrana 302 polícias e militares, sem qualquer gesto reciproco por parte do governo colombiano. São muito os exemplos como o do polícia Estiven Giraldo, ferido e capturado em combate, que foi devidamente tratado pelas FARC-EP, com todas as atenções médicas possíveis á guerrilha e posteriormente entregue às autoridades governamentais em Tambo Cauca, para internamento, em Janeiro deste ano.

Mas a oligarquia sempre responde com ódio e mentira ás propostas de paz apresentadas pelas forças populares. Recusou a proposta de instaurar uma Comissão de Verificação dos Direitos Humanos nas Prisões colombianas, entregue pela PPG e acusou os proponentes de serem um bando de terroristas, que pretende instaurar o caos no sistema prisional colombiano.

Ao povo colombiano só resta o caminho da luta diária, nas cidades e nos campos, nas escolas, nas fábricas e nas quintas e fazendas dos grandes senhores, por uma sociedade digna, definitivamente liberta da narco-oligarquia.

India

Na India as sementes são agora propriedade das empresas privadas, que as comercializam, o que tem afectado a diversidade de sementes, pois por questões relacionadas com os processos de comercialização e interesses comerciais, nem todas as diversidades de sementes são comercializadas e algumas atingem preços demasiado elevados. A cientista, filósofa e activista Vandana Shiva iniciou uma campanha mundial para informação dos cidadãos globais da actual precariedade provocada pelo comércio de sementes e as formas como isso afecta a segurança alimentar mundial.

Vandana Shiva e outros activistas indianos fundaram em 1987 a Navdanya, um centro para protecção da diversidade das sementes, assim como dos direitos dos camponeses a conservar, cultivar e intercambiar a livremente as sementes, dentro do contexto das novas ameaças inseridas no Tratado dos Direitos de Propriedade Intelectual Referente ao Comercio (TRIPS), criado pela Organização Mundial do Comercio (OMC) e que abria as portas á comercialização de Organismos Modificados Geneticamente, ás patentes de sementes e consequentes direitos de propriedade. Aceites estes acordos, sob a égide da OMC, as corporações encontraram um problema: a existência dos conservadores de sementes, ou seja de camponeses que conservavam e armazenavam, nas suas comunidades, as sementes. Reclamaram os seus direitos de propriedade e a solução adoptada ilegalizou a conservação e o armazenamento das sementes por parte dos camponeses. Ou seja os camponeses indianos foram transformados em fora-da-lei. Desta forma as sementes deixaram de ser um bem comum e passaram a ser uma matéria-prima das empresas privadas.

Nos últimos 20 anos assiste-se a uma rápida erosão na diversidade das sementes e as grandes companhias controlam todas as sementes. Foi incrementado o cultivo de Organismos Modificados Geneticamente, como a soja, o milho e o algodão. As comunidades rurais indianas e os pequenos agricultores ficaram dependentes das grandes companhias e só podem usar as sementes comercializadas. Na India perderam-se as sementes de algodão devido á contaminação causada pelo algodão transgénico. Por outro lado os camponeses e os pequenos agricultores endividam-se o que os leva ao suicídio, pois ficam privados das suas terras e do sustento das suas famílias. Nas zonas rurais indianas o número de suicídios por dívidas contraídas na obtenção de sementes subiu vertiginosamente e registaram-se este ano cerca de 12 mil suicídios. Os estados da União Indiana são pressionados pelas corporações (principalmente pela Monsanto) a assinarem acordos e memoranduns de entendimento, devido aos direitos de propriedade intelectual das corporações.

A campanha chama também a atenção para o facto do governo dos USA apoiarem as multinacionais biotecnológicas e á expansão dos seus mercados exercendo pressão para a utilização de organismos modificados geneticamente, em Africa e no Paquistão, através dos acordos de cooperação e desenvolvimento. Na sua campanha global Vandana Shiva e o centro Navdanya salientam que as sementes são o primeiro enlace da cadeia alimentar e as depositárias da evolução da vida no futuro. Protegê-las para as passar ás gerações futuras é um dever de todos. A multiplicação de sementes e o livre intercâmbio entre os camponeses é a base da biodiversidade e da segurança alimentar. Na India e no mundo.

Fontes
Abbad Yehya; USAID Palestine: Building roads cut people; http://english.al-akhbar.com/

Sem comentários:

Mais lidas da semana