sábado, 14 de julho de 2012

Cabo Verde: ALUCINAÇÃO E PROMISCUIDADE DITARAM A DECISÃO DO SUPREMO




Carlos Sá Nogueira – Liberal (cv), opinião, em Colunistas

Quem passar por estes dias à frente do Centro Cultural Norberto Tavares, na cidade de Assomada pode ficar com a sensação de estar a deambular pelas artérias do Palácio da Várzea, na cidade da Praia. É que, esta quarta-feira, 11, um dia depois de conhecida a decisão do coletivo de juízes do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que anula as eleições em Santa Catarina, em duas assembleias de voto – Cruz Grande e Boa Entrada –, na sequência de um recurso interposto pela candidatura do PAICV naquele concelho, o Executivo de José Maria Neves tomou, literalmente, de assalto aquele edifício público para transformá-lo num autêntico Bureau Político do PAICV. Mais de 8 viaturas de membros do Governo foram vistas estacionadas, nesse dia, em frente àquele espaço, com vários ministros, diretores gerais e altos responsáveis do partido, acompanhados dos seus assessores, cuja missão é delinear as estratégias “para tomar à força”, a Câmara Municipal de Santa Catarina na eleição de 22 deste mês, mandada repetir ao abrigo do Acórdão do STJ, conhecido esta terça-feira, 10.

Por isso, como os leitores compreenderão, decerto, a agenda mediática está fortemente marcada pela notícia sobre a repetição das eleições, de 1 de Julho, em Cruz Grande e Boa Entrada, a 22 de Julho, p.f. Ambas as candidaturas já reagiram a decisão do STJ, de resto, considerada já, por notáveis juristas da praça, como uma “vergonha nacional e um atentado ao princípio de rigor, da transparência e da independência da justiça”. Aliás, esta decisão do STJ tem merecido comentários de juristas de várias escolas e sensibilidades do mundo, quer do Direito, quer do político-partidário. Todos os comentários convergem para o mesmo sentido: o coletivo de juízes prestou um mau serviço ao País, que pode, eventualmente, ter consequências imprevisíveis. Eu, que sou leigo no mundo de Direito diria mesmo que, do ponto de vista da hermenêutica jurídica, salvo a melhor interpretação, as alegações apresentadas pelo PAICV, acusando o MpD de “fraude eleitoral generalizada” em Santa Catarina, não colhem, e, configuram uma ação estúpida para manchar aquelas eleições.

Curiosamente, os mesmos argumentos do PAICV tiveram guaridas do STJ, o que denota, a meu ver, uma tamanha promiscuidade e parcialidade daquela instância do poder judicial, ao decidir pela repetição das eleições, quando uma leitura atenta da ata da afamada mesa de voto de Boa Entrada permite-nos perceber estarmos perante uma patranha, própria de quem perdendo nas urnas pretende, agora, - “até às últimas consequências”, como afirmou JMN – ganhar na “secretaria”. Portanto, os tais 100 votos da discórdia, só existem numa visão alucinada dos tambarinas. A questão é, sim senhor, aritmética. Ou seja, consubstancia em erro de cálculo na fixação da divergência efetiva entre o número de boletins de voto na urna e o número de votantes. Senão vejamos: “a ata da mesa de voto de Boa Entrada, que acolheu a assinatura e assentimento de todos os seus membros, incluindo os dois delegados do PAICV (Elisângela Carina Dias e André Abel Gomes de Pina), transcreve com todo o rigor os resultados eleitorais daí advindo: MpD: 137 votos, PAICV: 121; RRSC (candidatura independente): 7; votos brancos: 6 e votos nulos: 8. Ora, a soma de todos os votos apurados totaliza 279 votos, ao contrário dos 180 que vinham indicados como número total na mesma ata. É evidente que se terá tratado de um lapso de quem redigiu a ata e nunca de fraude eleitoral”, escreve Liberal na sua edição de 11 de Julho.

Ainda assim, depois de ouvir, atentamente, os argumentos esgrimidos, a este propósito, quer pelo Secretário-geral do PAICV, Armindo Maurício, quer pelo presidente do maior partido da oposição, MpD, Dr. Carlos Veiga que, de resto, se sagrou campeão no pleito eleitoral, de 1 de Julho, confesso estar, agora, profundamente, apreensivo com o desenrolar dos acontecimentos em Santa Catarina, nos próximos dias. É que Veiga já fez saber que embora não concorde com a decisão do STJ, acate-a e, por isso, exorta aos militantes, simpatizantes e amigos do MpD a se manterem serenos e a votarem, maciçamente nesse partido. Por seu turno, Armindo Maurício acusa o líder ventoinha de faltar respeito ao STJ e de ter perpetrado “fraude generalizada” em Santa Catarina, sob a égide do presidente do partido ventoinha, Carlos Veiga.

Quem, efetivamente, está farta deste imbróglio é o povo de Santa Catarina que já vai avisando, que não aceitará qualquer manobra de secretaria, que pudesse pôr em causa a vitória da candidatura do MpD naquele concelho, liderado pelo Eng.º Francisco Tavares. Os santa-catarinenses dizem estar atentos às manobras do PAICV, que tiveram a chancela do STJ para tomar, à força, a Câmara Municipal de Santa Catarina e, desta feita, mitigar as angústias de José Maria Neves que, como sabem, está em plano inclinado, depois da retumbante derrota que sofreu nestas últimas eleições.

A SAGA MARIANA

Mas esta saga, conta com um protagonista conhecido de todos. Chama-se José Maria Gomes da Veiga e, tem como seu acólito um outro José Maria Veiga, Júnior, que, concomitantemente, é mandatário da candidatura do vigário Veiga, Sénior. O Júnior é o pivô de todo o enredo do maravilhoso Mundo Novo das mentiras e insinuações, no campo pessoal e político-partidário, que tem animado a imprensa nos últimos dias, aqui no Arquipélago. As suas intervenções na Comunicação Social serviram apenas, para lançar conjeturas infundadas e, consequentemente, para confundir à opinião pública incauta, com tanto ruído em torno da alegada fraude eleitoral em Santa Catarina, no pleito de 1 de Julho último.

Quando o presidente do PAICV, José Maria Neves, em declaração à imprensa, logo depois de conhecidos os resultados oficiais da Assembleia de Apuramento Geral, que deram como vencedora, a candidatura do MpD em Santa Catarina disse, alto e bom som, que lutaria “até às últimas consequências”, para não perder Santa Catarina comecei logo a cogitar, algo apreensivo, o significado destas afirmações. Porém, depois de ler e analisar, atentamente, o conteúdo do Acórdão do STJ, de 10 de Julho, as minhas dúvidas em torno da semântica de tais barbáries declarações, desvaneceram, completamente. É que o líder do partido tambarina, em jeito de arrogância e promiscuidade, que lhe é peculiar, estava seguro daquilo que disse, a avaliar pelo teor da decisão do STJ, que entende que a alegada fraude eleitoral, “constitui uma ilegalidade grave”. Uma “ilegalidade grave”, aliás, que só existe, nas mentes brilhantes de José Maria Neves e dos seus confrades do STJ.

INVESTIDAS DO PAICV

O PAICV preparou e investiu, em Santa Catarina, quer pessoal, através da figura do primeiro-ministro, quer com recursos do Estado para comprar a consciência das pessoas para, justamente, ganhar, à força, as eleições de 1 de Julho, naquele concelho. Quem não se lembre, de toda a máquina do Governo que foi oleada e colocada nos carris das autárquicas em Santa Catarina? Das investidas do “exército” de JMN em todas as direções do concelho, na tentativa de compra de consciência das pessoas? O MpD esteve sempre entrincheirado utilizando técnicas de ataque e controlo cirúrgica que inviabilizou a estratégia do PAICV, que viu gorado o seu intento. Com isso, o MpD inviabilizaram a tentativa mórbida do partido do Governo em, tudo fazer, para ganhar as eleições autárquicas em Santa Catarina. Por isso, tal como anunciado pelo primeiro-ministro, o PAICV foi até “às últimas consequências” e, conseguiu o inédito em Cabo Verde. É que pela primeira vez o STJ anula as eleições, com base em pressupostos errados e, com isso, viola também, de forma flagrante e vergonhosa, a vontade expressa das populações de Santa Catarina, particularmente, as de Cruz Grande e Boa Entrada, durante as eleições de 1 de Julho. Fosse em outras paragens, teríamos, seguramente, a desobediência maciça das populações daquele concelho, para fazer valer a vontade popular, pois em democracia é o povo quem mais ordena. Ou seja, ninguém iria votar e tudo ficaria na mesma. Portanto, não haveria expediente de secretaria que sobreporia o sufrágio popular dos santa-catarinenses.

Por isso, as questões que importa colocar neste momento são as seguintes: para que serve um assalto à Câmara Municipal de Santa Catarina, para colocar à frente, um senhor com um recheado historial de incompetência e corrupção, quer no Governo de JMN, quer, enquanto vereador na Câmara Municipal da Praia, no consulado de Felisberto Vieira? Até que ponto que, estando em causa um erro de cálculo aritmético, já reconhecido pelas instâncias que apuraram o processo eleitoral em Santa Catarina e, considerando, ainda, que a votação em causa, expressa a vontade popular, com legitimidade indubitável, poderá o STJ, enquanto órgão de soberania, inverter a vontade e o sentido de voto das populações daquele município? Não deveria o STJ retificar o erro de cálculo e respeitar, assim, a vontade popular?

Ficam estas questões, para a reflexão dos caros leitores e amigos da democracia!

CARLOS SÁ NOGUEIRA - sanogueiraborges@gmail.com

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