Constança Cunha e Sá
– i online
Perante a morte
anunciada do governo, há quem suspire languidamente pelo milagre de uma
remodelação. Como se a substituição de um conjunto sortido de personagens
gastas pudesse ressuscitar um primeiro-ministro e uma coligação que se enterram
diariamente à vista desarmada. Isto, para não falar do grupinho de suicidas na
disposição de ingressarem num navio, para usar uma imagem náutica em voga, que
meteu água com as alterações na TSU e se afunda a uma velocidade vertiginosa,
levado pelos números da execução orçamental e por uma contestação social
crescente.
Se há uns meses
ainda valia a pena clamar contra o megaministério da Economia e contra a
incompetência de quem o tutela, agora, depois dos acontecimentos das últimas
semanas, o Álvaro, como o próprio gostaria de ser chamado, tornou-se um
problema menor face aos “desvios colossais” de Vítor Gaspar, esse mago das
finanças que se estatelou ao comprido com as suas amáveis previsões
orçamentais. Pior ainda, tornou-se um problema menor face a um primeiro-ministro
que, num misto de impreparação e de leviandade, conseguiu a proeza de unir o
país inteiro contra uma medida, a TSU, cujos efeitos ele, obviamente, não
mediu. Um primeiro-ministro que anuncia um corte salarial de sete por cento aos
trabalhadores a favor das empresas com a mesma ligeireza com que anunciou, umas
semanas antes, na famigerada festa do Pontal, um futuro luminoso, recheado de
boas notícias e de piruetas na economia.
Entretanto, o
ministro das Finanças emigrou para parte incerta, enquanto o primeiro-ministro
se desdobra em declarações desastrosas, revelando, com uma confrangedora
clareza, um total desconhecimento sobre a situação em que o país se encontra.
Ainda esta semana, num discurso memorável, Pedro Passos Coelho decidiu
informar-nos que assistira “com surpresa” à discussão em torno da TSU – como,
aliás, assistiu “com surpresa” à subida do desemprego, à queda das receitas
fiscais, ao aumento da recessão, ao chumbo do Tribunal Constitucional e a
outras miudezas afins que não vale a pena elencar. Para completar este quadro
de miséria, o primeiro-ministro alongou-se num raspanete aos empresários (que
têm “medo” de sofrer as “represálias” dos trabalhadores) e achou por bem
responsabilizar os portugueses pelo rumo que o país tem pela frente. Ele, aparentemente,
deixou de ser responsável pelo que quer que seja.
Talvez por isso,
ninguém no governo, a começar por Pedro Passos Coelho, se digna informar os
portugueses sobre algumas questões relevantes. Seria interessante, para dizer o
mínimo, saber como correram as negociações com a “troika”, quem foi o criativo
que inventou a medida da TSU, qual o exacto desvio do défice deste ano – e já
agora, se não for pedir demais, qual o valor do assalto fiscal que está em
preparação para 2013. Quanto mais não seja, para se perceber porque é que, um
ano e meio depois de nos ter sido infligida a receita que nos ia salvar, nos
encontramos agora numa “situação gravíssima” de onde ninguém nos consegue tirar.
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