Diana do Mar, da agência Lusa
Macau, China, 18
nov (Lusa) - António Azevedo deixou Portugal para trás, pela primeira vez, na
década de 1970. Mais de 30 anos depois, Sandra segue as pegadas do pai e ruma a
Macau, reescrevendo a história do 'era uma vez um país sem perspetivas'.
Corria o ano de
1978, quando António Azevedo 'aterrou' em Macau - um ano depois da estreia do
Fundo Monetário Internacional (FMI) em Portugal -, respondendo a um anúncio do
jornal Expresso, movido sobretudo pela precária situação de emprego em que se
encontrava.
"Estávamos a
recibos verdes, um pouco como agora, infelizmente, portanto não havia qualquer
perspetiva de futuro", conta António Azevedo, que, na altura, trabalhava
num dos Gabinetes de Apoio Técnico às Autarquias Locais, na vila histórica de
Castro Verde, no Alentejo.
Engenheiro
eletrotécnico de profissão, conquistou o primeiro emprego a Oriente na
Companhia de Eletricidade de Macau (CEM), onde esteve até ao fim de 1981,
altura em que um problema de saúde da primeira filha, Marta, ditaria o
regresso.
Daqueles tempos
permanece até hoje a memória de um período muito difícil: "Estive seis
meses desempregado em casa dos meus pais, já casado. Entretanto, nasceu a Inês,
em 1982. Tenho muitos irmãos também e, nessa altura, ainda estavam na casa dos
meus pais".
"À medida que
o tempo ia passando, aquilo ia piorando. Em 1983, estava convencido de que iria
melhorar, que a minha vida ia ser gradualmente melhor, mas foi sendo pior.
Havia aumentos, mas a inflação comia-os". Por isso, "decidimos, em
fins de 1983, procurar regressar a Macau", explica António Azevedo, 61
anos, que volta a fazer as malas no início de 1984.
As dificuldades de
emprego "foram muito notórias" durante aquela época em que os
funcionários públicos também ficaram sem subsídio de natal face à necessidade
de mais um resgate, aponta. "Não sei se na altura chamavam resgate, mas,
enfim, o FMI entrou em
Portugal. Foi muito complicado".
Desde o retorno, em
1984, e até ao último ano da administração portuguesa em Macau, o percurso foi
"suave", diz António Azevedo que, apesar de ter saído da CEM, em
1988, mantinha um escritório de consultadoria.
Em 1999, a família
decide voltar: "As minhas filhas mais velhas - a Marta e a Inês - acabavam
um ciclo, estavam no fim do secundário, e a opção de estudos seria em Portugal
(...). A Lena era funcionária pública e tinha pedido integração em Portugal. Eu fui
também, fomos todos e eu fui fazer aquilo que estava a fazer cá, mas aí foi
difícil".
Estava perto dos
seus 50 anos e começar do zero foi muito diferente. Tudo era "muito
complicado" e "nada transparente" principalmente ao nível do
sistema e dos impostos para uma microempresa.
Em 2006, arrisca
uma terceira investida em Macau, onde agarra uma oportunidade no Gabinete para
o Desenvolvimento de Infraestruturas. Ali ficou até hoje.
Já Sandra Azevedo,
25 anos, chegou no verão do ano passado a Macau. Ou melhor, regressou. Apesar
de ter nascido e vivido os primeiros 12 anos da sua vida no território, a filha
mais nova de António Azevedo escolheu Portugal para prosseguir os estudos e,
entretanto, conheceu outras paragens.
Depois de concluir
a licenciatura em Lisboa, embarcou na aventura de um par de estágios, que se
traduziu numa experiência "espetacular", mas sem qualquer perspetiva.
"A minha
perspetiva era continuar a fazer estágios não remunerados e isso já não dava
depois de um ano. (...) Aí decidi sair de Portugal", conta Sandra Azevedo,
que opta por 'abandonar' o jornalismo por uma vivência "diferente" em
Inglaterra, onde trabalhou como ama.
Contudo, volvidos
nove meses, começou a sentir falta daquilo que realmente queria: "Tentei
em Portugal encontrar trabalho e fiz a minha pesquisa, mas depois comecei a
pensar que o melhor era mesmo ir para fora e a primeira coisa que me surgiu foi
mesmo Macau".
"É uma
situação muito difícil, uma precariedade de emprego gigante, as pessoas querem
sair. Agora existe mesmo uma sede que eu nunca tinha visto, e quando surgiu a
oportunidade de vir para Macau com as condições que me ofereciam - muito
melhores do que qualquer coisa que em Portugal pudesse surgir -, as pessoas
diziam 'arranja-me qualquer coisa em Macau', e isso ainda se nota".
"Quase todos
os dias recebo uma mensagem dessas e isso faz-me muita confusão, porque acima
de tudo é triste. As pessoas estudam, querem ser úteis, fazer aquilo por que
lutaram e depois não conseguem, não têm oportunidades", constata Sandra
Azevedo, que quando chegou a Macau delineou uma meta temporal que, entretanto,
rasurou.
"Pensei para
mim mesma num limite de três a quatro anos para depois dar o 'salto'. Mas, sinceramente,
agora já não sei. Portugal não é para já nem para os próximos três a quatro
anos, uma opção", diz a jornalista da Teledifusão de Macau (TDM).
A voz experiente do
pai também não antecipa estarem reunidas as condições para um regresso a
Portugal em breve: "Seria muito bom que fosse daqui a cinco anos".
Mas, "diria dez anos".
"Deus queira
que me engane, seria muito bom que me enganasse", diz.
DM // VM
Sem comentários:
Enviar um comentário