Fernando Santos –
Jornal de Notícias, opinião
São várias as
castas políticas responsáveis pela desgraça a que o país chegou. Entre a
irresponsabilidade e a demagogia a cheirar a voto, o desgoverno trespassou
pessoal de vários patamares do aparelho de Estado. Uns ainda gravitam na zona
de influência do poder, incluindo o económico, outros ascenderam ao estatuto de
"senadores" de um país falido e sobre o qual se pronunciam como se
nunca nada lhes tivesse passado à frente do nariz.
A imagem parecerá
desproporcionada, mas não: em vez de adotar o perfil das boas donas de casa,
ciosas das boas contas e de bom senso na defesa do bem-estar das famílias, o
país viveu da defesa de interesses corporativos espúrios e de benesses irreais
para aquecer os lugares do poder pela via da legitimação do voto popular.
Amplificadora do
défice, uma tal mistela só podia dar no que deu. Primeiro no pedido de socorro
internacional e depois na necessidade de pôr quem ainda tem empresas ou emprego
a trabalhar para alimento de um Estado governado durante anos e anos por
indigência em nome de interesses inconfessados. Metidos num beco, segue-se a
única saída - eufemística, tardia, mas realista: a refundação do Estado.
Aos poucos faz-se a
descodificação do discurso ditirâmbico do atual primeiro-ministro e já se
percebeu: tarde e a más horas descobriu-se a necessidade de recuperar a gestão
das boas donas de casa, isto é, cingir as despesas, incluindo as dos juros de
uma dívida astronómica, às receitas possíveis.
O ponto, agora, é
saber como se processará o emagrecimento do Estado. A discussão ideológica é
atrativa mas será um erro dar-lhe foco exclusivo...
Para já o país
parece estar em estado de choque. Cenariza-se o de mais óbvia aplicação:
retirar o Estado de áreas nas quais é mais empecilho do que fator de
desenvolvimento - ser dono de propriedades agrícolas, por exemplo, não lembra
ao careca! - e, em simultâneo, apertar a malha de benefícios da população em
áreas como a Saúde, o Ensino ou a Segurança Social.
Cortar, cortar,
cortar. A utilização estafada do verbo desequilibra os dois pratos da balança:
direitos e deveres. E o resultado, como é evidente, é pouco compreensível. Não
atrai apoiantes.
Num Estado de bem,
os cidadãos pagam impostos a um nível (in)suportável mas sabem com o que
contam: uma reforma planificada e garantida, um subsídio de desemprego digno,
hipóteses de dotar os filhos de Educação que lhes garanta o futuro, confiança
no tratamento aceitável de uma unha encravada ou uma cirurgia às varizes. Já um
Estado sem palavra, descredibilizado, caloteiro, sanguessuga, muda as regras
mês sim mês não, corta direitos aos cidadãos e ainda lhes saca e volta a sacar
mais e mais impostos, rivalizando com o melhor bandoleiro do faroeste! Nem
sequer se coloca a hipótese de escolha, plafonando exigências em nome da
solidariedade com o próximo....
Portugal está,
assim, numa verdadeira encruzilhada.
Serve para quê o
pagamento obrigatório de impostos segundo método aparentado à pirataria? Apenas
para sustento de um amiguista aparelho de Estado mandrião, incluindo-se nele
politiquinhos?
Depois queixem-se
da subida exponencial da economia paralela.
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