segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Angola: WLLIAM TONET É CULPADO

 


Sentença da Ordem dos Advogados de Angola
afirma que até prova em contrário William Tonet é… culpado

Carta ao Editor do Zwela Angola, publicado em "Vozes Silenciadas"

Orlando Castro – Zwela Angola

Caro Editor:

Angola (ainda) não é um Estado de Direito e, por isso, o poder instalado desde 1975, e que acumula as principais variantes da sociedade (militar, económica, política e social), continua a gerir o país como se ele fosse um feudo do regime, sendo que todas as instituições devem ser meras correias de transmissão da autocracia do MPLA.

É nesse contexto que se insere a Ordem dos Advogados de Angola (OAA), organismo que – como outros - do ponto de vista formal ajuda a maquilhar essa autocracia, dando-lhe laivos de democracia. O caso que envolve o cancelamento da inscrição do advogado William Tonet é a prova provada dessa subjugação ao poder, para além de ser à luz da matéria de facto relevante uma mostra da incapacidade e da nula independência da própria OAA.

Diz a OAA, correspondendo certamente ao articulado da cartilha do regime, que a sua decisão se deve ao facto de William Tonet não ter apresentado um documento comprovativo definitivo de frequência de curso.

Ao que tudo indica, esse documento (como outros que serão revelados se tal for necessário) não consta mesmo do processo. E não consta porque, estrategicamente, foi retirado do processo para dar cobertura, supostamente legal, à estratégia do regime que tudo faz para “assassinar” politica e socialmente a credibilidade de William Tonet.

No entanto, o facto de esse documento ter transitado do processo de William Tonet para uma outra gaveta não prova que ele não exista, nem que ele nunca tenha sido entregue. Todos os documentos necessários (e só assim se compreende a inscrição na OAA, mesmo que provisória) foram entregues e a recepção dos mesmos comprovada por documentação que está, inclusive, em poder de diversas entidades e personalidades, algumas delas fora do país.

Este verdadeiro tiro nos pés dado pelo bastonário da OAA, Hermenegildo Kachimbombo, revela desde logo que a Ordem não é um organismo de defesa da Classe (como são as suas congéneres que funcionam em Estados de Direito) mas, antes, um mero apêndice do regime.

Hermenegildo Kachimbombo explicou, de forma leviana e sem sustentabilidade factual, que William Tonet beneficiou de cédula de advogado estagiário em virtude de ter apresentado uma declaração de reconhecimento provisória, acto que teria de ser complementado com uma declaração definitiva, após o fim do período de estágio.

O bastonário da OAA sabe perfeitamente que todas as formalidades documentais e processuais foram escrupulosamente cumpridas por William Tonet. Apesar disso, baseado em suposições impostas pelo regime, afirmou que “decorridos 18 meses de estágio o mesmo não apresentou, por motivos alheios à ordem, o documento definitivo que comprova a frequência do curso de Direito para a obtenção da cédula de advogado”.

Hermenegildo Kachimbombo sabe que está a mentir porque do processo de William Tonet consta o documento comprovativo do curso de Direito (não apenas – como dizia o bastonário – da frequência). Consta, repito, porque existe documentação inequívoca da entrega desse documento não cabendo, como á óbvio, a William Tonet a função de ser guardião de um processo que em qualquer Estado de Direito estaria à guarda da respectiva Ordem dos Advogados.

Tentando justificar o injustificável, Hermenegildo Kachimbombo encarnou o papel de virgem e afirmou que, “como este é um processo burocrático, todos os formados no estrangeiro apresentam uma declaração provisória para facilitar o início do estágio, no final do qual deverá ser apresentada a declaração definitiva, como tem acontecido”.

Foi, aliás, isso que aconteceu. A OAA recebeu a tempo e horas toda a documentação definitiva, não sendo sequer aceitável que a Ordem venha alegar que essa documentação terá desaparecido.

Diz ainda o bastonário que antes de ver a sua inscrição cancelada, a OAA informou William Tonet sobre a situação de irregularidade, para que ele - no período de 15 dias – regularizasse a situação.

Como se já não bastasse a camaleónica metamorfose político-jurídica da OAA, o próprio bastonário prestou-se ao papel (reconhecidamente louvado pelo poder político) de teimar em mais uma mentira, certamente convicto de que uma mentira dita muitas vezes por quem manda acabará por ser verdade. Não é, contudo, o caso. William Tonet nunca foi avisado oficial e formalmente pela OAA de qualquer irregularidade.

Aliás, tal como William Tonet tem toda a documentação sobre a legalidade do seu processo, bem como os registos de todas as entregas de documentos, se estivesse a falar verdade também o bastonário não teria problemas em mostrar documentos que sustentem o que afirma.

A tudo isto acresce, mesmo nos meios próximos do regime, o entendimento de que este caso mais não é do que uma retaliação pura e torpe, no caso usando a OAA, não contra o advogado William Tonet mas, antes, contra o jornalista e político William Tonet.

Para tentar “assassinar” (por enquanto apenas do ponto de vista moral, profissional e social) William Tonet, o regime procura por meios subreptícios (nos quais é, aliás, especialista) ajustar contas, algumas bem antigas, com o jornalista que, por exemplo, recentemente criticou no Folha8 o Vice-Presidente da República, Manuel Vicente.

É evidente que, alérgico como é a todas as críticas e a todos quantos teimam em pensar de forma diferente, o regime teria de reagir contra quem chamou ao ex-patrão da Sonangol o “Berlusconi de África”.

E, também mais uma vez, atirou a pedra e escondeu a mão. Ou seja, deu ordens à Ordem dos Advogados para desempenhar o papel de palhaço num circo em que pretende atirar William Tonet às feras.

Apar do papel desempenhado pelo bastonário da OAA, também foi figurante de primeira o próprio tenente general Adão Adriano, da Procuradoria-Geral da República.

Importa recordar que o jornalista, advogado e político William Tonet é inimigo público do regime angolano, razão pela qual ao longo da sua odisseia é sempre culpado até prova em contrário. Foi assim quando, há pouco mais de um ano, foi condenado a um ano de prisão com pena suspensa e ao pagamento de uma multa em Kwanzas, avaliada em 100 mil dólares norte-americanos.

A democracia “made in MPLA” é mesmo assim. Todos são livres para estarem de acordo com o regime. Quem não estiver, mesmo que seja só em pensamento, leva pela medida grossa.

Segundo o Juiz do Tribunal Provincial de Luanda em caso de não pagamento dessa multa no prazo máximo de cinco dias, Willian Tonet, julgado por difamação, poderia ser conduzido à cadeia.

“Por homicídio a condenação são duzentos mil kwanzas, às vezes o juiz tenta forçar e chega aos seiscentos mil kwanzas, agora por uma difamação estamos a falar em dez milhões de kwanzas. Isso é acima de tudo incompreensível, é acima de tudo daqueles casos que nós temos visto, em que se quer a todo custo prender as pessoas” – reagiu na altura o advogado David Mendes.

David Mendes, patrono de William Tonet, esquece-se, contudo, de que pessoas só são aqueles que dizem ámen ao regime. O que, manifestamente, não é o caso de William Tonet.

William Tonet considerou então tratar-se de uma armadilha para o silenciar e disse que “o que será mais honesto de nossa parte, é virmos com a nossa bagagem para sermos recolhidos à cadeia”.
Os três processos movidos contra o jornalista datam de 2007 Janeiro, Novembro e Dezembro, e tipificavam todos os crimes que mais interessavam ao regime: injúria, calúnia e difamação.

Os processos tinham como autores impolutos (segundo as regras e os valores do regime) cidadãos como António Pereira Furtado, então chefe do Estado-Maior das FAA, o General Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Presidência da República e o General Pitagrós, Procurador Militar.

Certamente para cumprir o seu maquiavélico desiderato, William Tonet continua a “contar com uma equipa de jornalistas nacionais e estrangeiros que no presente momento têm redigido os principais artigos detractores à política governamental do País”. No início de 2008 esta era pelo menos a opinião do “Independente”, um jornal estrategicamente renascido das cinzas, ligado a Fernando Manuel, outrora membro da DISA (a polícia do Estado), depois SINFO e ex-vice-ministro da Segurança do Estado, e que apareceu como um instrumento de desacreditação da imprensa privada que se atrevia a não tocar pelo diapasão do regime.

Em Angola, a filosofia oficial é valorizar os que dizem que fazem e não os que fazem, os que colocam a subserviência no lugar da competência, os que trocam um prato de pirão em pé por uma lagosta de cócoras. Mas, mesmo quando o regime arregimenta a OAA e outros similares, continuo a pensar que não é este tipo de sociedade que eu quero, que William Tonet quer, que os Homens livres (mesmo os do MPLA) querem.

A impunidade do regime continua e quanto mais cedo se calarem as vozes que se batem pela denúncia das arbitrariedades e da corrupção endémica do sistema, melhor.

Este sistema mata mesmo, apesar da imagem de anjo do Presidente Eduardo dos Santos, o número de assassinatos não têm parado de crescer e Tonet é visto como uma pedra no sapato do regime, e que por isso não pode continuar ou em liberdade ou com vida.

Ao contrário do que os mais ingénuos esperavam, o MPLA e o seu regime tentam eliminar todos quanto pugnem por uma imprensa livre, por uma advocacia livre, pela liberdade de expressão e pela implantação de uma verdadeira democracia.

Com os milhões do petróleo, Eduardo dos Santos ao invés de trabalhar para uma verdadeira reconciliação nacional, pretende consolidar o seu regime com a eliminação física dos seus adversários políticos, como aconteceu com o jornalista Ricardo de Melo, Nfulumpinga Landu Victor, líder do PDP-ANA, ou Jonas Savimbi.
William Tonet há muito que mostrou ter qualidades guerreiras. Se assim não fosse não teria sobrevivido à “selva” onde continua de pé. Triunfos? Sim, teve muitos, destacando-se desde logo o facto manter um jornal independente e uma coluna vertebral erecta.

William Tonet também é daqueles que nunca serão derrotados porque nunca deixarão de lutar. E isso é uma espinha atravessada na garganta dos seus inimigos. E que espinha!

É verdade, reconheço, que Eduardo dos Santos pode fazer quase tudo o que lhe apetece. Mas, como é óbvio, não pode – mesmo que o assassine – matar a dignidade de William Tonet. Tal como não pode, embora vontade não lhe falte, banir da História de Angola e da Lusofonia, seja quem for que a venha a escrever, o nome de William Tonet. Isso, é claro, não o impede de ordenar à Ordem dos Advogados que lavre uma sentença em que, até prova em contrário, William Tonet é… culpado.

Enviado por Orlando Castro, Jornalista, em 11 de Novembro de 2012

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