Baptista-Bastos – Diário de Notícias, opinião
Há dias, na TVI 24,
o prof. Paulo Morais fez um requisitório violento sobre a corrupção, e os
interesses que se entrelaçam nos deputados do "arco do poder."
Segundo disse, de manhã encontram-se, jovialmente, nos escritórios de advogados
e, à tarde, vão ao Parlamento representar aqueles que lhes pagam.
Paulo Morais
ferrou-lhes o nome a fim de marcar a ignomínia do procedimento. A corrupção só
acabará quando eles forem varridos. Tarefa acaso difícil, mas não impossível e
ao alcance da nossa cidadania. A urgente necessidade dessa empresa corresponde
ao facto de "a nossa democracia estar moribunda". Paulo Morais,
professor universitário no Porto, raramente é chamado pelas tv's; no entanto, o
que diz, pelas verdades que comporta, atroa os ouvidos.
É mau para a
democracia atacar o Parlamento, asseveram cândidas almas. Que fazer, então?
Deixar que os vendilhões se assenhoreiem do templo, e dar cobertura à
bandalheira indicada pelo prof. Paulo Morais? Aceitar, de ânimo leve, que gente
honrada, como outro que se não cala, o prof. Medina Carreira, seja enxovalhada
por uma Justiça escabrosa e por jornalistas de baixo jaez e duvidoso estilo? As
cumplicidades estabelecidas possuem ramificações tenebrosas. Medina Carreira foi,
obviamente, vítima de uma perversidade sórdida, mas não fica imune da infâmia
quem, sem curar de saber a veracidade dos factos, tratou de transformar uma
insídia numa aparente verdade.
Este jornalismo de
faca na liga talvez não prolifere; mas anda por aí, e os seus mosqueteiros (e
mosqueteiras) são aplaudidos com desenvolta leviandade. A sociedade portuguesa
sofre do mal do tempo, dizem. Contudo, a brutalidade das transformações, por
muito aceleradas que sejam, não justificam as cedências e as baixezas a que
assistimos. Quando Luís Marques Mendes, em outra barricada, condena Vítor
Gaspar, por este nos tratar como "atrasados mentais", essa desordem e
essa perturbação têm muito a ver com a consciência do descaso e com a admissão
do imoral como norma.
Criticar o
Parlamento e os que tripudiam sobre a nobre função de deputado, para sobrepor
as suas conveniências aos imperativos sagrados do bem comum, não só amolga a
democracia: também vilipendia aqueles que a traem. Andamos excessivamente
preocupados com tratar delicadamente os que vão para a Assembleia apenas para
tratar da vidinha. É tempo de dizer, com o prof. Paulo Morais, que (entre os
demais) os drs. António Vitorino e Paulo Rangel já estiveram juntos, de manhã,
no mesmo escritório de advogados, a defender causas e proveitos comuns; e,
"separados", à tarde, na Assembleia, a pleitear questões
aparentemente opostas. Talvez não haja conflito de interesses, mas o assunto
causa engu- lhos, e atiça, certamente, suspeitas de ordem moral. Naquele extremo
cume da extrema consciência [Camus] manifesta-se uma razão superior.
Por decisão
pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
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