Deutsche Welle
Organização Human
Rights Watch chama atenção para abusos da polícia, superlotação de prisões e
trabalho escravo. Pontos positivos foram queda na mortalidade infantil e avanço
na legislação contra violência doméstica.
O Brasil ainda tem
sérios desafios pela frente para garantir o respeito aos direitos humanos,
afirmou nesta quinta-feira (31/01) a organização internacional Human Rights
Watch (HRW) em um relatório que analisou a situação em mais de 90 países.
Entre os principais
problemas apontados pela HRW no Brasil estão a violência policial e sua
impunidade, além da superlotação dos centros de detenção em vários estados
brasileiros, tortura e trabalho escravo.
"O relatório
mostra a realidade. O índice de violência é crescente, e falta uma estratégia
dos governos federal, estaduais e municipais para trabalhar de forma
articulada. Existe recurso para isso, mas falta a integração e a priorização
desse tópico", frisou, em entrevista à DW, o professor de segurança
pública da Universidade de Brasília (UnB), Antônio Flávio Testa.
A organização de
direitos humanos enumera alguns avanços do Brasil, como a diminuição
significativa das taxas de mortalidade infantil nas últimas duas décadas, mas
destaca que as estatísticas mascaram disparidades severas em função de cor,
condição econômica e região. Outro avanço foi a aprovação da união civil entre
pessoas do mesmo sexo.
Foram verificados
progressos também no combate à violência doméstica, depois que o Supremo
Tribunal Federal (STF) garantiu a constitucionalidade da chamada Lei Maria da
Penha e determinou que os promotores públicos devem levar à frente as acusações
mesmo que as vítimas não tenham prestado queixa à polícia.
Conduta policial
O relatório chama a
atenção para o número de mortes por responsabilidade de policiais – nos
primeiros seis meses de 2012, a polícia foi responsável pela morte de 214
pessoas no estado do Rio de Janeiro e 251 mortes no estado de São Paulo.
A HRW reconhece que
parte destas mortes são resultado do "legítimo uso da força" por
parte da polícia, mas muitas organizações de direitos humanos e a própria
justiça criminal brasileira admitem que muitas são resultado de abusos.
O relatório conclui
que as autoridades brasileiras "não deram ainda os passos adequados"
para que os policiais que cometem abusos sejam responsabilizados. Testa,
entretanto, discorda: "Muitos policiais estão sendo processados e presos.
Nesse aspecto, há punições, e o Brasil tem avançado", pondera.
Prisões
superlotadas e tortura
As carceragens em
vários estados brasileiros estão severamente superlotadas, prisões preventivas
longas demais são frequentes, e a tortura continua a ser um sério problema,
afirmou o relatório sobre o sistema prisional brasileiro.
Dados do sistema
penitenciário do Brasil mostram que houve um aumento de aproximadamente 40% no
número de presos nos últimos cinco anos, e a população penitenciária excede
atualmente meio milhão de pessoas – dois terços mais do que a capacidade atual
das penitenciárias. Atrasos do sistema judiciário contribuem para a
superlotação: cerca de 175 mil detidos estão em prisão provisória.
As condições de
detenção "favorecem a propagação de doenças em uma população que tem
acesso inadequado a cuidados médicos", cita o relatório. A tortura é
apresentada como um problema crônico das prisões e postos policiais.
O subcomitê de
Prevenção da Tortura da Organização das Nações Unidas (ONU) vistoriou
penitenciárias e instutições policiais nos estados de São Paulo, Rio de
Janeiro, Espírito Santo e Goiás em setembro de 2011 e recebeu de detentos
relatos "repetitivos e consistentes" sobre mal tratos, como a
obrigação de dormirem em celas sem condições sanitárias e sem o acesso a água e
comida.
Panorama internacional
também preocupa
As críticas em
relação à defesa dos direitos humanos não foram dirigidas exclusivamente ao
Brasil. A HRW constata que a proteção desses direitos não foi prioridade para a
União Europeia em 2012, sobretudo em relação a grupos marginalizados da
sociedade, os mais afetados pela crise econômica, segundo o relatório.
A organização cita
a Hungria, onde foram aprovadas leis que "enfraquecem" a proteção aos
direitos humanos e a independência judicial. Em relação a Grécia, a HRW critica
a violência xenófoba e a aprovação de legislação autorizando a polícia a deter
imigrantes e candidatos a asilo por "razões de saúde pública, incluindo a
suscetibilidade a doenças infecciosas".
"A relação
entre crise econômica, intolerância e apoio a partidos extremistas é
complexa", afirmou o subdiretor da Divisão da Europa e Ásia Central da
HRW, Benjamin Ward.
No capítulo sobre a
Venezuela, o relatório indica que a longa permanência no poder levou o presidente
Hugo Chávez e seus seguidores a uma "acumulação de poder" que tem
permitido abusos e intimidação. Esse abuso de poder, segundo da HRW, tem
afetado o poder judiciário do país, os meios de comunicação e os defensores dos
direitos humanos. O medo de represálias faz com que, mesmo que persistam as
críticas ao governo, a capacidade de juízes se pronunciarem em casos com fortes
implicações políticas seja mínima.
A Rússia registrou
em 2012 a pior repressão à sociedade civil desde o fim da União Soviética, há
21 anos. Desde o regresso de Vladmir Putin à presidência para seu terceiro
mandato, em maio, um parlamento dominado pelos membros do partido pró-Putin
Rússia Unida adotou uma série de leis que impõem restrições consideráveis à
sociedade civil, informou o documento.
Entre os países
árabes, a euforia da Primavera Árabe deu um passo frente ao complicado desafio
de criar democracias que respeitem os direitos humanos. A organização
pressionou os novos regimes islâmicos de países como Egito, Líbia e Tunísia a
construir democracias "genuínas", dizendo que mesmo governos eleitos
democraticamente não podem ignorar os direitos humanos.
Autor: Fernando
Caulyt - Revisão: Francis França
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