Henrique Monteiro –
Expresso, opinião
Num cuidadoso e
interessante trabalho hoje publicado na revista 'Visão ' os meus
colegas Alexandra Correia e Paulo M. Santos revelam algo que muita gente
desconhece: os salários mais elevados estão a ser mais reduzidos do que os
salários mais baixos. Não me refiro, obviamente, a números absolutos (porque
isso seria evidente), mas em termos percentuais.
Ou seja, são
os mais 'ricos' - dando de barato a falácia portuguesa de que ser rico é
ganhar bem, ou menos mal - que mais pagam a crise. Mas, como esses mais
'ricos' não estão habitualmente agrupados em sindicatos ou associações de
classe, não têm ninguém que se queixe por eles (salvo, talvez, um cronista como
eu, que para as finanças também faz parte dos ricos). Os dados são
esclarecedores, ora vejam: entre 2008 (último ano em que a crise não
se fez sentir nos vencimentos) e 2013 a média dos salários baixou 8,27%.
Mas não foi igual para todos. Por exemplo, as secretárias viram o salário
degradar-se, em média, 7,98%; um operador de supermercado fica com menos 8,72%;
um rececionista, menos 9,58%. Mas estamos a falar de ordenados baixos menos de
mil euros líquidos para uma secretária, menos de 630 para um operador de
supermercado, menos de 590 para um rececionista.
Mas, nos
salários mais elevados os cortes são completamente de outra ordem. Um diretor
financeiro ganha menos, em média, 31% (quase um terço do que ganhava em
2008); um subgerente de um banco menos 22,73%; um diretor de publicidade
menos 38%; um diretor geral numa empresa industrial, menos 25%. Ou seja,
ao contrário da voz corrente, são exigidos, em proporção, muitos mais sacrifícios
a quem ganha mais. Claro, que aqui estamos a falar de salários mais elevados:
cerca de 2100 euros líquidos para um diretor financeiro; mais de 1300 para um
subgerente de um banco; mais de 1800 para um diretor de publicidade; mais de
3300 para um diretor geral numa empresa industrial. Notem que todos estes
salários são médias.
Muita gente dirá: não
me importava que me cortassem 50% se ficasse a ganhar 1100 euros, eu sei. Mas também
sei que só diria isso, caso anteriormente não ganhasse 2200. Não pretendo
discutir se é justo ou não e não posso crer numa sociedade na qual todos os
salários tendam a ser iguais, independentemente da responsabilidade,
especialização e necessidade. Apenas queria mostrar que os que mais têm
(salários) estão a contribuir muito mais - seja pela via dos impostos, seja
pela das reduções salariais que as mais das vezes tentam manter postos de
trabalho nas respetivas empresas.
Nem sempre a voz
corrente é a verdade.
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