quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Portugal: AI NÃO AGUENTAM, NÃO AGUENTAM MESMO




Ana Sá Lopes – Jornal i, opinião – foto Tony Gentile/Reuters

A cantiga é uma arma, mas o voto é a arma suprema e decisiva da democracia

O resultado das eleições italianas foi um terrível balde de água fria para o mainstream europeu. O adorado Monti (uff, ainda existe agora algum candidato ao cargo de Monti português?) naufragou – depois de ter utilizado em campanha, além de outros bons argumentos, o facto de ser o candidato que mais agradava a Berlim. Tratava-se de uma verdade inconveniente que, sabe Deus como, Monti decidiu utilizar como arma eleitoral. Saiu-lhe tudo ao contrário.

Um cómico anti-sistema, anti-partidos, anti-políticos e com eurodúvidas é agora uma espécie de fiel da balança; um Berlusconi acossado por escândalos renasce das cinzas com uma única palavra de ordem – contra a ditadura da Alemanha, marchar, marchar; o programa contra a austeridade de Bersani lidera as duas câmaras mas sem maioria absoluta. Os italianos chumbaram ontem, em primeiro lugar, a política europeia fundada na austeridade, humilhando o tecnocrata enviado de Berlim para a chefia do governo. Mas, ainda mais significativo e inesperado, mostraram uma entusiástica adesão ao partido anti-sistema de Beppe Grillo. A coligação de esquerda de Bersani está em apuros para conseguir cumprir um programa aceitável em Bruxelas – de um lado tem o cada vez mais anti-germânico Berlusconi, do outro o humorista que admite a saída do euro.

Como o socialista, ex-candidato presidencial, Manuel Alegre afirma nesta edição do i, o que se passou em Itália demonstra “a implosão do sistema político tal como ele existe”. O risco da emergência dos populismos na Europa na sequência da “ditadura do défice” e da imposição de políticas violentas nas costas das populações já tinha sido pré-anunciado por muitos. A ascensão do cómico – que foi desprezado durante a campanha pelos jornalistas italianos como se fosse apenas um episódio folclórico – respondeu a estas dúvidas. A ressurreição de Berlusconi com um programa anti-europeu também.

Era este o momento para Bruxelas e Berlim perceberem finalmente o que se está a passar, já que não aprenderam nada com as eleições gregas. Infelizmente, começa a ser demasiado tarde para uma mudança substancial nas políticas europeias a tempo de travar a catástrofe social e aquilo que vão considerar uma catástrofe política: os vetos nacionais à austeridade e os populismos anti-europeus. Itália mostrou que, ao contrário da máxima do banqueiro Ulrich, as pessoas não aguentam. E que se a cantiga é uma arma, o voto é a arma suprema.

Áudio-Vídeo: A cantiga é uma arma

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