segunda-feira, 18 de março de 2013

CRISE CIPRIOTA. PORTUGAL PODE VIR A PAGAR IMPOSTOS SOBRE A POUPANÇA




Pedro Rainho e Margarida Bon de Sousa – Jornal i

Economistas portugueses acusam Bruxelas de pôr em causa a confiança no sistema bancário

A opinião é quase unânime entre os economistas ouvidos pelo i: taxar os depósitos que os cidadãos europeus confiaram aos seus bancos - à imagem daquilo que a União Europeia acaba de decidir aplicar no Chipre - não é uma carta fora do baralho nos programas de assistência financeira das economias do euro. Portugal incluído. Mais consensual é a ideia de que, ao cativar parte dos depósitos dos cipriotas, a União Europeia deu uma machadada na confiança que os europeus têm no sector bancário.

“É absolutamente lamentável que se possa adoptar esta medida, que põe em causa a confiança no sistema bancário”, diz o economista Miguel Beleza, que admite o efeito contágio. “Em Portugal, essa confiança é extremamente elevada. Os portugueses são, dentro da zona euro, os que menos notas utilizam e mais recorrem ao sistema electrónico de pagamentos”, acrescenta, defendendo que o novo imposto sobre os depósitos cipriotas deve ser abandonado o mais depressa possível.

“Com esta decisão, julgo que foi aberta a caixa de Pandora”, diz Octávio Teixeira, que dá como garantida a perda de confiança no sistema bancário como um todo. Depois de dez horas de negociações à porta fechada, os ministros das Finanças da zona euro chegaram, já na madrugada do último sábado, a um acordo sobre as condições a aplicar no Chipre, em troca de um pacote de assistência de 10 mil milhões de euros. A moeda a pagar para evitar o “colapso” da banca do país é a aplicação de uma taxa sobre todos os depósitos bancários - 9,9% para os acima dos 100 mil euros, 6,7% para valores abaixo desse patamar. Ninguém fica de fora.

“Fica o sentimento de que é possível ser apanhado por uma situação destas”, refere o economista e ex-deputado do PCP, que apelida a decisão - ou o “confisco” - de “irresponsabilidade política” e sublinha que “já ninguém tem credibilidade nem legitimidade para garantir que isto não acontecerá noutros países. Nem nos paraísos fiscais os depósitos estão garantidos”, lança Octávio Teixeira.

Apesar de em Portugal estar a ser aplicado um modelo de reajuste da economia assente em pressupostos diferentes dos agora definidos para o Chipre, João Duque não exclui a possibilidade de o castigo cipriota poder ganhar escala e vir a ser aplicado noutras geografias. “É sempre possível replicar noutros países o que se faz em diferentes mercados”, assume o presidente do Instituto Superior de Economia e Gestão. No entanto, o economista ressalva a ideia de que “os erros que o sector bancário terá cometido, e que levaram às actuais dificuldades, “foram feitos em nome da economia real do país e não para alimentar ganhos financeiros.”

Hoje, feriado no Chipre, e depois de um fim-de-semana de pânico (ver texto em i), os deputados reúnem-se numa sessão de urgência para votar o plano de resgate desenhado por Bruxelas e que, na opinião de João Duque, deveria salvaguardar os interesses públicos. “O Estado deveria ser devidamente compensado na atenção que se prepara para dar à banca”, refere o economista, que não descarta a hipótese de novos resgates em função do caso cipriota: “Há a possibilidade de contágio, mas vamos esperar para ver como o mercado interpreta” a intervenção.

Excepção à regra, Mira Amaral considera que “não há paralelo” entre o Chipre e Portugal, apesar de olhar para a opção da União Europeia como uma medida “bastante violenta”. Fora de questão estará, para o ex-ministro de Cavaco Silva, o arrastar de outros países, porque o Chipre não é a Espanha ou a Itália - esses, sim, “podem configurar um risco sistémico”.

BRUXELAS TENTA ACALMAR EUROPA 

O comissário europeu para os Assuntos Económicos e Monetários, Olli Rehn, tentou ontem deitar água na fervura das preocupações dos países da zona euro, ao descartar a hipótese de a União Europeia aplicar uma medida semelhante à imposta ao Chipre a outros estados-membros. “Não há caso algum onde este tipo de acção deva ser considerado”, disse Rehn, acrescentando que não espera uma reacção adversa dos mercados durante o dia de hoje. “As forças do mercado compreendem que a enorme dimensão.

do problema do sector financeiro cipriota, combinada com os problemas tão colossais que este tinha, requeria a tomada de medidas substanciais”,acrescentou o comissário que tutela a área.

Já o presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, defendeu a protecção dos pequenos aforradores cipriotas, defendendo que as medidas impostas pelo plano de resgate devem ser socialmente aceitáveis.

“A participação dos depositantes é correcta” disse Schulz à edição online do jornal “Welt am Sonntag”, da Alemanha, “mas os cidadãos não são responsáveis pelo problema do Chipre”. O deputado reivindicou que deve haver uma taxa de excepção abaixo dos 25 mil euros.

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