Pedro Rainho e
Margarida Bon de Sousa – Jornal i
Economistas
portugueses acusam Bruxelas de pôr em causa a confiança no sistema bancário
A opinião é quase
unânime entre os economistas ouvidos pelo i: taxar os depósitos que os
cidadãos europeus confiaram aos seus bancos - à imagem daquilo que a União
Europeia acaba de decidir aplicar no Chipre - não é uma carta fora do baralho
nos programas de assistência financeira das economias do euro. Portugal
incluído. Mais consensual é a ideia de que, ao cativar parte dos depósitos dos
cipriotas, a União Europeia deu uma machadada na confiança que os europeus têm
no sector bancário.
“É absolutamente
lamentável que se possa adoptar esta medida, que põe em causa a confiança no
sistema bancário”, diz o economista Miguel Beleza, que admite o efeito
contágio. “Em Portugal, essa confiança é extremamente elevada. Os portugueses
são, dentro da zona euro, os que menos notas utilizam e mais recorrem ao
sistema electrónico de pagamentos”, acrescenta, defendendo que o novo imposto
sobre os depósitos cipriotas deve ser abandonado o mais depressa possível.
“Com esta decisão,
julgo que foi aberta a caixa de Pandora”, diz Octávio Teixeira, que dá como
garantida a perda de confiança no sistema bancário como um todo. Depois de dez
horas de negociações à porta fechada, os ministros das Finanças da zona euro
chegaram, já na madrugada do último sábado, a um acordo sobre as condições a
aplicar no Chipre, em troca de um pacote de assistência de 10 mil milhões de
euros. A moeda a pagar para evitar o “colapso” da banca do país é a aplicação
de uma taxa sobre todos os depósitos bancários - 9,9% para os acima dos 100 mil
euros, 6,7% para valores abaixo desse patamar. Ninguém fica de fora.
“Fica o sentimento
de que é possível ser apanhado por uma situação destas”, refere o economista e
ex-deputado do PCP, que apelida a decisão - ou o “confisco” - de
“irresponsabilidade política” e sublinha que “já ninguém tem credibilidade nem
legitimidade para garantir que isto não acontecerá noutros países. Nem nos
paraísos fiscais os depósitos estão garantidos”, lança Octávio Teixeira.
Apesar de em
Portugal estar a ser aplicado um modelo de reajuste da economia assente em
pressupostos diferentes dos agora definidos para o Chipre, João Duque não
exclui a possibilidade de o castigo cipriota poder ganhar escala e vir a ser
aplicado noutras geografias. “É sempre possível replicar noutros países o que
se faz em diferentes mercados”, assume o presidente do Instituto Superior de
Economia e Gestão. No entanto, o economista ressalva a ideia de que “os erros
que o sector bancário terá cometido, e que levaram às actuais dificuldades,
“foram feitos em nome da economia real do país e não para alimentar ganhos
financeiros.”
Hoje, feriado no
Chipre, e depois de um fim-de-semana de pânico (ver texto em i), os
deputados reúnem-se numa sessão de urgência para votar o plano de resgate
desenhado por Bruxelas e que, na opinião de João Duque, deveria salvaguardar os
interesses públicos. “O Estado deveria ser devidamente compensado na atenção
que se prepara para dar à banca”, refere o economista, que não descarta a
hipótese de novos resgates em função do caso cipriota: “Há a possibilidade de
contágio, mas vamos esperar para ver como o mercado interpreta” a intervenção.
Excepção à regra,
Mira Amaral considera que “não há paralelo” entre o Chipre e Portugal, apesar
de olhar para a opção da União Europeia como uma medida “bastante violenta”.
Fora de questão estará, para o ex-ministro de Cavaco Silva, o arrastar de
outros países, porque o Chipre não é a Espanha ou a Itália - esses, sim, “podem
configurar um risco sistémico”.
BRUXELAS TENTA
ACALMAR EUROPA
O comissário europeu
para os Assuntos Económicos e Monetários, Olli Rehn, tentou ontem deitar água
na fervura das preocupações dos países da zona euro, ao descartar a hipótese de
a União Europeia aplicar uma medida semelhante à imposta ao Chipre a outros
estados-membros. “Não há caso algum onde este tipo de acção deva ser
considerado”, disse Rehn, acrescentando que não espera uma reacção adversa dos
mercados durante o dia de hoje. “As forças do mercado compreendem que a enorme
dimensão.
do problema do
sector financeiro cipriota, combinada com os problemas tão colossais que este
tinha, requeria a tomada de medidas substanciais”,acrescentou o comissário que
tutela a área.
Já o presidente do
Parlamento Europeu, Martin Schulz, defendeu a protecção dos pequenos
aforradores cipriotas, defendendo que as medidas impostas pelo plano de resgate
devem ser socialmente aceitáveis.
“A participação dos
depositantes é correcta” disse Schulz à edição online do jornal “Welt am
Sonntag”, da Alemanha, “mas os cidadãos não são responsáveis pelo problema do
Chipre”. O deputado reivindicou que deve haver uma taxa de excepção abaixo dos
25 mil euros.
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