Revue
Politika, Brno – Presseurop – imagem Mayk
A União Europeia
produz todos os anos milhares de páginas de relatórios, discursos e legislação.
Todos esses textos, que devem traduzir o projeto europeu, têm uma coisa em
comum: uma linguagem pomposa e deslocada, digna de um regime dogmático, lamenta
um analista político checo.
Todas as semanas,
as instituições europeias e os seus representantes produzem dezenas de
documentos oficiais e declarações de todos os tipos. Acumula-se legislação,
projetos de lei, livros brancos e verdes, relatórios, resoluções, pareceres,
discursos, etc. A singularidade da linguagem em que são escritos ou formulados
constitui uma das suas propriedades intrínsecas.
O que impressiona
logo na língua da União Europeia é a intensa utilização de frases feitas,
recicladas sucessivamente com poucas variações. Parte está codificada no
direito primário da União, outra emana de documentos-chave programáticos,
adotados, por exemplo, no contexto da Estratégia de Lisboa e da Agenda Europa
2020. É como se a língua tivesse sido petrificada em blocos compactos, que,
graças a um corta-e-cola, permite definir rapidamente a estrutura de qualquer
forma escrita ou oral.
“O desenvolvimento
sustentável é baseado numa economia social de mercado altamente competitiva,
que tende para o pleno emprego e o progresso social”, “o combate à exclusão
social e às discriminações”, “crescimento inteligente, sustentável e
inclusivo”, “o modelo social europeu”, para além de outros, contam-se entre os
“blocos” mais apreciados.
E mesmo quando não
estão presentes as expressões mais estereotipadas, a língua da União Europeia
caracteriza-se por um peso extremo e uma abundância de chavões vazios de
sentido.
“Adotar políticas
estruturais fortes”
Por exemplo, o Ato para o Mercado Único (2011),
um documento da Comissão Europeia, abre com esta frase notável: “No cerne do
projeto europeu, desde a sua fundação, o mercado comum, tornado mercado
interno, constrói, há mais de 50 anos, a solidariedade entre os cidadãos
europeus, homens e mulheres, ao mesmo tempo que abre novos caminhos de crescimento
a mais de 21 milhões de empresas europeias.” O Parlamento Europeu aprovou-o,
pondo especial ênfase na importância de, ao fazê-lo, permitir “aos cidadãos
reaverem o seu espaço de vida comum e dando às iniciativas dos intervenientes
públicos e privados maiores perspetivas de sucesso”, e afirmando que “o mercado
único tem um papel fundamental a desempenhar na criação de crescimento e de
emprego e na promoção da competitividade”, convindo “adotar políticas
estruturais fortes, para explorar plenamente esse potencial”.
No Livro Branco sobre o Desporto, publicado em
2007, a Comissão escreveu: “O desporto atrai os cidadãos europeus: a maioria
deles participa regularmente em atividades desportivas. Gera valores
importantes, como o espírito de equipa, a solidariedade, a tolerância e a
competição leal (fair play), contribuindo assim para o desenvolvimento e a
realização pessoais. Promove a contribuição ativa dos cidadãos comunitários
para a sociedade e, consequentemente, a cidadania ativa.”
Textos impregnados
de dogmas
Instituições
europeias e os seus representantes adoram sobretudo aquelas expressões
empoladas, carregadas de triunfalismo. A União é descrita e pensada como “um
ator-chave na cena mundial”, esboça-se “uma visão europeia dos maciços
montanhosos” ou “uma visão europeia dos oceanos e dos mares”, exortam-se as
pessoas a “reavivar o espírito empreendedor da Europa”, apela-se a “uma ampla
mobilização política baseada numa ambiciosa visão e opções comuns”.
Numa intervenção de
2010 Europa 2020: Estratégia para um
crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, a Comissão afirma: “A
crise constituiu o sinal de alarme. [...] Se agirmos em conjunto, poderemos
reagir e sair fortalecidos da crise. Temos ao nosso dispor os novos
instrumentos ao serviço de uma nova ambição. Chegou o momento de passarmos à
ação.”
Vários textos e
declarações contêm um verdadeiro fervor triunfalista. No Livro Branco sobre a juventude,
com o subtítulo ligeiramente orgulhoso “Os jovens na linha da frente”, é
possível ler: “A União deve ser construída com os europeus. As consultas
organizadas de forma a preparar a sua evolução, as reflexões sobre a sua
“governação” também devem incluir os que continuarão a tarefa (...)””
Os textos e
discursos da União Europeia estão frequentemente impregnados de dogmas,
preceitos e assumem um tom moralista e paternalista. Como se os seus autores se
arrogassem o papel de professores perante alunos, de elite esclarecida, que
sabe tudo melhor do que toda a gente e espalha o bem e o conhecimento entre o
vulgo.
Dormência
intelectual
Mas ao ler e ouvir
algumas das declarações da União, os nossos cidadãos de meia-idade ou mais
velhos terão sobretudo a sensação de voltar à infância ou à juventude [ao tempo
do regime comunista]. Não surpreende. As características marcantes desta
linguagem estão geralmente associadas a uma cosmovisão conotada à esquerda.
Para marcar a rutura com o regime do passado, os nossos partidos de esquerda
abandonaram um pouco esse tom.
Mas, na Europa
Ocidental, a situação é diferente. A linguagem é apenas uma prova mais de que a
esquerda, que desfruta das estruturas da União para promover o seu programa
político, é a força motriz por trás da atual direção da União Europeia. O
repisar continuado dos mesmos dogmas e fórmulas batidas é uma expressão de
preguiça, de dormência intelectual, de falta de pensamento crítico, de
permanente caminhada pelos mesmos trilhos. E ilustra a falta que faz às elites
da União uma capacidade de autorreflexão que lhes permita perceber que foram
ambições desmesuradas que mergulharam a UE na crise atual e lhes dê capacidade
para quebrar o impasse do programa de centralização.
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