“Diante de tantos
casos de graves violações, por que não uma espécie de Tribunal Penal
Internacional para julgar crimes cometidos pelas corporações transnacionais? A
própria ONU chegou a ter um projeto nessa linha na década de 1970, mas que
acabou sendo descartado”, lembrou Tom Kucharz (foto), do grupo ‘Ecologistas en
Acción’, no Fórum Social Mundial da Tunísia.
Maurício Hashizume –
Carta Maior
Túnis – A
concentração de poder das empresas transnacionais e a adoção de medidas
austeras que punem as populações de países europeus estrangulados pela dívida
na esteira da crise econômica são os principais alvos de duas novas iniciativas
que realizam e participam de atividades durante o Fórum Social Mundial (FSM)
2013 para ganhar consistência.
Lançada durante a Cúpula dos Povos, no Rio de Janeiro, em meados do ano
passado, a campanha global “Desmantelar o Poder Corporativo (www.stopcorporateimpunity.org)”
reúne redes, movimentos e organizações sociais das mais diferentes partes do
globo para combater o que definem como “impunidade corporativa”.
“Está bem documentado que, com o objetivo de aumentar lucros, as corporações
transnacionais sistematicamente violam direitos humanos e trabalhistas e
cometem crimes econômicos e ambientais”, aponta o documento da iniciativa, que
denuncia a ocorrência de assassinatos, perseguições e ameaças contra sindicatos,
comunidades e outros agentes sociais que resistem e contestam os poderosos
interesses de grandes empresas mundo afora.
Segundo os propositores da campanha – que engloba largas articulações, como a
Marcha Mundial das Mulheres e a Via Campesina, bem como diversas ONGs
ambientalistas -, instituições financeiras e multilaterais (seja por meio de
empréstimos a empreendimentos ou por tratados bilaterais e de livre comércio),
frequentemente com a cumplicidade e até suporte dos Estados, mantêm uma “vasta
arquitetura da Impunidade”.
“Diante de tantos casos de graves violações, por que não uma espécie de
Tribunal Penal Internacional para julgar crimes cometidos pelas corporações
transnacionais? A própria ONU [Organização das Nações Unidas] chegou a ter um projeto
nessa linha na década de 1970, mas que acabou sendo descartado”, lembra Tom
Kucharz, do grupo ‘Ecologistas en Acción’.
Paralelamente à divulgação e ao estímulo à discussão sobre os diversos
processos judiciais em curso contra corporações e do suporte a tribunais
populares, a campanha visa também arrecadar fundos para proteger defensoras e
defensores de direitos humanos em perigo.
Democracia econômica
Um encontro marcado para 7 e 8 de junho em Atenas, na Grécia, marcará o
lançamento da Alter Summit (Cúpula Alternativa – www.altersummit.eu) ,
nova articulação proposta por coletivos, sindicatos e associações civis da
Europa. “Estamos assistindo a uma degradação muito rápida. Na Grécia, por exemplo,
multiplicam-se clínicas médicas precárias e clandestinas porque as pessoas não
têm condições sequer de utilizar o sistema”, observa a militante francesa
Elizabeth Gauthier, da rede Transform, que mantém uma publicação online
englobando 25 organizações de 18 países e visa estimular o “pensamento
alternativo” e o “diálogo político”.
“Líderes políticos europeus e elites financeiras e econômicas tem se
aproveitado da crise para impor sua própria injusta, neoliberal e
antidemocrática ordem”, acusam os propulsores da rede. Um dos eixos da proposta
consiste no fortalecimento do conceito de “democracia econômica” frente ao
“austeritarismo”(austeridade imposta por meio de autoritarismo). “A nossa
intenção é questionar qual é, afinal, a finalidade da economia”, complementa
Elisabeth. Ela frisa ainda que a diferença entre a renda do capital e a
remuneração do trabalho está cada vez mais favorável ao capital. “Com menos
salários e mais arrocho (aumento de impostos), as políticas de austeridade
agravam ainda mais as crises. As reivindicações populares encontram um muro de
contenção, que dá pouquíssima margem a discussões. Vemos países ser abatidos,
um a um, como agora é o caso do Chipre”.
Um manifesto contra os memorandos de entendimento assinados pelos países em dificuldade
com a chamada troika – Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Central
Europeu (BCE) e Comissão Europeia (CE) – deve ser lançado ainda em abril.
“Queremos reunir vítimas e enfrentar oligarquia européia, reforçando pontos de
convergência e evitando nacionalismos”, expressa a editora da Transform.
As pretensões da ‘Alter Summit’ não convencem, contudo, ao jornalista Bernard
Cassen, professor emérito da Universidade Paris 8 e fundador da rede Attac na
França, figura que dirigiu o Le Monde Diplomatique e desempenhou
papel relevante na criação do FSM. Na visão dele, seria muito importante que um
país enfrentasse o status quo, como foi o caso da Venezuela de Hugo Chávez, que
conciliou transformações sociais dentro do marco democrático. Com relação à
hegemonia das elites econômicas e ao recrudescimento político protagonizado por
forças reacionárias, ele reflete: são necessárias mudanças profundas de maior
prazo e fôlego em nível educacional, cultural e midiático.
Fotos: Maurício Hashizume
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