sábado, 30 de março de 2013

OBVIAMENTE, DEMITAM-SE!





Há várias semanas, vão-se avolumando as pressões sobre o Tribunal Constitucional por causa da decisão sobre o Orçamento do Estado que está em execução. Há os que exigem o chumbo no espaço público e os que apelam à responsabilidade dos juízes, porque "vivemos tempos históricos" e os magistrados têm de ser responsabilizados pelo "impacto" que a sua decisão possa vir a ter no País.

Uns e outros violam da forma mais grosseira o princípio sagrado de um Estado de direito que é o da separação de poderes.

Entendamo-nos, para começo de conversa, sobre aquela que é a única responsabilidade de um Tribunal Constitucional: garantir o cumprimento escrupuloso da Constituição em todas as dimensões do Estado.

Dito isto, a forma como esta semana, mais uma vez, o PSD e o primeiro-ministro entenderam comentar a decisão, esperemos que iminente, dos juízes do Palácio Ratton, configura, obviamente, uma forma de chantagem ilegítima e inaceitável sobre aquele tribunal.

Dizer em jeito de advertência que o TC está "vinculado" ao memorando, insinuar em tom de admoestação que uma eventual decisão desfavorável ao Governo será causa de instabilidade e ruína é, no mínimo, um atropelo às instituições, à democracia e ao Estado de direito. O único vínculo do Tribunal Constitucional, repito, é à Constituição da República Portuguesa. Ao Governo e à Assembleia da República, que, convém não esquecer, aprova os Orçamentos do Estado, compete a obrigação de governar e legislar de acordo com a lei. E aqui, sejamos claros, os partidos do chamado arco da governação foram cúmplices em 2011 ao viabilizarem - fosse pelo voto a favor ou pela "abstenção violenta" - um orçamento que veio a constatar--se inconstitucional.

Podemos ainda interrogar-nos sobre o que fazer quando Governo e Parlamento ignoram as suas obrigações mais elementares. A resposta é simples: compete ao Presidente da República, mesmo que politicamente moribundo, cumprir e fazer cumprir a Constituição. E é isto que se espera de Cavaco Silva em caso de chumbo das normas que foram para apreciação do TC.

Isto é, se o corte do subsídio de férias a pensionistas e funcionários públicos, se a contribuição extraordinária de solidariedade, se os novos escalões de IRS - só para dar alguns exemplos - não passarem no crivo dos juízes do TC, o Presidente da República não pode deixar de atuar.

Já sabemos que Pedro Passos Coelho e Vítor Gaspar não têm plano alternativo a este Orçamento - o que foi, desde logo e quando verbalizado, uma outra forma de pressão. E portanto, deste facto só há uma de duas leituras a fazer: ou o Governo é incompetente, o que não é de excluir, ou governa deliberadamente contra a lei e contra a Constituição, o que é de uma gravidade extrema porque, com dolo, põe em causa o regular funcionamento das instituições. Podemos discordar da Constituição, mas não podemos fingir que ela não existe.

E quando assim é, ao Chefe do Estado não pode restar outra alternativa que não seja a de ser patrono da queda do Governo.

E porque os cidadãos têm de poder confiar nas instituições que, em tese, os representam e defendem, esperemos que o Tribunal Constitucional, caso se pronuncie pela inconstitucionalidade das normas orçamentais, não encontre novamente forma de suspender a democracia e a Constituição como em 2012. Se o fizer, agirá em linha com a cobardia já demonstrada pelos titulares de alguns órgãos de soberania que, em vez de assumirem as suas responsabilidades em tempo oportuno, adiam o mais que podem as suas decisões. Se assim for, estarão também eles a ser coniventes com quem põe em causa o regular funcionamento das instituições. E, em nome da decência, só resta uma saída para quem pactuar com esta situação: obviamente demitir-se!

Sem comentários:

Mais lidas da semana