Daniel Oliveira –
Expresso, opinião
O dia da demissão
de Miguel Relvas foi decidido pelo governo. Se Nuno Crato manteve na
gaveta o relatório que incriminava Relvas, durante semanas, a decisão de o
desengavetar por estes dias só pode ter sido política. Na despedida, Relvas fez
questão de recordar a Passos Coelho que este lhe deve a liderança do partido.
Como se dizia noutra agremiação, "tu sabes que eu sei que tu sabes que eu
sei". E Relvas sabe muito e é capaz de não estar satisfeito por ter sido
afastado pno momento mais humilhante para ele.
O governo poderá
ter tomado esta decisão, neste tempo, por considerar que seria melhor
matar este assunto antes do anúncio do acórdão do Tribunal Constitucional, das
consequentes medidas de austeridade e da remodelação do governo. Assim, o tema
Relvas morreria num dia em vez de se acumular ao descontentamento e de dar a
ideia de um governo em desintegração. Ou, pelo contrário, para ofuscar o que
hoje vai ser anunciado.
Com o buraco que,
ao que tudo indica, terá, a partir de hoje, de resolver, virão mais medidas de austeridade. Um
governo em frangalhos dificilmente as conseguirá impor. E engana-se Passos
Coelho ao pensar que Relvas, decisão do TC e remodelação, por acontecerem em
dias diferentes, não formarão a tempestade perfeita que lhe retirará
toda a autoridade para apresentar uma única medida que agrave a austeridade.
Ainda mais, quando esperou pela 25ªa hora para se livrar de Miguel Relvas.
Não sei até onde
vai o descaramento de Passos Coelho. Não sei até onde resiste quando, evidentemente,
as condições para continuar a governar se esgotaram. Pela forma como ficou,
durante um ano, com um cadáver político num dos ministérios mais importantes,
julgará que tudo pode continuar como antes. Mas, continuando em São Bento,
criará um problema à democracia portuguesa. O seu tempo acabou. Se não se
demitir esta semana, Passos Coelho viverá os piores meses da sua vida política.
E arrastará o País na sua agonia.
Claro que se Passos
Coelho não retirar as devidas conclusões da situação em se meteu, a queda
de um governo que já não pode governar depende de duas pessoas: Paulo Portas e
Cavaco Silva. Um está agarrado ao pote, o outro entretem-se a falar de como
ficou de barriga cheia de produtos nacionais no meio de uma monumental crise.
"Hoje, não falo de política", disse o senhor que vive em Belém e que
se transformou na jarra do regime. Se depender destes dois, a democracia bem
pode ir apodrecendo. Eles tratam de si.
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