Paulo Metri
Ao que tudo indica,
o que ainda resta de povo brasileiro independente morrerá nos dias 14 e 15 de
maio próximos. Como um povo sem independência não passa de gado pacífico e,
para não deixar tudo para a última hora, começo a preparar o seu obituário.
Depois do nome do falecido, "Povo Brasileiro Independente", vem a
mensagem fúnebre:
"Com muita
tristeza, cumpre-nos o infeliz dever de comunicar a passagem do povo brasileiro
independente. Doloridamente, informamos que o enfermo vinha, há anos, sofrendo
de doença drenadora da sua energia vital. No passado, a doença era conhecida
como 'entreguismo' e, hoje, é mais reconhecida como 'neoliberalismo' acoplado a
'globalização'. Nela, as veias da sociedade estão abertas e conectadas a
sanguessugas externas, que drenam as riquezas naturais e os lucros obtidos no
país".
"Este povo descende de índios guerreiros, brasileiros originários, que
tinham o pecado de serem atrasados tecnologicamente. Suas terras foram
invadidas, há 513 anos, por usurpadores europeus e brancos. Estes, sem
escrúpulos para dominar, mataram os que não aceitavam serem escravos, não
importando se eram praticamente todos. Não contentes, trouxeram povos da África
para trabalhar à força e, assim, se fartarem com este capitalismo cruel.
Posteriormente, outros imigrantes, forçados por guerras e pela fome de outras
terras, aqui desembarcaram para contribuir com sua força de trabalho para a
então incipiente transferência de mais valias. Então, esta mescla de povos de
diversas origens compõe o brasileiro, que tem sido secularmente explorado por
locais e estrangeiros. Durante sua existência, o brasileiro tem tido períodos
de conquista de graus de independência e, infelizmente, outros de
perda".
"Com a chegada da modernidade, a sofisticação e a desfaçatez do sistema de
exploração atingiram seus auges. Foi criado um arcabouço jurídico e
institucional dissimulado, em que a principal drenagem de sangue do paciente se
dá para o exterior. Entretanto, graças à sofisticação, não existem mais
grilhões, pelourinhos e açoites, para se terem súditos servis, bastando somente
existir canais de mídia, que desinformam e criam alienados facilmente
manipuláveis. Ajudam a manipulação, também, os políticos, representantes dos
usurpadores, que administram o sistema, permitindo o sangue do moribundo se
esvair. A escravidão atual se estabelece pela negação à instrução e à
informação correta, que permitiriam existir a cidadania".
"O pouco que restava do povo brasileiro independente deu seu último
suspiro nos dias 14 e 15 de maio de 2013, quando aconteceu a décima primeira
rodada de leilões de blocos do território nacional para exploração de petróleo,
a maior doação de patrimônio público a grupos estrangeiros já promovida pelo
governo brasileiro, desde nossa independência. Não foram incluídos os anos como
colônia, porque não se sabe o valor exato do ouro roubado por Portugal.
Estima-se que o super-lucro, acima de um lucro normal, das empresas
estrangeiras com esta rodada será de US$ 675 mil milhões, a serem realizados em
25 anos, valor que nenhum governante poderia doar, mesmo havendo a pequena
compensação para nosso povo, que são os royalties".
"O cortejo fúnebre será observado em cada petroleiro que encostar em uma
plataforma, na nossa costa, e zarpar com seu casco cheio do nosso petróleo indo
para algum lugar no exterior, durante 25 anos. Ele deixará aqui a falta de
recursos para educação, saúde, saneamento, habitação, transporte, ciência e
tecnologia, meio ambiente e tudo mais que irá representar um baixo IDH".
Este obituário está
pronto. Temo pelo pior que pode acontecer nos dias fatídicos 14 e 15. Mas ainda
tenho grande esperança que a presidente Dilma irá reconhecer os danos
contundentes desta entrega e irá cancelá-la. Alerto a presidente que o
presidente da Shell não lhe disse, na recente audiência concedida, que, se
ganhar blocos, não irá comprar plataformas no Brasil, não encomendará
desenvolvimentos aqui e, como consequência, gerará muito poucos empregos no
país, levará toda a produção do nosso petróleo para o exterior, não construirá
refinarias e oleodutos aqui, e não venderá o petróleo para a Petrobras. Enfim,
não ajudará o abastecimento do Brasil, nem o desenvolvimento brasileiro.
Contudo, pagará os 10% de royalties, e só não pagará mais impostos porque a lei
Kandir o impede.
É interessante notar o mundo fictício de ênfases tendenciosas, criado pela
mídia. Sobre o mensalão, foram dadas as mais variadas cifras como prejuízo
infligido à nação, dependendo da fonte da informação. Mas nenhuma delas, por
pesquisa na internet, suplantou o valor de R$ 100 milhões. Pois bem, ouvimos
sobre este caso durante uns três meses, todos os dias, cobertura jornalística
farta. Este valor é cerca de 13.000 vezes menor que o atual roubo do petróleo
e, no entanto, a mídia divulga praticamente nada sobre esta rodada.
Aproveito para dar um recado aos representantes das petroleiras estrangeiras. A
revogação das concessões desta 11ª rodada, se ela ocorrer, em ano futuro, é
algo possível, com a alegação verdadeira de que o povo não foi consultado sobre
a realização da rodada e, se fosse esclarecido e indagado, teria negado sua
realização. O contra-argumento, que os contratos de concessão são atos
jurídicos perfeitos e, por isso, devem ser respeitados, poderá não prevalecer,
à medida que o sistema escolhido para expressar a vontade popular foi
imperfeito.
Ver também:
Brasil
leiloa outra vez o seu petróleo , 22/Out/05
[*] Conselheiro do Clube de Engenharia do Rio de
Janeiro.
O original encontra-se em http://paulometri.blogspot.com.br/
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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