sábado, 22 de junho de 2013

Portugal: UM GOVERNO CHUMBADO




Eduardo Oliveira Silva – Jornal i, opinião

Dois anos depois, a nota é negativa. Passos escolheu mal Gaspar e desbaratou o seu crédito de confiança

Na hora do balanço intermédio verifica-se que as coisas não correram bem ao governo no seu todo, e especialmente ao primeiro-ministro. Há várias razões para isso e um pecado original.

O pecado original foi cometido quando, inesperadamente, Passos Coelho ouviu um não da boca de Vítor Bento, que tanto queria para ministro das Finanças, o qual lhe aconselhou vivamente Vítor Gaspar, no que foi secundado por Eduardo Catroga.

Mesmo assim, no primeiro ano correu praticamente tudo bem. Passos Coelho sucedia a um Sócrates crispado e isolado e apresentava-se com alguma bonomia, tinha um discurso pedagógico e até afável. Os portugueses aceitavam, compreendiam e até defendiam as opções difíceis.

Suportavam a austeridade, aceitavam o discurso absurdo de que tinham gasto o que não tinham, mas mesmo assim sentiam-se orgulhosos do seu governo e até envolvidos no sucesso que se ia proclamando com base em supostos encómios da troika e dos mercados.

A ideia geral era ainda que o Memorando era exequível e estava bem feito e as coisas se poderiam compor numa legislatura, enquanto anualmente os cortes se iriam suavizando até chegarmos a um regresso positivo aos mercados, já livres da troika. Era o paraíso em quatro anos. Portugal não era mesmo a Grécia, nem sequer a Irlanda, e Passos Coelho assegurava no Verão de 2012 o regresso ao crescimento no primeiro trimestre deste ano.

Mas não. Fruto de um programa de política económica errado, concebido por Vítor Gaspar e pela troika, agravado por um clima de depressão económica europeia, o governo não percebeu que ao começar por aumentar impostos antes de cortar na despesa gerou um furacão devastador de violência incontrolável para a economia e o equilíbrio social. A inevitável recessão gerou um nível de desemprego catastrófico, aumentou as necessidades sociais e teve um efeito perverso no encaixe de impostos.

Confrontado com isso e já criada uma tensão política complexa dentro da coligação, Passos não soube lidar com o problema. Desbaratou o capital de crédito. Tornou- -se impaciente. Em vez de emendar os fracassos, atribuiu culpas a inimigos imaginários. Não compensou as dificuldades com mais diálogo. Distanciou-se do Presidente da República, não acarinhou a Concertação. Não percebeu que ainda ia a tempo de mudar as coisas, perdendo aliados potenciais todos os dias.

Enredou-se na teia da política de Vítor Gaspar e esqueceu-se até do próprio Passos Coelho que já foi, sabendo ser firme mas sóbrio. Tornou-se um líder isolado, irritado, quase irascível, ao jeito de Sócrates, mas em apenas dois anos.

É pena. Porque Passos surgiu como uma esperança redentora. Como nas cartas, perdeu a mão porque não soube elevar-se à condição de estadista e estabelecer os compromissos que os momentos críticos impõem.

Hoje, e já sem o amparo de Relvas, que dispensou sem ganhos políticos e com inútil frieza, é um político triste que persiste em executar um plano em que só ele e o ministro das Finanças parecem ainda acreditar, enquanto o país já anseia por uma alternativa, qualquer que ela seja.

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