Ricardo M Santos - Aventar
Podemos apagar a
luz para não ver a realidade, podemos dar-lhe voltas e olhar para o país com um
milagre económico, como Pires de Lima fez ontem, descaradamente. Podemos ver as
gargalhadas da ministra swap no Parlamento e, às vezes, achamos mesmo, mesmo,
mesmo que vivemos num país diferente. Mas a realidade é como as baratas,
sobrevive a tudo e, mesmo mascarada, entra-nos pela porta dentro com estrondo.
Não há alternativa.
Temos de ter cuidado com os mercados. Estamos no rumo certo. Não há
alternativa, não há alternativa, não há alternativa. Vamos continuar a ouvir
isto até à exaustão para que ecoe nas nossas cabeças como as enxaquecas, mas
isto, a mim, dói mais. A miséria que se aprofunda e, mesmo que se queira olhar
para o lado e ignorar, ela passa a porta sem pedir e entra-nos pelos olhos
dentro. Ontem foi no Lagarteiro. A EDP, que teve lucros de 792 milhões de euros
entre Janeiro e Setembro de 2013, mandou cortar a luz a centenas pessoas no
Bairro do Lagarteiro, um daqueles bairros que a maioria das pessoas só conhece
quando há uma operação policial com honras mediáticas.
Não têm dinheiro
para pagar a luz, os parasitas, que teimam em querer comer. A alimentação é
sobrevalorizada, ainda havemos de ouvir isto, quando o pão que comemos souber a
merda. O Zeca é que sabia bem do que cantava.
Ontem foi no
Lagarteiro mas, nesta semana, também lá no meu bairro a EDP cortou a luz em
três ou quatro casas. Não sei ao certo a quem, porque, lá está, a vergonha
esconde-os mas mostra-nos todos os dias o país em que vivemos. Assim, sem
filtros nem adornos. Segundo a TSF, na manhã de hoje havia já gente com
electricidade, através das chamadas “puxadas” de vizinhos que – ainda – têm
electricidade.
É este o país em
que vivemos, em que um sector estratégico do Estado foi privatizado a bem do
mercado. Sempre o mercado. E assim acaba a responsabilidade de o Estado em ter
o dever de garantir as condições mínimas de dignidade para quem ainda sobrevive
neste país.
Às 13h00 de hoje
haverá concentração em frente à EDP, na Avenida da Boavista. Certamente que dá
mais trabalho do que assinar uma petição, que o Blatter é um malandro e o nosso
patriotismo é tão forte que não admitimos que um gajo de fora diga mal do nosso
menino d’ouro. E tantas assinaturas. Indigno aquele gajo da FIFA. Aquilo não se
faz ao Cristiano. Mas não é isso que envergonha o nosso país. Não é um velho
caquéctico que nos ofende. Quem nos ofende todos os dias está cá dentro, bem
mais próximo que o Blatter e governa e mata-nos.
O último a sair que
apague a luz.
Na foto: Mais de
100 pessoas estavam já, pela meia-noite de hoje, à porta do Centro de Emprego
de Portimão. (daqui)
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Aventar
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