NATÁLIA FARIA - Público
European Social
Survey , que mede a satisfação dos europeus com a democracia, mostra que
portugueses querem justiça mais equitativa e combate mais eficaz à pobreza e
desigualdades sociais
Os portugueses
estão insatisfeitos com vários aspectos da democracia portuguesa. Quase 40 anos
depois do 25 de Abril, sentem que há falta de controlo popular do poder
político e que os governos não explicam as suas decisões aos eleitores.
Os dados mais recentes
do European Social Survey (que mede o significado e a avaliação da
democracia em 23 países e que em Portugal é coordenado pelo Instituto de
Ciências Sociais da Universidade de Lisboa) revelam “défices” democráticos e
mostram os portugueses insatisfeitos relativamente a vários aspectos da
democracia. “Os maiores défices apercebidos situam-se no domínio do
funcionamento dos tribunais, na capacidade dos governos assegurarem justiça
social e num sentimento de falta de controlo popular do poder político”, ou
seja, os portugueses estão cansados dos governos “que não explicam as suas
decisões aos eleitores”, conforme se lê no documento que compila os dados do
inquérito presencial, realizado entre Outubro de 2012 e Fevereiro de 2013, a 40
mil pessoas e cujos resultados são escrutinados esta terça-feira, em Lisboa,
num seminário que conta com a presença dos politólogos Pedro Magalhães e Marina
Costa Lobo, entre outros.
Relativamente aos
mecanismos de democracia directa, os portugueses atribuem uma importância de
7,9 pontos aos referendos, numa escala de 0 a 10. Porém, na avaliação de
desempenho, a pontuação baixa para os 3,7. “Esta valorização do referendo, por
um lado, e a sua avaliação negativa, por outro, mostra que há uma maioridade
democrática da população”, interpretou ao PÚBLICO o sociólogo Elísio Estanque,
do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. “Infelizmente”,
acrescenta o sociólogo, “as instituições não estão a respeitar esta vontade”.
Questionado sobre
as razões que ajudam a explicar a escassez de referendos em Portugal, Elísio
Estanque mostra-se convencido de que “os políticos portugueses têm medo da
democracia”, ou seja, “depois de instalados nos lugares, não querem delegar
responsabilidades na população”.
Por causa deste
divórcio é que Elísio Estanque prevê um aumento substancial da abstenção nas
europeias marcadas para final de Maio, “o que não deixa de ser paradoxal porque
a política europeia nunca foi tão prioritária como hoje”.
No confronto destes
resultados com os obtidos para o conjunto dos 23 países incluídos no ESS, a
conclusão é clara: os portugueses estão mais insatisfeitos em praticamente
todos os itens da escala. As eleições livres e directas e a existência de media de
qualidade e de uma oposição livre são os três únicos aspectos a merecer uma
avaliação dos portugueses mais positiva do que a generalidade dos europeus.
Para permitir uma
comparação entre a classe política e a população em geral, o Instituto de
Ciências Sociais alargou algumas das perguntas do ESS aos deputados da
Assembleia da República e aos presidentes de câmara. Apenas 88 deputados e 143
autarcas responderam. Mas foi o bastante para apurar algumas diferenças. Desde
logo porque a ideia de que o Governo deve alterar as políticas planeadas de
acordo com a vontade da maioria prevaleceu mais entre os cidadãos (75,2%) do
que entre os políticos (57,6%).
Por outro lado,
apenas uma pequena minoria de cidadãos (7,3%) concorda que o Governo prossiga
com políticas com que a maioria da população discorda. “Há aqui uma clara
percepção de que os Governos subvertem muito rapidamente aquilo que é a vontade
da maioria e alteram as promessas eleitorais pouco tempo depois de tomarem
posse”, admite Elísio Estanque, para quem “é evidente que o descontentamento
está instalado na sociedade portuguesa, bem como a convicção de que estas
medidas de austeridade não estão a responder às necessidades prementes das
pessoas”. Curiosamente, entre os autarcas e deputados, 35,9% estão dispostos a
aceitar que os governantes recusem mudar o rumo.
Sem comentários:
Enviar um comentário