João
Galamba – Expresso, opinião
Os
dados do emprego divulgados na passada sexta feira pelo INE são um exemplo
paradigmático de como os sucessivos "sucessos" do programa de
ajustamento se revelam, afinal, uma ilusão.
Foi
assim com o ajustamento externo, que depende do empobrecimento do país (quando
saímos da recessão, as importações voltam a crescer mais do que as
importações); foi assim com a descida dos juros, algo que acontece em toda a
periferia, incluindo a Grécia; foi assim com a chamada saída limpa, que não foi
uma escolha soberana do país, mas sim o resultado dos nossos parceiros não nos
terem dado alternativa. No emprego passou-se o mesmo: decretou-se um sucesso
que, em rigor, não o é.
É-nos
dito repetidamente que o mercado de trabalho está a recuperar e que isso prova
que as reformas estruturais resultam e que a austeridade não é incompatível com
a criação de emprego. Acontece que os dados do INE desmentem quaisquer ideias
de retoma e de transformação estrutural da economia portuguesa.
Quando
comparado com o pior período desta crise, o emprego subiu, de facto. Mas dos 72
mil empregos criados entre 1º trimestre de 2013 e o 1º trimestre de 2014, 40
mil (55%) foram nos setores O [Administração Pública, Defesa e Segurança Social
Obrigatória], P [Educação], Q [Atividades da saúde humana e apoio social]).
Tudo
isto são "empregos" criados ou financiados pelo Estado, na grande
maioria resultantes das chamadas políticas activas de emprego (estágios, etc.
Como é evidente, as políticas activas de emprego não são necessariamente
negativas, não podem é ser usadas para fabricar sucessos meramente estatísticos
e muito menos para podem servir para sustentar a tese de que estamos perante
uma retoma sector privado e um dinamismo induzido pelas famosas reformas
estruturais.
Se
olharmos para os dois últimos trimestres, ou seja para o período entre outubro
de 2013 e março de 2014, constatamos que esse mesmo sector privado destruiu 100
mil empregos líquidos. A destruição de emprego só foi menor porque o Estado -
directa ou indirectamente - interveio, atenuando (e mascarando) a dinâmica
negativa do sector privado.
Se
olharmos apenas para o primeiro trimestre de 2014, constatamos que há menos 40
mil empregos líquidos do que no trimestre anterior. A descida da taxa de
desemprego para 15.1% não é, pois, um sucesso, como tem dito o governo e a sua
claque (nacional e internacional). É, isso sim, uma enorme tragédia: a taxa de
desemprego baixa não porque haja mais emprego, mas sim porque a população
activa caiu.
A
haver alguma dinâmica ela não é seguramente positiva. A tal transformação
estrutural virtuosa, a que pressupunha canalizar recursos para o sector dos
bens transacionáveis pura e simplesmente não existiu: desde que este governo
entrou em funções, não só se destruiu mais de 350 mil empregos, como o emprego
nos setores transacionáveis caiu 14%, enquanto o de bens não transacionáveis a
queda foi de 5%.
Não
estamos a construir nada, e só não destruimos mais porque o Estado - essa
instituição que nos dizem ser um entrave ao desenvolvimento e competitividade
do país - tem sido usado como paliativo.
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