quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Angola: DIREITO À INFORMAÇÃO



Reginaldo Silva – Rede Angola, opinião

Angola tem tudo para dar certo, mas falta sempre qualquer coisa.

E muitas vezes o que falta parece ser a parte mais fácil de ultrapassar, pois tem apenas a ver com chamada boa vontade política, isto é, com os homens, particularmente aqueles que têm o poder nas mãos.

Efectivamente só parece mesmo, pois é aí, na hora da vontade, que a porca torce o rabo e tudo fica bloqueado, criando-se assim mais um impasse, que muitas vezes acaba por se eternizar, transformando-se numa estranha lei consuetudinária que anula o direito positivo.

Mais uma vez e ao abordar recentemente o tema do direito à informação, voltei a chegar a esta conclusão.

Como devem imaginar, é uma constatação que não me satisfaz minimamente e muito menos contribui para melhorar a minha auto-estima, enquanto cidadão angolano, e já lá vão cerca de 40 anos, contra os primeiros 20 em que, por força da colonização, alguém não permitiu que fôssemos a tempo inteiro.

No caso do direito à informação, de facto e de jure temos tudo para dar certo.

Quase que diria que temos tudo e mais alguma coisa, o que em abono da verdade não constitui qualquer exagero.

Tudo, antes de mais, é a própria legislação em vigor que não deixa qualquer margem para dúvidas quanto à existência do direito à informação em Angola, com dignidade constitucional.

Ele faz parte do pacote das liberdades e direitos fundamentais da Constituição da República de Angola (CRA 2010) que esta quinta-feira, 5 de Fevereiro, completa os primeiros 5 anos desde que foi promulgada.

Os defensores desta Constituição costumam dizer que uma das bandeiras mais brilhantes do novo texto, se comparado com o anterior que vigorou desde 1991, é exactamente o seu Bill of Rights, pelo que foi conseguido em termos de alargamento e aprofundamento da sua base, com a introdução de mais liberdades/direitos para todos os cidadãos.

Não há como discordar desta constatação, mas logo a seguir a decepção volta a ensombrar-nos o horizonte, pois a CRA 2010 devia ter algo mais.

Algo de muito mais forte e vinculativo, para além do juramento, que obrigasse os políticos a cumprirem com a sua letra e o seu espírito, de preferência em simultáneo, na hora de se fazerem respeitar os direitos fundamentais dos angolanos, que é sempre parte mais lírica e comovente de qualquer diploma do género.

Como sabemos, não foi bem isso que se passou neste primeiro lustro da vigência da CRA 2010, o que vai certamente produzir avaliações distintas na hora do balanço que já começou a ser feito e que, em muitos casos, serão mesmo contraditórias em relação ao estado de saúde constitucional do país real.

Enquanto se aguardam pelas declarações políticas que em princípio deverão marcar a passagem deste 5 de Fevereiro, não parece haver muitas dúvidas que assim será, num país onde os diferentes protagonistas da vida política e social muito dificilmente se aproximam na hora de se procurar/estabelecer o consenso.

Para darmos o benefício da dúvida e respeitarmos o principio da presunção da inocência, só nos resta mesmo concluir que no mínimo e a título provisório, temos duas Angolas numa só, cabendo a cada um de nós identificar em que Angola está a viver.

No caso do direito à informação, Angola tem tudo para ser um modelo, pois para além da legislação, o país tem estado a investir volumes muito consideráveis de recursos financeiros na criação e desenvolvimento do que deveria ser um serviço público independente de rádio e de televisão, como sendo a melhor garantia para este acesso dos cidadãos a toda a informação de utilidade pública.

Neste âmbito, teve-se certamente em conta que a média estando apenas motivada por lógicas mais comerciais, portanto nas mãos de operadores privados, não estaria em condições de garantir este direito aos cidadãos. Também acho que sim.

Pensou-se razoavelmente bem, mas executou-se ou está-se a executar pessimamente mal, por falta da componente inicial, que já foi por nós identificada como sendo a tal de vontade política.

O que se verifica hoje na prática é que o modelo público deixou de funcionar, se é que algum dia funcionou mesmo conforme ele foi concebido, já pensando-se num estado diferente daquele vigorou na 1ªRepública, quando Angola ainda tentou ser uma “Pátria de trabalhadores”.

Passou a ser ele próprio o maior responsável pelas assimetrias que caracterizam o direito à informação em Angola.

São, obviamente, assimetrias induzidas.

Ele é o grande responsável por tais assimetrias, porque só garante parcialmente o direito do cidadão a alguma informação de utilidade pública, que é aquela que interessa ao Governo divulgar no quadro da sua própria estratégia política de gestão e conservação do seu bem mais precioso que é o poder.

Ao bloquear o acesso do cidadão a toda a informação de utilidade pública, a que interessa e a que não interessa ao Governo, para além de não permitir que os outros protagonistas que têm os mesmos direitos, façam passar a sua mensagem nos “MDMs”, o modelo transformou-se no maior inimigo do direito que estamos aqui a tentar escalpelizar.

Aqui chegados, pouco mais haverá para acrescentar a esta “tese peregrina” que estivemos a tentar defender a semana passada no âmbito da Vª Semana Social da CEAST/Mosaiko, onde fomos convidados a falar do tema “O Direito à Informação: Assimetrias e Desafios”.

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