Reginaldo
Silva – Rede Angola, opinião
Angola
tem tudo para dar certo, mas falta sempre qualquer coisa.
E
muitas vezes o que falta parece ser a parte mais fácil de ultrapassar, pois tem
apenas a ver com chamada boa vontade política, isto é, com os homens,
particularmente aqueles que têm o poder nas mãos.
Efectivamente
só parece mesmo, pois é aí, na hora da vontade, que a porca torce o rabo e tudo
fica bloqueado, criando-se assim mais um impasse, que muitas vezes acaba por se
eternizar, transformando-se numa estranha lei consuetudinária que anula o
direito positivo.
Mais
uma vez e ao abordar recentemente o tema do direito à informação, voltei a
chegar a esta conclusão.
Como
devem imaginar, é uma constatação que não me satisfaz minimamente e muito menos
contribui para melhorar a minha auto-estima, enquanto cidadão angolano, e já lá
vão cerca de 40 anos, contra os primeiros 20 em que, por força da colonização,
alguém não permitiu que fôssemos a tempo inteiro.
No
caso do direito à informação, de facto e de jure temos tudo
para dar certo.
Quase
que diria que temos tudo e mais alguma coisa, o que em abono da verdade não
constitui qualquer exagero.
Tudo,
antes de mais, é a própria legislação em vigor que não deixa qualquer margem
para dúvidas quanto à existência do direito à informação em Angola, com
dignidade constitucional.
Ele
faz parte do pacote das liberdades e direitos fundamentais da Constituição da
República de Angola (CRA 2010) que esta quinta-feira, 5 de Fevereiro, completa
os primeiros 5 anos desde que foi promulgada.
Os
defensores desta Constituição costumam dizer que uma das bandeiras mais
brilhantes do novo texto, se comparado com o anterior que vigorou desde 1991, é
exactamente o seu Bill of Rights, pelo que foi conseguido em termos de
alargamento e aprofundamento da sua base, com a introdução de mais
liberdades/direitos para todos os cidadãos.
Não
há como discordar desta constatação, mas logo a seguir a decepção volta a
ensombrar-nos o horizonte, pois a CRA 2010 devia ter algo mais.
Algo
de muito mais forte e vinculativo, para além do juramento, que obrigasse os
políticos a cumprirem com a sua letra e o seu espírito, de preferência em
simultáneo, na hora de se fazerem respeitar os direitos fundamentais dos
angolanos, que é sempre parte mais lírica e comovente de qualquer diploma do
género.
Como
sabemos, não foi bem isso que se passou neste primeiro lustro da vigência da
CRA 2010, o que vai certamente produzir avaliações distintas na hora do balanço
que já começou a ser feito e que, em muitos casos, serão mesmo contraditórias
em relação ao estado de saúde constitucional do país real.
Enquanto
se aguardam pelas declarações políticas que em princípio deverão marcar a
passagem deste 5 de Fevereiro, não parece haver muitas dúvidas que assim será,
num país onde os diferentes protagonistas da vida política e social muito
dificilmente se aproximam na hora de se procurar/estabelecer o consenso.
Para
darmos o benefício da dúvida e respeitarmos o principio da presunção da
inocência, só nos resta mesmo concluir que no mínimo e a título provisório,
temos duas Angolas numa só, cabendo a cada um de nós identificar em que Angola está a
viver.
No
caso do direito à informação, Angola tem tudo para ser um modelo, pois para
além da legislação, o país tem estado a investir volumes muito consideráveis de
recursos financeiros na criação e desenvolvimento do que deveria ser um serviço
público independente de rádio e de televisão, como sendo a melhor garantia para
este acesso dos cidadãos a toda a informação de utilidade pública.
Neste âmbito, teve-se certamente em conta que a média estando apenas motivada por lógicas mais comerciais, portanto nas mãos de operadores privados, não estaria em condições de garantir este direito aos cidadãos. Também acho que sim.
Pensou-se
razoavelmente bem, mas executou-se ou está-se a executar pessimamente mal, por
falta da componente inicial, que já foi por nós identificada como sendo a tal
de vontade política.
O
que se verifica hoje na prática é que o modelo público deixou de funcionar, se
é que algum dia funcionou mesmo conforme ele foi concebido, já pensando-se num
estado diferente daquele vigorou na 1ªRepública, quando Angola ainda tentou ser
uma “Pátria de trabalhadores”.
Passou
a ser ele próprio o maior responsável pelas assimetrias que caracterizam o
direito à informação em Angola.
São,
obviamente, assimetrias induzidas.
Ele
é o grande responsável por tais assimetrias, porque só garante parcialmente o
direito do cidadão a alguma informação de utilidade pública, que é aquela que
interessa ao Governo divulgar no quadro da sua própria estratégia política de
gestão e conservação do seu bem mais precioso que é o poder.
Ao
bloquear o acesso do cidadão a toda a informação de utilidade pública, a que
interessa e a que não interessa ao Governo, para além de não permitir que os
outros protagonistas que têm os mesmos direitos, façam passar a sua mensagem
nos “MDMs”, o modelo transformou-se no maior inimigo do direito que estamos
aqui a tentar escalpelizar.
Aqui
chegados, pouco mais haverá para acrescentar a esta “tese peregrina” que
estivemos a tentar defender a semana passada no âmbito da Vª Semana Social da
CEAST/Mosaiko, onde fomos convidados a falar do tema “O Direito à Informação:
Assimetrias e Desafios”.
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