Rute
Sousa Vasco*, opinião
Das
eleições presidenciais cuja campanha para a primeira ou única volta hoje
termina, já se ouviu dizer muita coisa. Que são maçadoras, que são favas
contadas, que são pitorescas, que não interessam para nada, que põem fim ao
cavaquismo, que são plurais, que puxam pelas mulheres, que são uma fantochada.
Os comentários estão naturalmente centrados nos candidatos e nas suas
performances e pouco no eleitorado – todos nós, que os elegemos. Aliás, como o
tema das subvenções vitalícias aos políticos bem nos recordou, o único problema
de Portugal são políticos imprestáveis e pouco dignos do povo que têm. Porque,
naturalmente, a maioria dos portugueses não hesitaria perante a promessa de uma
renda vitalícia depois de 12 anos de trabalho – diria imediata e naturalmente
que não.
Perdoem
a ironia. Mas a política somos todos nós e não apenas os políticos, e só
assumindo essa responsabilidade partilhada nós, os governados, poderemos exigir
mais a quem nos governa. E a democracia é tanto melhor, mais robusta,
participada e suportada em valores que nos possam orgulhar, quanto melhor for a
vida das pessoas, a educação, a saúde, as casas onde vivem, o mundo que podem
conhecer. A ideia romântica da democracia de barriga vazia mas coração
cheio apenas serve para perpetuar o mito do bom povo que tanto convém aos
efectivos maus politicos e não a todos os políticos. Porque, tal como no povo,
não são, não somos, todos iguais.
Olhemos
para nós próprios e olhemos para o lado. Para aqueles com quem trabalhamos.
Para os vizinhos do bairro. Para os pais que encontramos nas reuniões da
escola. Quantas atitudes de demonstração de pequenos poderes, apenas porque
sim? Quantos comentários discriminatórios ou preconceituosos, apenas porque não
se aceita a diferença? Quanta raiva escondida perante os outros que vivem
melhor ou simplesmente sorriem mais (essa mania irritante de algumas pessoas de
andarem de bem com a vida!)?
É
mais simples generalizar, e quem não adora uma boa generalização. Os políticos
maus, o povo bom, mais uma moeda no carrossel eleitoral para que nos possamos
todos voltar a queixar do mesmo. É por nos perceber como povo que Marcelo
concorda com tudo e com o seu inverso. É por acreditar que o povo é aquilo que
vê à sua volta que Marisa faz piadas com o Sporting.
Na
realidade, o que quer afinal a maioria dos portugueses? Com alguma
probabilidade quer – mesmo – que não se toquem nas vacas sagradas da nação. Que
se respeite a igreja, os bons costumes, o Benfica, o Sporting e o FC Porto. Que
se digam coisas simpáticas sobre as mulheres – que força da natureza são, que
bonitas, que falta nos fazem – mas que não se leve isso longe demais, que o
histerismo está logo ali, ao virar da esquina. Que o humor tenha graça mas que
não pise o risco, que toda a música seja boa e tenha honras de Estado.
Desanimados?
Não estejam.
Não
é um problema só nosso. Parece que é assim em quase toda a parte, a começar
pela maior democracia do mundo. A BBC olhou com atenção
para o carnaval das presidenciais americanas e mostra como nenhum
outro país consegue rivalizar com este sucesso de bilheteiras. Lá como cá, os
Donald Trump e as Sarah Palin são grandes animadores de audiências, mas não
estão sozinhos – pelo contrário, são acompanhados, em casa, ou nos jantares,
comícios e festas pelos milhões de americanos que, afinal das contas,
representam.
OUTRAS
COISAS A ACONTECER POR ESSE MUNDO FORA
O
tema racial regressou em força à 7ª arte. Há menos de duas semanas,
Tarantino foi acusado de racista, porque usou a expressão ‘gueto’ na cerimónia
dos Globos de Ouro. Agora são alguns actores negros de Hollywood a protagonizar
um movimento de protesto contra a não nomeação, pelo segundo ano
consecutivo, de qualquer actor negro para os Óscares. Oscars so white, é a
hashtag do protesto.
Há
olhares que nunca vimos e que de repente nos conquistam. O de Leila
Alaoui é um deles. Era fotógrafa, tinha 33 anos e foi uma das vítimas do
atentado ao hotel Splendid no Burkina Faso que matou 29 pessoas. Deixa fotografias
maravilhosas, deixa de certeza mais do que isso.
E
agora, porque precisamos de notícias que nos façam sorrir, convido-vos a
conhecerem o major Peak, o
astronauta britânico que tem brindado o mundo com o seu humor visto do espaço.
Há flores a nascer fora da Terra, sabem?
E
mesmo a fechar, uma sugestão de fim de semana. Montalegre é uma vila que
vale a visita em qualquer época do ano. Nas sextas-feiras 13, faz uma festa que
já se tornou mítica. Mas este fim-de-semana o chamariz é mesmo a feira
do fumeiro que em 2016 faz 25 anos. Um belíssimo conforto em dia de
eleições, antes ou depois do voto.
Tenham
um bom fim de semana!
*Sapo
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