Desde
Dezembro de 2014 que o BPI tem o problema de Angola para resolver. Isabel dos
Santos e CaixaBank já tiveram bases para acordo várias vezes, a última após a
intervenção de António Costa. Mas o fumo branco só chegará em cima do
prazo-limite. Perceba como.
Há
464 dias que o BPI anunciou
ao mercado que, por decisão do Banco Central Europeu (BCE), tem de reduzir a
sua exposição ao mercado angolano. O prazo que o supervisor europeu deu para o
banco resolver este problema termina já a 10 de Abril, pelo que a solução vai
surgir em cima da data-limite.
Depois
de 15 meses de negociações, que chegaram a passar por uma estância de ski na
Suíça, Isabel dos Santos e o CaixaBank já por diversas vezes tiveram uma base
de entendimento capaz de permitir resolver o problema angolano.
A
última vez que os dois maiores accionistas do banco tiveram um acordo
praticamente fechado foi há menos de duas semanas, depois da intervenção do
primeiro-ministro, António Costa. Ainda não houve fumo branco no BPI, mas vai
haver até 10 de Abril. Perceba como se vai chegar ao entendimento.
O
problema angolano
A
16 de Dezembro de 2014, Angola passou a ser um problema público e notório para
o BPI. Como o banco anunciou em comunicado, Angola ficou de fora dos países a
que a Comissão Europeia reconheceu uma supervisão bancária equivalente à
europeia e, por isso, a instituição liderada por Fernando Ulrich passou a ter
excesso de concentração de riscos àquele país.
Por
decisão do BCE, o BPI ficou ainda obrigado a reduzir a exposição a Angola. O
supervisor europeu deu mais de um ano para o banco resolver este problema. A
data-limite termina a 10 de Abril próximo.
OPA
pôs accionistas a negociar
Com
o problema de Angola como pano de fundo, o CaixaBank avança com uma oferta
pública de aquisição (OPA) sobre o BPI, em Fevereiro de 2015. O maior
accionista do banco apresentou a OPA como independente da questão angolana, mas
a verdade é que a oferta visava, indirectamente, resolver este problema.
Se
conseguisse passar a controlar o BPI, o que pressupunha o apoio de Isabel dos
Santos –votando favoravelmente o fim do limite de votos no banco (condição de
sucesso da OPA), mesmo que não vendesse a sua posição –, o grupo catalão ficava
com autonomia para resolver a questão angolana como bem entendesse.
Mas
a empresária angolana fez valer o poder de veto que lhe dá o limite de votos no
BPI – ninguém vota com mais de 20%, mesmo que tenha 44,1%, como o CaixaBank – e
chumbou a OPA ao inviabilizar a desblindagem de estatutos, a 17 de Junho. Pelo
meio, ainda propôs uma fusão do banco com o BCP,
assumindo-se como promotora da consolidação da banca portuguesa.
Cisão
gerou acordo, mas acabou chumbada
É
então que a gestão e os accionistas do BPI começam a trabalhar numa solução
para o problema angolano que cai nas boas graças do BCE e consegue gerar
entendimento entre Isabel dos Santos e o CaixaBank. Em causa está a cisão dos
activos africanos do banco – 50,1% do Banco de Fomento Angola, 30% do
moçambicano BPI e 100% do BPI Moçambique – numa nova sociedade, que passaria a
ser detida pelos mesmos accionistas que o banco.
Isabel
dos Santos pôs uma condição: ficar com 34% da nova sociedade, a par do CaixaBank,
mas sem que houvesse obrigação de lançar uma oferta pública de aquisição (OPA).
No entanto, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários impôs que, a avançar
essa hipótese, houvesse OPA, pelo que esta ideia de cisão morreu de morte
natural, em Dezembro de 2015.
Face
à necessidade de mostrar ao BCE empenho numa solução, a gestão do BPI, com o
apoio dos restantes accionistas, à excepção de Isabel dos Santos, avançou na
mesma com a ideia da cisão simples. Na prática, o projecto previa a transferência
dos activos africanos para uma nova empresa, em que os accionistas do BPI
teriam participações idênticas às que tinham no banco.
Em
resposta a esta iniciativa, a 31 de Dezembro, a Unitel, operadora angolana de
telecomunicações cuja gestão é controlada por Isabel dos Santos e que tem 49,9%
do BFA, propôs comprar 10% desta instituição por 140 milhões de euros. Foi a
primeira vez que, depois de várias manifestações de interesse, a empresária
avançou com uma oferta firme.
Mas
ainda antes da assembleia-geral para votar a cisão, a gestão do BPI recusou a
oferta da Unitel, posição que Fernando Ulrich justificou com a oposição do BCE
a este cenário. Na véspera da reunião, agendada para 5 de Fevereiro, a
administração anunciou ainda a intenção de avançar com uma proposta para pôr
fim ao limite de votos no banco. No dia seguinte, Isabel dos Santos chumbou a
cisão.
O
difícil acordo de divórcio
É
no quadro de morte da cisão e de recusa da proposta de compra de 10% do BFA que
os dois maiores accionistas do BPI chegam a meados de Fevereiro, a cerca de
dois meses do prazo-limite definido pelo BCE para resolver o problema angolano.
Até que, a 1 de Fevereiro, a Bloomberg avança que Isabel dos Santos e CaixaBank
estão a negociar o divórcio no BPI.
Na
prática, a solução para o problema angolano do BPI vai passar pela saída de
Isabel dos Santos do banco. A empresária angolana vende a sua posição ao
CaixaBank e compra a participação de controlo que o BPI tem no BFA.
O
modelo da separação amigável está acertado, depois de negociações que chegaram
a passar por uma estância de ski na Suíça, onde Isidro Fainé, responsável
máximo do CaixaBank foi ao encontro de Isabel dos Santos.
Até
o preço das duas transacções chegou a estar fechado, depois de o primeiro-ministro
ter recebido o banqueiro catalão e a empresária angolana em São Bento. António
Costa terá assegurado a Isabel dos Santos que não avançaria com legislação
destinada a impor o fim da blindagem de estatutos e terá dado luz verde para
que entre no capital do BCP depois de sair do BPI.
Na
sequência destas movimentações, Isabel dos Santos e CaixaBank tiveram o acordo
praticamente fechado, como o Expresso avançou há menos de duas semanas. Mas
numa negociação que se arrasta há 15 meses, nada está verdadeiramente fechado
até estar oficialmente fechado.
A
ruptura não pode ser definitiva
Nos
últimos dias, voltaram a ser reabertos pontos de negociação. Esta semana, o
entendimento final esteve quase para ser anunciado. Mas esta quinta-feira, 24
de Março, o CaixaBank anunciou a ruptura das negociações: "Não se
conseguiram reunir as condições necessárias para alcançar um acordo com a
Santoro Finance".
Com
um curto comunicado, publicado no site do supervisor da bolsa espanhola, o
grupo catalão disse que não tem mais margem para ceder às reivindicações de
Isabel dos Santos. Já a empresária angolana fez saber que continua com
"total disponibilidade e abertura" para negociar com o CaixaBank.
A
pouco mais de duas semanas da data-limite para o BPI resolver o problema
angolano, uma ruptura táctica nas negociações pode servir para desbloquear o
braço-de-ferro que voltou a marcar a relação entre os dois maiores accionistas
do banco.
Mas
o calendário não pára de avançar. E o BCE já avisou as autoridades portuguesas
que, se não houver solução, o BPI terá de pagar uma multa diária de 162 mil
euros até o problema estar resolvido. Isabel dos Santos e CaixaBank continuam
condenados a entenderem-se. Ambas as partes vão ter de ceder.
(Notícia actualizada às 19:24 com posições assumidas pelo CaixaBank e por Isabel dos Santos esta quinta-feira)
(Notícia actualizada às 19:24 com posições assumidas pelo CaixaBank e por Isabel dos Santos esta quinta-feira)
Maria
João Gago – Jornal de Negócios - ontem
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