Rafael
Barbosa – Jornal de Notícias, opinião
Dijsselbloem
é xenófobo e sexista. É uma evidência e é bom que se diga. Se é xenófobo e
sexista, não pode presidir ao Eurogrupo. É outra evidência e também é bom que
se diga. Foi o que fez, e bem, António Costa. Acontece que dar largas à
indignação, com frases contundentes, pode ter efeitos na autoestima coletiva,
merecer umas citações em alguns jornais europeus e excitar os militantes das
redes sociais. Mas não é fazer política, é distribuir propaganda. O
primeiro-ministro vai ter de fazer mais qualquer coisa.
Dijsselbloem
até poderá deixar de ser presidente do Eurogrupo. Mas é mais certo que isso
venha a acontecer por perder o lugar de ministro das Finanças da Holanda - o
Partido do Trabalho, a que pertence, deixou de ter um papel central para passar
a ser apenas mais um de uma multidão de pequenos partidos nas eleições da
semana passada - do que pela expressão "copos e mulheres" com que faz
a caricatura dos países do Sul.
Mesmo
que venha a sair (o que não é certo, graças à proteção, entre outros, de Wolfgang
Schauble, ministro das Finanças alemão), isso não representará uma mudança de
atitude, muito menos uma mudança de política. A maioria dos pares de
Dijsselbloem no Eurogrupo pode até censurar-lhe a expressão. Mas, não só não
censura, como acredita na tese de que os países do Sul devem ser castigados
pelos seus excessos: em linguagem politicamente correta, "copos e
mulheres" são sinónimos de "défice e dívida". Vícios de gente
incorrigível, que é preciso combater.
Acresce
que não são apenas os políticos e os cidadãos dos países do Norte que pensam
dessa forma. Imaginemos que Dijsselbloem, em vez de se referir aos países do
Sul, se dirigia especificamente à Grécia. Não só o tom de António Costa não
seria o mesmo (quanto mais não seja porque não é primeiro-ministro da Grécia),
como haveria bem poucos indignados por aí. Afinal de contas, não nos ensinaram,
durante anos, que Portugal não é a Grécia, que os portugueses não são os
gregos? Resumindo, e parafraseando Dijsselbloem, que nós, ao contrário dos
gregos, não gastamos a massa dos europeus em "copos e mulheres"?
Se
António Costa quer ser consequente, e ir para além da propaganda, vai ter de
fazer um pouco mais, em sintonia com outros progressistas europeus. Mais do que
substituir Dijsselbloem, é preciso substituir as políticas. É preciso avançar
com as obrigações de dívida europeias (que permitam maior equidade no
financiamento dos Estados e das empresas), é preciso avançar com a harmonização
fiscal (acabando com paraísos fiscais como o holandês), é preciso renegociar o
Tratado Orçamental (para que não seja apenas um instrumento punitivo). Tudo
vantagens que os do Norte não estão disponíveis para ceder. Até porque lhes
sobraria menos dinheiro para "copos e mulheres" durante as suas
férias no Sul.
*Editor-executivo
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