Martinho Júnior | Luanda
DOS TEUS OLHOS DE TERRA,
AMOR,
SEI NÃO SÓ QUE ME CONTEMPLAS,
SEI QUE TUA FORÇA FLUI
E ME PÕE DE PÉ,
PARA TRANSMITIR EM PROFUNDO
RESPEITO
PARA COM A MÃE TERRA,
QUÃO FIÁVEL
E DIGNA
E SAUDÁVEL
É A FORÇA E A ENERGIA
QUE EMERGE DA NATUREZA!
Foi bem escolhida a Matala para
acolher a comemoração central do 42º aniversário da independência nacional de
Angola, pode-se considerar mesmo que foi um simbólico acto de soberania com
múltiplas mensagens construtivas, desde logo em função dessa escolha que me
parece ter sido criteriosa!
Há mensagens que se reportam ao
passado e ao presente, com os olhos postos no futuro, que transmitem uma
sensação de coerência, de clarividência, de equilíbrio e de rumo e esta é
decididamente uma delas.
A coerência e a clarividência
residem sobretudo na escolha se pensarmos as lições que nos chegam dum passado
próximo: a Matala, à beira Cunene, é um produto da história de enlaces entre o
colonialismo português e o “apartheid” e o expoente mais evidente do
plano do Cunene que se iniciou sobre os auspícios do Exercício ALCORA, o
Tratado secreto do fascismo na África Austral!
Foi criada para ser um colonato
para migrações aferidas aos interesses do colonialismo e do “apartheid”,
em reforço das conjunturas típicas do triângulo do litoral e nas proximidades a
sul da região central das grandes nascentes e por isso teve uma gestação que
corresponde a uma visão geoestratégica em relação à qual o movimento de
libertação tem a obrigação ética, moral e cívica de saber resgatar, por que foi
em função do movimento de libertação e dos riscos que ele representava para o
colonialismo e o“apartheid”, que esses enlaces fascistas foram construídos no
passado e derrotados…
…E saber resgatar, não é mais com
a força das armas, mas com a frutificação da paz enquanto matriz original de
todo o progresso que o homem angolano, livre e independente, pode tornar
possível, com a avaliação equilibrada, mas rigorosa, das capacidades instaladas
naquele fluxo de vida que é o rio Cunene e ali onde as possibilidades de se dar
um salto para a diversificação económica, são por demais evidentes.
O homem angolano e refiro-me
agora ao presente, tem a obrigação de conferir à resgatada estrutura do
colonato da Matala, o sentido patriótico de sua própria criatividade e
responsabilidade em prol da independência e soberania e para esse efeito não
deve esconder nem suas limitações, nem suas insuficiências, nem suas
incapacidades: deve ser transparente e íntegro e chamar a si capacidades
investigativas e científicas para superar o estágio de sabedoria em que se
encontra, salvando-se do obscurantismo, da ignorância, do analfabetismo e
do “endémico” (?) improviso!
A Matala hoje é mesmo um desafio,
pois balancear o passado sem qualquer receio de encarar suas sombras, assumindo
humildemente o presente, é perspectivar o futuro como ele nunca foi antes
perspectivado pelo povo angolano e assim consolidar-se o rumo que se propicia
desde a independência e no âmbito do exercício da própria soberania!
O futuro é por isso ainda mais
exigente, se levarmos em consideração o respeito que a Mãe Terra deve merecer
ao homem e o amor rigoroso que o homem deve ter para com a natureza numa altura
em que as alterações climáticas, em parte provocadas pelo próprio homem, têm
enormes implicações de segurança em relação a todas as perspectivas de futuro.
O discurso do camarada Presidente
João Lourenço deixou em aberto essa perspectiva, muito embora ela deva ser um
fundamento essencial e não subjacente!
Explico: a minha preocupação
fundamentada sobre a premente necessidade duma geoestratégia para um
desenvolvimento sustentável, antes de mais implicando o homem angolano no
controlo planificado das principais nascentes e recursos de água do país, dos
aquíferos subterrâneos e dos fenómenos ambientais decorrentes, tendo em atenção
a chave que é a região central das grandes nascentes e a necessidade de se
criar uma cultura inteligente, com base na investigação, nas ciências e nas
responsabilidades de segurança, têm sido expostas e socorrem o simbolismo deste
exercício comemorativo na Matala!
A questão é desprendermo-nos da
visão economicista do presente, que deliberadamente tem sido induzida a partir
do exterior no âmbito dos impactos da própria terapia neoliberal e passarmos em
definitivo para uma alargada plataforma geoestratégica, intimamente integrada
na fortificação da identidade nacional, a fim de não se ficar só pelos próximos
cinco anos, nem pelo que se realizou desde 2002 até hoje, antes conferir todas
as potencialidades de nosso rumo comum de angolanidade, projectando-as para um
futuro de séculos, o que nos obriga desde logo a aproximarmo-nos das fontes da
água interior e as encararmos com a responsabilidade que merecem as gerações
futuras!
Desde o passo da Matala, tenhamos
a coragem de subir rio Cunene acima, ir-se até às suas três fontes, cabeças de
sua água vital que fazem parte da região central das grandes nascentes e a
partir delas, estudando-as, investigando-as, controlando-as sob o ponto de
vista ambiental e de gestão saudável de suas águas e produzindo conhecimento
científico, fazer brotar a indispensável cultura de inteligência em benefício
de todo o povo angolano e sobretudo das futuras gerações!
O homem não pode mais estar à
mercê das secas e para isso o conhecimento sobre as fontes dos rios, a água
subterrânea, o estudo dos fenómenos ambientais e climáticos, assim como a
antropologia de relacionamentos que tem com tudo isso em função do espaço
físico geográfico, é todo um enorme conhecimento a resgatar durante os próximos
séculos!
No Cunene, na Huila e no Namibe é
tanto mais urgente quanto a distracção humana pode levar que o deserto do
Namibe alastre cada vez mais para norte e comece um dia a disputar a própria
região central das grandes nascentes!
Haverá forma mais segura de se
perspectivar identidade nacional, desenvolvimento e um futuro com garantias de
segurança para as próximas gerações?
Martinho Júnior - Luanda, 12 de Novembro de 2017.
Ilustrações:
Barragem de Calueque (para
produção de energia para a Namíbia);
A consultar:
Discurso do camarada Presidente
João Lourenço, na Matala, a 11 de Novembro de 2017, durante o acto comemorativo
do 42º aniversário da independência nacional – http://www.angop.ao/angola/pt_pt/noticias/politica/2017/10/45/Integra-discurso-Presidente-Republica,d759edde-4e6c-4118-b510-75c011adea44.html
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