Inês Cardoso* | Jornal de Notícias
| opinião
Depois de tanta tinta que já
correu sobre as mudanças à lei do financiamento partidário, seria de esperar
que o tema estivesse esgotado. Estranhamente, após o veto do diploma pelo
presidente da República, o surgimento de atas que andaram desaparecidas por
"algum erro" informático e o reconhecimento, por vários
intervenientes no grupo de trabalho, de que a condução do processo poderá não
ter sido a melhor, há deputados que insistem na estratégia de vitimização e na
crítica ao "populismo".
O caso mais folclórico é o do
deputado Carlos Abreu Amorim, que vai abandonar o grupo de trabalho sobre a
eutanásia e recusa integrar qualquer outro grupo até final da legislatura. A
decisão é reativa às críticas ao secretismo da preparação da lei. À conta dessa
interpretação "conspirativa", diz o social-democrata que "os
grupos de trabalho morreram".
Populismo, contraponho, é usar
falsos argumentos para escamotear os pontos em que houve falhas. É fazer
birras, recusando continuar o trabalho para o qual foi eleito. É rejeitar o
natural funcionamento dos diferentes poderes democráticos. É desconsiderar o
direito à crítica de todos os cidadãos e eleitores e desvalorizar a importância
do debate público desenvolvido à volta do assunto.
Há um ponto pelo qual todos os
partidos devem bater-se: no sistema democrático em que vivemos, desempenham uma
função de inegável interesse público e essa valorização justifica que o debate
sobre financiamento se faça sem demagogias. Mas é exatamente por sabermos que
caminhamos sobre gelo fino, que a promiscuidade é perigosa e que as soluções
devem ser sérias, que não se pode correr o risco de faltar nem um milímetro à
verdade.
Já se viu que, devido ao
calendário interno do PSD, a negociação vai prolongar-se em fevereiro. Há
tempo, por isso, para se começar a tratar do tema sem truques na manga. Se
quiserem insistir em manter o regime de isenção de IVA e o fim dos limites à
angariação de fundos, o que as bancadas têm a fazer é explicar de forma
fundamentada porquê. Assumir posições sem meias-palavras.
O que está em causa neste
processo legislativo não é apenas a substância, mas a forma. É natural, em
qualquer diploma, que haja divergências na substância. Mas no processo para lá
chegar tem de haver verdade e rigor. É evidente que é demagógico generalizar e
criticar abusivamente todos os políticos, porque não são todos iguais. Mas
infelizmente há muita culpa própria na imagem descredibilizada da classe. Se
não querem ser lobos, não lhe vistam a pele.
*Subdiretora
Imagem: Carlos Abreu Amorim, deputado PSD
Imagem: Carlos Abreu Amorim, deputado PSD
Sem comentários:
Enviar um comentário