Constitucionalista angolano
Albano Pedro reconhece importância estratégica de Manuel Vicente para Governo
angolano e considera que se procura ilibá-lo de acusações de que é alvo no
processo que teve início em Portugal.
Em Angola, a excessiva proteção
por parte do Governo de João Lourenço a Manuel Vicente, ex-vice Presidente do
país e antigo responsável da Sonangol, tem levantado algumas questões. Há
setores que consideram que a influência de Manuel Vicente junto do Presidente é
grande e crescente, considerando-o, mesmo, assessor informal de João Lourenço
para assuntos de petróleo.
A DW África conversou com o
constitucionalista angolano Albano Pedro sobre o papel de Vicente na governação
do país.
DW África: Tomando em conta os
processos que correm contra o ex-número um da Sonangol, as chances de vir a ser
nomeado para algum cargo político seriam reduzidas?
Albano Pedro (AP): Até agora
foram dados sinais evidentes que os processos que correm contra Manuel Vicente,
de maneira nenhuma, põem em causa a sua importância estratégica para o Governo
angolano. A prova está no engajamento do próprio Presidente da República, ao
sugerir ao Governo português e à Justiça portuguesa que transferisse o processo
para Angola. Existe uma certa simpatia entre o Governo e Manuel Vicente. Obviamente, isso indicia algum nível de interesses que ultrapassam as situações
que envolvem Manuel Vicente e envolvem, de alguma forma, interesses de outros
indivíduos, de outras pessoas ligadas à alta hierarquia do Estado, sobretudo
daqueles que estão ligados ao poder.
DW África: Está a dizer que
haveria o risco de Manuel Vicente arrastar para a lama essas elites, caso o
processo continuasse em Portugal?
AP: Não há dúvida sobre isso. Não
vejo outras razões que levariam o Presidente da República a fazer um apelo
desse tipo. Se a vontade fosse, pura e simplesmente, querer que a justiça fosse
feita e não favorecer ou criar condições para que se proteja Manuel Vicente,
não vejo nenhum problema com o Presidente da República admitir que Manuel
Vicente fosse julgado mas em Portugal. Deve haver interesses, claro, que
envolvem mais gente e, por conseguinte, não tenho dúvida que muita gente seria
arrastada para esses processos.
DW África: E acha que João
Lourenço tinha algum interesse em promover oficialmente Manuel Vicente a algum
cargo político?
AP: Ele não está impedido de o
fazer. O Estado angolano tem estado a questionar-se se os crimes pelos quais
Manuel Vicente era indiciado em Portugal estão amnistiados. Esse é um argumento
que tem sido levantado. Outro argumento é de que ele goza de imunidade. Estamos
perante um conjunto de argumentos que têm sido levantados, no sentido de ilibar
Manuel Vicente. De modo que, se se procura ilibá-lo, é porque procura-se
descriminalizar as condutas de que ele é acusado. E assim sendo, procura-se
colocá-lo numa posição em que ele não tenha impedimento absolutamente nenhum de
assumir qualquer cargo que seja.
DW África: Quais seriam as
consequências políticas para João Lourenço caso arriscasse promover o
renascimento político de Manuel Vicente?
AP: O único risco que
haveria é se efetivamente Manuel Vicente fosse julgado e condenado pela Justiça
portuguesa, com crimes provados que fossem de facto crimes que em Angola
pusessem em causa a imagem dele [de João Lourenço], como corrupção, esses
crimes de colarinho branco. Aí haveria um risco para o atual Presidente colocar
Manuel Vicente a assumir funções, colocá-lo numa posição em que fosse de
confiança do Presidente da República. Mas como há todo esse trabalho no sentido
de que ele não venha a ser condenado, que não venha a ser julgado, está claro
que não seria problemático para o João Lourenço nomear Manuel Vicente, porque
até agora ele não foi condenado e, portanto, não é criminoso. E, claro, seria
facilmente justificável que ele é um cidadão de bem, que deu tudo pela pátria,
até porque é um ex-vice-Presidente, é uma pessoa de reconhecida capacidade, que
esteve à frente dos destinos da Sonangol. Não seria problema se voltasse a ser
indicado.
Nádia Issufo | Deutsche Welle
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